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Saraiva
Análise política
Um preço ao golpismo
Não é segredo para ninguém que a direita das três Américas está salivando diante do golpe de Estado em Honduras. Até agora, porém, não foi possível apoiar explicitamente a derrubada ilegal de um governo legalmente constituído dado o amplo consenso internacional que se formou contra o golpe.
Contudo, aos poucos, a direita, através de seus jornais, revistas, rádios e tevês já vai colocando a cabeça para fora da toca. Paulatinamente, vai tentando vender barbaridades como a de que haveria algum resquício de legalidade na derrubada de Manuel Zelaya.
Temos aí uma questão que alenta, de certa forma, porque não me lembro de outro evento dessa natureza na América Latina (um golpe de Estado) que tenha provocado tamanha reação da comunidade internacional.
Penso que ninguém consegue se lembrar de outro momento na história desta parte do mundo em que golpistas não tivessem seu feito reconhecido por ninguém, nem pelos Estados Unidos, que, invariavelmente, sempre apoiaram golpes de Estado em seu quintal, até porque muitos desses golpes foram feitos sob sua inspiração.
Quanto aos golpistas, vejam que, por mais grosso que falem – e sob o coro surdo da ultra-direita latino-americana, que, aqui e ali, vai destilando seu apoio ao golpismo valendo-se de mentiras sobre aquele golpe ter sido “vontade da maioria” –, estão tendo que aceitar até que Zelaya chegue às suas barbas como um alvo-móvel a ser preso ou até abatido a tiros.
Fazem-se de surdos quando se pergunta de onde tiraram a informação de que haveria algum indício real de que a maioria dos hondurenhos apóia o golpe contra Zelaya e de que, mesmo que tal apoio existisse, isso justificaria o estupro de uma decisão eleitoral popular e democrática.
Democracia tem que ter regra e essa regra é a de que não se rompe paradigmas democráticos como o do voto popular para não se criar precedentes que incentivem esse tipo de violação do marco legal, ou seja, do processo legal de cassação de governantes que se tem que fazer obrigatoriamente e sob o mais amplo direito de defesa do detentor de mandato popular que eventualmente tiver esse mandato questionado por outros Poderes de Estado.
Trocando em miúdos: não há Suprema Corte ou Legislativo do mundo que possa depor dessa forma violenta e intempestiva um presidente legalmente eleito em eleições livres, limpas e internacionalmente aceitas. Aceitar tal fato é uma tentativa de se abalar os pilares democráticos da humanidade, o próprio conceito de democracia.
Há, ainda, a desculpa torpe e mentirosa para o golpe, porque é a mentira que omite, que distorce, já que Manuel Zelaya jamais propôs novo mandato para si, sendo essa mera interpretação dos golpistas da convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte pelo presidente deposto.
Ou seja: depuseram um presidente sem direito de defesa, deportaram-no intempestivamente em vez de o prenderem pelos tais “crimes” que dizem que ele teria cometido e querem que essa prática seja aceita pela comunidade internacional, que, agindo assim, legitimaria que qualquer de seus países-membros sofresse tal ruptura institucional e todos aceitassem.
Chega-se, pois, ao que de positivo está acontecendo. Ainda que haja quem tente legitimar o golpe de Estado em Honduras – o que sempre aconteceu com facilidade e apoio dos fatos nesta parte do mundo –, hoje está sendo extremamente difícil consolidar tal operação.
Difícil porque simplesmente todos os que controlam o poder de Estado hoje em volta de Honduras estão pressionando de todas as formas, seja na comercial, na diplomática e na forma política, talvez a mais importante das três, pois é da política que nascem as decisões de Estado e algum apoio de alguma parte no exterior a um país pobre daqueles.
Claro que, por outro lado, se um país pobre daqueles consegue resistir por um mês a pressão tão uníssona da Comunidade das Nações, pode-se dizer que essa resistência, de certa forma, desafia o poder dela de retaliar violações ao Direito Internacional.
Todavia, o que está acontecendo no mundo quanto a Honduras hoje pelo menos estabelece um preço pelo golpismo a ser pago por certas elites regionais que acham que seu controle das riquezas e da comunicação pode lhes comprar qualquer coisa que queiram, e essa é uma melhora e tanto.
Escrito por Eduardo Guimarães às 11h26[(47) Opiniões - clique aqui para opinar] [envie esta mensagem]
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