Me incomoda o título desta matéria da Rede Brasil Atual: “Ascensão social faz aumentar casos de racismo em shoppings e universidades”. Um
racista que vive argumentando que cotas vai criar o racismo no país,
como se a racialização na sociedade brasileira inexistisse antes das
cotas vai adorar ler o título e dizer, “não falei! Levar os negros pra
universidade só vai aumentar o racismo!”
É óbvio
que a presença negra em ambientes antes só restritos aos brancos faz com
que o racismo se torne visível, isso não significa que antes ele fosse
menor. A diferença era que a ausência de negros neste ambiente tornava a
vida dos racistas bastante confortável, já que não eram confrontados em
ambientes historicamente reservados a eles.
Agora com o
aumento da população negra em ambientes onde era raridade a presença de
gente com pele escura, os racistas não têm como disfarçar o seu
desconforto. Assim, a ascensão social dos negros não aumenta o racismo,
ela só joga por terra a falácia exaustivamente repetida pelos racistas e
até mesmo por uma esquerda disposta a refletir sobre o racismo e sua
exclusão de que o problema no Brasil não é de raça e sim de classe. A
ascensão social negra só esfrega na cara dos cínicos e dissimulados que a
sociedade brasileira é racista e precisamos encarar que somos racistas e
que temos de curar esta doença social.
Deste modo
a ascensão social não pode ser vista como um problema (como o título da
matéria induz a pensar) obviamente o problema é o racismo. O que se
espera com a ascensão social da população negra; com negros ocupando
lugares que historicamente a sociedade racista reservou aos brancos é
que o estranhamento de brancos e negros em verem negros em lugares
socialmente valorizados diminua.
Uma elite
mais ‘colorida’ fará com que fique mais complicado, por exemplo, a
polícia militar atirar num jovem negro por impulso. Uma elite negra, com
negros ocupando lugares socialmente valorizados, vai bagunçar o coreto
do racista, desnaturalizará a ideia de que a cor preta é a cor do
trabalho pesado, a cor da suspeição, a cor das ‘classes perigosas’.
Leia também:Ascensão social faz aumentar casos de racismo em shoppings e universidadesPessoas negras enfrentam discriminação e preconceito em ambientes antes frequentados apenas por brancos.Por: Raimundo Oliveira, Rede Brasil Atual
19/11/2012Nos últimos dez anos, com melhorias consistentes nos indicadores sociais no Brasil, os cidadãos mais pobres passaram a ter acesso a outros níveis de consumo, como em lojas de shopping, aeroportos, cinemas e universidades. No caso de cidadãos negros e pardos, para muitos isso significou também maior exposição à discriminação racial nos ambientes antes frequentados majoritariamente por pessoas brancas.Na Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), já são 15 as denúncias de racismo em universidades, 12 registradas neste ano, quatro vezes mais que as três contabilizadas em 2011 – quando a Ouvidoria da Seppir passou a receber os relatos de discriminação –, afirma Carlos Alberto Silva Júnior, ouvidor da Seppir.Segundo ele, este aumento não está relacionado a manifestações contra a lei que garante metade das vagas nas universidades federais a negros, pardos e índios, desde que tenham cursado o ensino público, sancionada no final de agosto. “A lei é recente, e muitas situações ocorreram antes que ela foi sancionada. O que percebemos é que há, além da maior exposição de negros em situações de consumo antes pouco comuns por causa de condições financeiras, também maior percepção por parte destes cidadãos do que é preconceito racial”, diz.Daniel Teixeira, advogado e coordenador de projetos do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade (CEERT), afirma que, neste ano, aumentou em cerca de 30% as denúncias de crimes raciais em situações de consumo registrados na entidade – que lida com casos de natureza racial e de intolerância religiosa, por exemplo.As denúncias relacionadas aos centros de compras lideram nos 25 casos acompanhados pelo CEERT desde janeiro e evidenciam que o preconceito ocorreu em função da cor da pele e não da classe social. “Em muitos casos, quando a pessoa é pobre, ela não consegue identificar direito se está sofrendo preconceito por ser negra ou por ser pobre e, muitas vezes, acaba relacionando tudo à pobreza”, afirma Teixeira.“Mas, quando estas pessoas conseguem melhorar sua situação financeira, percebem que não é mais por causa da pobreza que são discriminadas”, afirma. “Tem um caso emblemático de um músico que foi o único da banda a ser barrado em shopping de elite em São Paulo onde eles se apresentariam. Ele chegou de táxi e foi impedido de entrar pelos seguranças, alegando que o motivo era por estar com um instrumento. Mas os outros músicos, todos brancos, também estavam com seus instrumentos e nenhum foi barrado”, relata.Tanto para o advogado do CEERT como para o ouvidor da Seppir, a queda na desigualdade social registrada nos últimos dez anos no Brasil (que fez o índice Gini, usado pela ONU para medir a desigualdade, cair de 0,594 para 0,527 entre 2001 e 2011) beneficia a população de negros e pardos no país, historicamente relegadas às posições mais baixas da sociedade, e revela mais nitidamente as situações de preconceito.Para Silva Júnior, há uma discriminação histórica – como na lei de Imigração de 1890, que proibia a entrada de africanos, e na lei que criminaliza e legaliza a prisão por vadiagem logo após o fim da escravidão, quando a maior parte dos negros não tinha emprego formal algum -, mas há também o preconceito difuso.A secretária Nacional de Combate ao Racismo da CUT, Maria Júlia Reis Nogueira, acostumada a uma rotina de aeroportos por conta do trabalho, e dona de cartões de fidelidade que dão os maiores benefícios na compra de passagens, conta que já caiu na armadilha do preconceito difuso em situações de consumo.“Sempre viajo a trabalho, não me visto como uma madame, e percebi que em muitos locais quando entro na fila destinada aos portadores do meu cartão de fidelidade têm pessoas que me perguntam se estou na fila correta. No começo, ao perceber que esta atitude era em função da cor pele, respondia sempre que, se não tivesse o cartão, não estaria naquele lugar. Mas agora, quando me perguntam isto eu questiono a pessoa se está fazendo esta pergunta para todo mundo que está na fila, independente da cor da pele”, afirma.
Do Maria Frô.
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