Mino Carta, CartaCapital
Proclama a manchete da Folha de S.Paulo de sexta-feira 16: “Delator diz ter repassado R$ 2 mi para nora de Lula”.
Texto a justificar o título, retumbante na primeira página, relata que,
segundo o lobista Fernando Soares, o Baiano, o dinheiro foi entregue
por ele a um amigo de Lula para ser levado à mulher de um dos filhos do
ex-presidente, de fato dotado de quatro noras. O tal amigo, apontado
como intermediário da operação, nega.
Alto e bom som, como não poderia deixar de ser, o Estadão
também na sexta trombeteia: “Baiano diz que amigo de Lula acertou
propina de US$ 5 mi”. De novo em cena aquele prestativo amigo, esclarece
o texto, capaz de precipitar a manchete, para entregar a grana ao já
ilustre Nestor Cerveró e mais dois funcionários da Petrobras.
Nem o Washington Post manifestou
tamanha empolgação ao colher as provas do envolvimento de Nixon no
Watergate. Pergunto aos meus estupefactos botões em que país dito
democrático e civilizado confusas delações premiadas de um lobista,
obviamente a carecerem de prova, seriam apresentadas pelos principais
jornais com o destaque que lhes foi conferido pelos jornalões paulistas?
Respondem em uníssono: Brazil, zil, zil. Algo me preocupa, nesta e
outras situações similares, a saber a imediata credulidade de quem lê,
pronto a repetir quanto leu qual fosse a sacrossanta verdade.
Há quem observe: contássemos com outra
mídia, a opinião pública brasileira seria bem menos enganável. À parte o
fato de que tenho dúvidas em relação à expressão opinião pública, em um
país de 204 milhões de habitantes onde a Folha de S.Paulo se
orgulha de alcançar 20 milhões, graças a cálculos baseados no fator
multiplicador. Mas, no fundo, não é este o motivo da minha preocupação. A
atual diz respeito, de fato, ao quociente de inteligência (nem ouso
falar no espírito crítico) do leitor.
O momento do Brasil dos graúdos, devastado pela insensatez e movido a ódio de classe,
favorece o triunfo da sandice e a impossibilidade de um debate justo,
honesto, equilibrado. Inteligente. Por exemplo. Em um rompante de
coerência, o PT se manifesta contra a política econômica do ministro Levy, e a mídia nativa, como sempre fiel do pensamento único, clama contra o engodo.
Ou, por outra, avisa: não se deixem
enganar, isto é jogo de cena. Pelo comedido emprego de neurônios, não
seria difícil entender que a sinceridade petista, no caso, bate de
frente com os propósitos da presidenta. Não há, é solar, o estratagema
das cartas marcadas.
Na moldura, se estabelece uma preciosa informação prestada por Fernando Henrique Cardoso
em seu livro de memórias. Mereceria, esta sim, muito mais destaque do
que lhe foi oferecido pelos jornalões de quarta 21: em 1996, quando
presidente, o príncipe dos sociólogos teve sua atenção chamada para a
corrupção reinante na Petrobras e deixou de intervir. Invoco a ajuda dos
meus perplexos botões: “Mas a Petrobras não era governo também na época
de FHC? Ou muito me engano?”
Esta, sim, é incoerência, dizem. Como
assim? Recorrem a Justiniano: quem cala consente. Donde, concluo, seria o
caso de dar à confissão do presidente tucano o peso devido, do tamanho
de um deslize gravíssimo, de uma indiferença criminosa. Seria, retrucam,
mas FHC tem poltrona cativa, adamascada, na casa-grande, e a reverência
inoxidável da mídia nativa. Sei, sei, resmungo, mas ele também, ao
confessar, não nos brinda com uma prova de esperteza. Pode tudo, no
entanto.
Susto enorme levei, na manhã da quarta 21, ao tropeçar na manchete do Estadão.
Ao vê-la de longe imaginei a eclosão da guerra mundial. Em toda a
largura da primeira página, e em duas linhas. Ao lê-la, respirei
aliviado, falava de uma das habituais delações destinadas a incentivar a
crença no envolvimento de Lula em algum, qualquer, negócio escuso.
Tentativa patética, se não estivéssemos no Brazil, zil, zil, ambiente
cada vez mais propício ao rebaixamento progressivo do QI.
Nos últimos dias, me peguei diante de
duas plateias bastante distintas. Em um debate sobre o excelente livro
de Paulo Henrique Amorim, O Quarto Poder, Uma Outra História, em companhia de Laura Capriglione e do próprio autor.
Outra oportunidade tive ao receber o
Prêmio Especial Vlado Herzog, que me honra e me comove, mesmo porque
aquele assassínio cometido na masmorra do DOI-Codi é perfeito símbolo da
violência de uma ditadura feroz e insana, ditadura antes civil que
militar, porque nascida nas dependências da casa-grande, de onde saiu a
convocação da caserna para a execução do serviço sujo.
Na primeira plateia, falava-se em
democratização da mídia. Na outra, em liberdade de imprensa ameaçada.
Pontos de vista opostos, ambos equivocados, conforme meus botões, embora
o segundo seja ou hipócrita ou francamente néscio. Aqui a plateia
acredita que liberdade se completa por si só, sem o corolário da
igualdade, de sorte a se tornar, graças a tal ausência, na liberdade dos
senhores de contar a história a seu talante.
Quanto à democratização da mídia, não sei
o que exatamente significa. Bastaria aplicar por meio de leis
específicas o que a Constituição determina com toda clareza contra o
monopólio e o oligopólio. Sosseguem, leões: nosso Congresso nunca
dará qualquer passo neste rumo. A democracia implica naturalmente uma
mídia democrática. Precisaríamos é democratizar o Brasil. "
Um comentário:
DILMA BOTA UMA LEI AI QUE OBRIGUE TODOS A ANDAREM PELADOS AI TODO MUNDO É IGUAL E ACABA COM ASSALTOS .
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