quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

"Não é certo constranger a criança"

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Inadimplência na sala de aula
Mesmo com atraso no pagamento das mensalidades, escolas são proibidas de reter documentos e negar a transferência dos alunos. Mas não estão impedidas de negativar os nomes dos pais


Mariana Branco


Giovanna, com a filha, Clara:
Giovanna, com a filha, Clara: "Não é certo constranger a criança"

As escolas particulares recomeçaram as aulas esta semana com mais de 300 mil estudantes. Com o retorno, os pais precisam se programar para manter em dia o pagamento das mensalidades escolares que, este ano, estão entre 11% e 14% mais caras. Nem todos conseguem. A inadimplência dos colégios particulares oscila de 15% a 25%, índices até cinco vezes maiores do que os do comércio. Mas os que têm dificuldade em quitar dívidas com as escolas possuem mais direitos que quem faz operações comerciais comuns, pois o acesso à educação é assegurado pela Constituição Federal. Especialistas aconselham pais e responsáveis e conhecerem a legislação sobre o assunto e tentarem negociar o débito quando possível.

A Lei nº 9.870, em vigor desde 1999, rege as relações contratuais entre os colégios e os pais dos alunos. Uma das questões que a norma regulou foi a forma de cobrança. Antes, práticas como impedir o estudante de fazer provas ou negar a liberação de documentos por causa da dívida eram comuns. Atualmente, procedimentos dessa natureza são proibidos (leia quadro). A escola que recorrer a eles para forçar o pagamento pode ser punida. Quem se sentir lesado deve procurar os órgãos de defesa do consumidor ou mover ação na Justiça.

O diretor-geral do Instituto de Defesa do Consumidor do Distrito Federal (Procon-DF), Oswaldo Morais, explica que quem desobedecer à legislação pode ser penalizado com multa de R$ 414 a R$ 6 milhões. Outra regra para a instituição de ensino é que ela não pode pedir ao inadimplente que se retire antes do fim do ano letivo. Mas está autorizada a não renovar a matrícula quando o período seguinte começar. Oswaldo Morais diz que o momento da transferência dos devedores para outras escolas provoca reclamações dos pais. “A instituição diz que só libera a documentação após o inadimplente efetuar o pagamento. E isso não pode”, alerta.

DiscussãoAlém de não renovar a matrícula de quem não paga, os estabelecimentos têm direito a executar débitos na Justiça. Uma das medidas adotadas por eles para prevenir a inadimplência causa discussão. As instituições incluem o nome dos maus pagadores nos cadastros do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e da Centralizadora dos Serviços dos Bancos S.A (Serasa). Graças à prática, as pessoas correm o risco de ter a matrícula recusada em todo o mercado de ensino privado.

Segundo os especialistas, nada impede que a escola não aceite firmar contrato com quem está negativado. “A princípio, não teria impedimento na lei. Isso é próprio da atividade empresarial”, analisa José Geraldo Tardin, presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec). Maria Inês Dolci, coordenadora da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), diz que a prática não é irregular. Por isso, acrescenta ela, é importante o consumidor zelar pelo bom nome também nas instituições de ensino. “O que temos orientado aos pais é para não deixar chegar a esse ponto. Se estiverem com dificuldades de pagar, devem avisar a escola e tentar um acordo”, sugere.

A presidente do Sindicato das Escolas Particulares do Distrito Federal (Sinepe-DF), Fátima de Mello Franco, garante que há espaço para negociação. “A gente sabe muito bem que pode haver uma emergência, um problema financeiro”, diz. O presidente da Associação de Pais de Alunos do DF (Aspa-DF), Luiz Cláudio Megioren, afirma que, em geral, os donos das escolas são cuidadosos na hora de resolver questões de débitos. Mas reclama que alguns colégios ainda causam constrangimento aos pais e alunos.

 “Não é certo constranger a criança. Ela deve ser preservada em todas as circunstâncias”, ressalta a advogada Giovanna Larizzatti, 33 anos, mãe de Clara, 4. O administrador Thiago Lima Perdigão, 30, padrasto de Maria Clara, 5, acredita que o diálogo entre pais e as escolas é fundamental. “Se ainda assim não der certo, tudo bem negativar o nome”, acredita.

Colaborou Roberta Abreu

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