segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Guido tinha razão


O Ministro da Fazenda esteve muito à frente de seus colegas das Finanças no G-20, quando alertou para os riscos de uma guerra cambial. Foto: Louisa Gouliamaki/AFP
Da Carta Capital - 5/2/2012

Delfim Netto
A crise financeira europeia não terminou, obviamente, mas nas duas últimas semanas a temperatura baixou e um pouco de racionalidade passou a frequentar os encontros de aturdidos líderes dos governos, aparentemente convencidos de que os custos do desmonte da Zona do Euro (políticos, econômicos e sociais) seriam incomensuravelmente maiores do que os da manutenção do sistema.
No setor financeiro, a mudança de clima deu-se a partir da entrada de Mario Draghi no comando do Banco Central Europeu, fazendo-o assumir seu verdadeiro papel como “emprestador de última instância”, o que afastou aquela expectativa imediata de uma crise bancária de grandes proporções na Eurolândia.
Pelo andar da carruagem, o hábil “Super Mario” usou o timing correto e os recursos adequados para conter a ofensiva do terror e dar um pouco de tranquilidade aos mercados. Os bancos europeus sentem-se mais encorajados com a atitude firme de um BCE que exibe mais musculatura, de forma que a probabilidade de uma crise dramática acontecer agora e destruir a Zona do Euro diminuiu.
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A grande crise (a tragédia dos 27 milhões de desempregados e a instabilidade política) está longe de terminar, mas a percepção do custo insuportável parece ter alcançado o cérebro dos europeus. Em meio ao tumulto financeiro, o abandono do euro seria simplesmente a desintegração da Europa, um retorno àquele distanciamento entre nações, umas desconfiando das outras. Imagine o que seria o renascimento da ideia de que os regimes autoritários são mais eficazes para resolver as crises, o que num prazo mais longo conduziria ao encontro de uma tragédia muito maior do que a que muitos países estão sofrendo para salvar a moeda única.
Uma dúvida que desperta a curiosidade (pelo menos dos economistas) é por que demoraram tanto para reconhecer que o cerne do problema do euro é uma questão cambial. A solução para a Europa era uma desvalorização do euro. Só que, hoje, os Estados Unidos também estão fazendo uma política que desvaloriza o dólar. O nosso ministro da Fazenda, Guido Mantega, esteve muito à frente de seus colegas das Finanças no G-20, quando os alertou (com muitos meses de antecedência) para os riscos de uma guerra cambial que tumultuaria ainda mais o comércio mundial e afetaria as exportações brasileiras. É a guerra que existe hoje entre o dólar e o euro.
Isso mostra que o Brasil, realmente, não terá mais o vento externo a favor que soubemos aproveitar para acelerar o crescimento antes de 2008. Nós já mostramos, no entanto, nesses últimos quatro anos de crise, que aprendemos a depender de nossas próprias forças e do nosso mercado interno para continuar expandindo a economia e acelerar o ritmo para um crescimento entre 3,5% e 4,5% do PIB nos próximos cinco anos.
O governo da presidenta -Dilma mantém uma sólida política fiscal e pôs em prática uma política monetária muito interessante, que está reduzindo a taxa de juros real (e vai reduzi-la ainda mais), e tem trabalhado junto ao sistema bancário para que não só mantenha o crédito às empresas, mas também amplie o financiamento dos investimentos. E, seguramente, os bancos estatais seguirão o mesmo caminho.
É claro que podemos ser afetados de alguma forma pelos tropeços na economia mundial, especialmente com o aumento das dificuldades para as exportações industriais. Não há nenhuma razão, porém, para que haja alguma queda brusca de demanda interna ou menos ainda na oferta de crédito à produção. O sistema bancário brasileiro continua bastante hígido e líquido. O que o governo precisa fazer é dar ao Banco Central a certeza de que ele pode prosseguir no seu caminho de reduzir a taxa de juros, de forma a ajudá-lo a cooptar o setor privado e convencê-lo de que as condições são favoráveis para realizar o seu trabalho. Há centenas de projetos necessários à expansão da infraestrutura física do País em condições altamente rentáveis.
A presidenta Dilma precisa pôr tudo isso para funcionar, agilizando as concessões, fazendo as parcerias, acelerando os projetos, oferecendo ao setor privado as condições para operar. Temos dezenas de empresas de extrema competência disputando as obras do PAC na infraestrutura dos transportes, na extensão de redes de transmissão, na utilização das novas tecnologias para diversificar a oferta de energia, em praticamente todos os setores da construção. Elas só precisam acreditar que o crescimento vai se acelerar, com o governo se comprometendo com a continuidade das políticas que vão permitir o desenvolvimento do País.
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