sexta-feira, 7 de março de 2014

O Homem da Máscara de Ferro do PSDB

Louvações a FHC lembram lenda da França do século XVII sobre monarca aprisionado pelo próprio irmão
Os elogios à presença de Fernando Henrique Cardoso na campanha de Aécio Neves ameaçam transformar o ex-presidente numa versão tropical do Homem da Máscara de Ferro. 
Personagem de uma lenda política da França do século XVII que acabou transplantada para um episódio dos Três Mosqueteiros, a estória diz que o Luís XIV tinha um irmão gêmeo. Para evitar que ele resolvesse lutar pelo trono, o Rei Sol resolveu trancafiá-lo em masmorras impenetráveis e sombrias, escondendo sua verdadeira identidade com uma máscara de ferro que mal lhe permitia respirar ou se alimentar.
FHC é o homem da máscara de ferro do PSDB. Em pleno século XXI, tenta-se fazer o eleitor acreditar que ele se tornou prisioneiro dos próprios colegas de partido, que teriam decidido esconder o ex-presidente dos eleitores pelo receio de serem ofuscados pelo prestígio de Fernando Henrique.  
Eu acho ótimo que Fernando Henrique esteja presente à campanha de 2014. 
Irá silenciar o coro interesseiro que sempre apontou a presença de Luiz Inácio Lula da Silva na campanha de Dilma como sintoma de que o PT queria instalar um regime bolivariano no Brasil.  
Sua participação dará um pouco de memória à disputa, permitindo ao eleitor estabelecer os troncos políticos de cada concorrente. 
Em nossa quinta eleição presidencial por voto direto desde 1989, essa continuidade é um avanço na construção de um sistema de partidos representativos, com história e alguma coerência.   
A dúvida é sobre o efeito FHC sobre os eleitores.
Em certa medida, este papel  parece claro. O ex-presidente tentará acentuar a tensão e o descontentamento de parte da elite econômica do país com o governo Dilma. Tentará emprestar a Aécio uma parte da credibilidade que possui. 
Longe das urnas, até Dilma Rousseff reconheceu méritos no governo de Fernando Henrique. 
Na prática, a dúvida é saber se FHC ajuda a ganhar votos, pois é para isso que as pessoas sobem no palanque, não é mesmo?   
Em 2002, José Serra conseguiu atravessar a campanha inteira sem pronunciar um único elogio a FHC. 
Em 2006, Geraldo Alckmin manteve o ex-presidente na sombra até que o próprio Lula, no debate pela TV no segundo turno, colocou Fernando Henrique em discussão, ao lembrar as privatizações. Alckmin perdeu o equilíbrio e as últimas esperanças de gerar calor na corrida na reta final. 
Fernando Henrique criou o real, defendeu a moeda e fez um governo que teve muitos méritos. 
Ganhou duas eleições no primeiro turno, o que Lula nunca conseguiu. 
Mas FHC deixou o Planalto em ambiente de catástrofe, coisa que nunca se viu depois dele. 
A inflação se aproximava dos dois dígitos. O Real descia para um fundo de poço que transformava a "moeda forte" em motivo de piada do povo e pesadelo dos empresários, nocauteados pelas dívidas em moeda estrangeira. 
FHC deixou o Planalto com a popularidade negativa em 13 pontos.  Dilma Rousseff caiu nos protestos de junho. Mas se recuperou em poucos meses.
Fernando Henrique não.
Ocorreu um dado mais grave, que complicou tudo. Lula não fez sua parte para ajudar na recuperação de FHC. Não criou o efeito "eu era feliz e não sabia" que tantos analistas adversários ofereciam como mercadoria garantida.   
Recebido pelo mercado com os piores presságios, inclusive um cálculo do Goldman Sachs, chamado “lulômetro", que media o impacto negativo das declarações do candidato do PT sobre a economia, Lula fez um governo indiscutivelmente melhor do que o antecessor. A economia cresceu o dobro: 4,4 por ano, em média, contra 2,2%. A renda foi distribuída. Os gastos sociais se multiplicaram e o mercado interno ganhou impulso como nunca se viu. O desemprego caiu. 
E se havia uma conjuntura externa favorável, seria desonesto ignorar as diversas medidas de política econômica do governo Lula que tiveram um impacto positivo na economia. FHC também teve conjunturas favoráveis -- e aproveitou menos. Também teve conjunturas desfavoráveis -- e reagiu pior. A economia de Dilma, de quem os cronistas reclamam o tempo inteiro, fechou 2013 um pouquinho melhor que a média de FHC: 2,3%. Mas o desemprego sempre foi melhor. A distribuição de renda também. A redução da desigualdade prosseguiu.  
A maldade e a inveja são elementos conhecidos da política. Mas é essa memória que atrapalha FHC.  

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