sábado, 23 de outubro de 2010

Festival de espionagem

Polícia Federal isenta o PT da quebra do sigilo de tucanos e mostra indícios de que se trata de fogo amigo no PSDB

Mário Simas Filho e Hugo Marques – REVISTA ISTOÉ

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“Há um esquema de espionagem e dossiês que nasce no Ministério
da Saúde e envolve o ministro José Serra”
Senador José Sarney, em discurso no plenário em 2002

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COMPANHEIRO
O delegado-deputado não reeleito Marcelo Itagiba é apontado como
parceiro de Serra em operações polêmicas desde 2002

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Há quase cinco meses, líderes do PSDB procuram responsabilizar o PT pela quebra ilegal dos sigilos fiscais de Eduardo Jorge Caldas, Luiz Carlos Mendonça de Barros, Verônica Serra e outros tucanos de vistosa plumagem ligados ao presidenciável José Serra. Desde junho, pressionam a Polícia Federal e a Corregedoria da Receita para que as investigações sejam conduzidas na direção de um crime político. Na última semana, os primeiros resultados das apurações da PF se tornaram públicos e o que se constata é que de fato houve um crime com motivação política, mas praticado no contexto de uma disputa interna do PSDB. Não há nenhum documento ou depoimento colhido durante as investigações que indique a possibilidade de ter ocorrido o uso criminoso do Estado para o favorecimento de alguma candidatura, como acusam os tucanos. As investigações não permitem afirmar que petistas tenham aliciado funcionários da Receita para a quebra dos sigilos. A principal testemunha é o jornalista Amaury Ribeiro Júnior, que confessou ser o contratante do serviço criminoso. Ele prestou três depoimentos que totalizam 13 horas de inquirição e afirmou que tanto a encomenda feita ao despachante Dirceu Rodrigues Garcia como o recebimento dos documentos sigilosos ocorreram em outubro do ano passado, quando, apesar de estar em férias, trabalhava para o jornal “O Estado de Minas”. O jornalista também explicou as razões que o levaram a bisbilhotar os sigilos fiscais dos tucanos.

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“Minha investigação não foi feita para a campanha, mas poderia proteger o Aécio se fosse necessário”
Amaury Ribeiro Júnior, jornalista que encomendou o crime

Segundo Amaury Ribeiro Júnior, através do delegado e ainda deputado (não foi reeleito) Marcelo Itagiba (PSDB-RJ), desde 2008 o presidenciável José Serra procurava montar um dossiê contra o então governador de Minas, Aécio Neves. Muito ligado a Serra, Itagiba, que comandou o serviço de inteligência da Polícia Federal durante o governo de FHC, teria instalado em Belo Horizonte um grupo composto por três ex-agentes da PF e um da Abin para rastrear as ações de Aécio, públicas e privadas. “Minha investigação não foi feita para a campanha, mas poderia proteger Aécio se fosse necessário”, diz o jornalista. Também tucano e com enormes índices de aprovação, em outubro do ano passado Aécio pleiteava disputar a Presidência da República e representava um obstáculo real no caminho de Serra. O jornalista, que já colecionava algumas informações sobre os bastidores das privatizações ocorridas na gestão de FHC, passou então a investigar as pessoas ligadas a Serra, provavelmente sem o conhecimento de Aécio.

As informações sobre o conteúdo dos sigilos fiscais dos líderes só chegaram ao conhecimento de alguns petistas em abril, levadas pelo próprio jornalista, interessado em fazer parte da pré-campanha de Dilma. O grupo que manteve contato com Ribeiro Júnior, no entanto, não chegou sequer a participar da campanha propriamente dita, pois acabou afastado antes das convenções partidárias. “Integrantes do PT tiveram conhecimento das informações obtidas pelo jornalista, mas não fizeram nenhum uso delas”, afirmou o delegado Alessandro Moretti. Na Polícia Federal, não há mais dúvidas sobre a motivação e também sobre a autoria do crime e o jornalista deverá ser indiciado nos próximos dias. Segundo o delegado Moretti, resta descobrir apenas se foi mesmo o jornal que pagou os R$ 12 mil que o despachante diz ter recebido do jornalista.

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INTERMEDIÁRIO
O despachante Dirceu Garcia diz ter recebido R$ 12 mil
para corromper funcionários da Receita

O caso, no entanto, re­mete efetivamente ao uso dos organismos estatais, de forma que atenta contra a democracia e o Estado de Direito. Em 2002, quando também pleiteava disputar a Presidência da República, o ex-ministro da Saúde José Serra enfrentava a oposição de tucanos e de líderes de partidos aliados. Na ocasião, segundo antigos aliados, ele teria escalado o mesmo delegado-deputado Marcelo Itagiba para comandar um “grupo de inteligência” instalado dentro do ministério, particularmente na Central de Medicamentos (Ceme) e na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Esse grupo teria sido responsável por escutas telefônicas irregulares que, depois de repassadas à Polícia Federal, levaram à apreensão de R$ 1,3 milhão em dinheiro vivo na sede da empresa Lunus, de propriedade da então senadora Roseana Sarney, à época no PFL (atual DEM). Roseana era considerada a principal pré-candidata da aliança PSDB-PFL à sucessão de FHC. O episódio inviabilizou a candidatura da senadora maranhense e facilitou o caminho de Serra. “Há um esquema de espionagem e dossiês que nasce no Ministério da Saúde e envolve o ministro José Serra”, disse o senador José Sarney na tribuna do Senado, em 2002.

Além de Roseana, Itagiba também é apontado por agentes da PF como o responsável pela produção de dossiês contra os tucanos Tasso Jereissati e Paulo Renato de Souza, em 2002. Os dois teriam manifestado interesse de disputar a indicação do PSDB à Presidência. No dossiê contra Jereissati, estaria listada uma suposta relação do senador cearense com alguns doleiros e no caso de Paulo Renato, ex-ministro de Educação no governo FHC, os arapongas teriam relacionado supostos favorecimentos do ministério a editoras de livros didáticos que seriam ligadas ao então ministro.

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Postado por Luis Favre
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