Da Carta Capital - 04/05/2011
Gerson Freitas Jr 3 de maio de 2011 às 9:33h
A produção de energia eólica no Brasil dá sinais de que pode finalmente deslanchar. A crise nos mercados desenvolvidos colocou o País na mira dos fabricantes de aerogeradores, e a valorização do real barateou o custo dos investimentos. Mais do que isso, o governo parece comprometido a bancar a expansão desta fonte na matriz energética, o que agrada os ambientalistas.
O Brasil possui 44 parques eólicos em operação, todos construídos com incentivos do Programa de Infraestrutura (Proinfra). Apesar do grande potencial dos ventos que sopram por aqui, os turboélices geram apenas 0,5% da energia produzida no País. A expectativa é de que este cenário mude daqui para frente. Nos últimos dois anos, o governo federal contratou a construção de 141 novos empreendimentos, que serão entregues entre 2012 e 2013.
Ao todo, a capacidade instalada nos moinhos deverá saltar dos atuais 900 megawatts para 5,25 gigawatts. E a participação da energia eólica no sistema elétrico, de 0,5% para 4,3%. Apenas estes projetos vão demandar investimentos da ordem de 16 bilhões de reais, calcula Ricardo Simões, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica).
Os investimentos colocaram o País na mira das multinacionais do setor. Ao menos sete grandes empresas, entre elas a franco-suíça Alstom e a norte-americana GE, anunciaram investimentos no Brasil. O faturamento dessa indústria, inferior a 700 milhões de reais em 2010, deverá quadruplicar até 2014. “Embora o Proinfra tenha marcado o nascimento da indústria eólica no Brasil, a escala ainda era insuficiente para atrair os fabricantes de aerogeradores. Os leilões de 2009 e 2010, combinados com a estagnação dos mercados tradicionais, deram partida a uma expansão”, diz Simões.
Os investidores apostam que a energia eólica pode ter um papel relevante na expansão da oferta de energia nos próximos anos. De acordo com o Plano Decenal (2010-2019) da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o Brasil deverá aumentar em 63,4 gigawatts a capacidade do Sistema Interligado Nacional (SIN). Deste montante, 14,6 gigas deverão ser produzidos a partir das chamadas fontes alternativas: pequenas hidrelétricas, termelétricas a base de biomassa e usinas eólicas. Com isso, sua participação deverá dobrar, de 7% para 14%.
A previsão é de que os moinhos de vento respondam por algo próximo a 5,3 gigas, mais do que as pequenas hidrelétricas (2,7 gigas) e praticamente o mesmo que as usinas de biomassa (5,4 gigas). Ainda é pouco, se levado em conta que o aumento na capacidade de energia proveniente das termelétricas movidas a óleo, gás natural e carvão, fontes fósseis e poluentes, deverá ultrapassar a marca dos 12,1 gigawatts.
O problema, explicam os especialistas, é que ainda pairam dúvidas sobre a confiabilidade da energia eólica. Os moinhos dependem da intensidade dos ventos e, por isso, estão sujeitos às variações climáticas. Desde 2006, os parques eólicos entregaram apenas 79% da energia com a qual se comprometeram nos leilões, segundo a Aneel. Os melhores resultados foram obtidos em 2007 e 2008, quando alcançaram 93% e 94% da produção esperada. Mas não entregaram mais que 78%, em 2009, e 80% no ano passado.
Maurício Tolmasquim, presidente da EPE, questiona o dado. Segundo ele, a produção média das 26 usinas que operam há ao menos um ano superou o volume previsto nos contratos de licitação. “Além disso, no Brasil, a energia eólica complementa a hidráulica, pois os ventos são mais fortes nos períodos mais secos”, afirma.
Simões acredita que as previsões da EPE serão revistas para cima nos próximos anos. “Em apenas 10 meses, o governo contratou 3,9 gigas de energia eólica, mais de 70% do que é esperado até o fim da década”, justifica. O setor quer que o governo realize um leilão exclusivo de energia eólica de ao menos 2 gigas ao ano até 2020, garantindo às fazendas de vento ao menos 10% de toda a capacidade de geração do País ao fim da década. “É um passo fundamental para que as indústrias que estão vindo para cá se consolidem.”
De acordo com o presidente da Abeeólica, os leilões propostos assegurariam um investimento anual da ordem de 8 bilhões de reais. Tolmasquim não descarta a possibilidade. “Estamos entrando em um círculo virtuoso: quanto mais leilões são realizados, mais escala os fabricantes ganham e mais os preços caem, o que nos possibilita contratar mais energia.”
Outra demanda do setor privado é a criação de um centro de pesquisa e tecnologia, bem como de um campo de testes para aerogeradores. “Embora seja conhecida há muito tempo, a energia eólica ainda é infante. Trata-se de uma indústria que, tudo leva a crer, ainda dará um salto tecnológico nos próximos anos.” Simões afirma que o modelo, tanto do centro de pesquisa quanto do campo de testes, ainda está sendo discutindo dentro do setor, que pretende levar a proposta ao governo nos próximos meses.
De todo modo, os moinhos têm se mostrado competitivos. Os projetos eólicos foram os grandes vencedores do último leilão de fontes alternativas do governo federal. Dos 2,8 gigawatts de capacidade contratada em agosto de 2010, 2 gigas virão das turboélices, ao preço médio de 130,86 reais por megawatt/hora. O preço médio nos contratos arrematados pelas usinas de biomassa foi de 144,20 reais. Tolmasquim lembra ainda que o preço da energia eólica contratada caiu 18% entre os leilões exclusivos de dezembro de 2009 e agosto do ano passado, de 148,53 para 122,69 reais por megawatt/hora.
“Entre os novos mercados para energia eólica, o Brasil é, sem dúvida, o mais promissor”, afirma Steve Sawyer, secretário geral do Global Wind Energy Council (Gwec). Segundo ele, os investimentos no País podem extrapolar a marca dos 20 bilhões de dólares (34 bilhões de reais) até o fim da década. “As empresas do setor olham o Brasil há muito tempo, pois é o lugar lógico. É um país grande e em rápido crescimento, tem uma forte base industrial, enorme potencial eólico e compromisso com a energia limpa.” Sawyer afirma que o governo brasileiro nunca teve uma posição firme em relação à energia eólica, mas observa uma mudança de postura nos últimos dois anos.
Os leilões de energia eólica promovidos pelo governo federal em 2009 e 2010 aconteceram bem no momento em que as grandes fabricantes do setor viram Europa e Estados Unidos, seus mercados tradicionais, se retrair em função da crise financeira. No ano passado, o acréscimo na capacidade de geração dos parques eólicos em todo o mundo foi 7% menor do que o verificado no ano anterior, de acordo com dados da Gwec. No entanto, o ritmo de crescimento atual é dez vezes maior do que o observado ao fim da década de 90. A capacidade total instalada no mundo, que era de 17,4 gigas no ano 2000, alcançou 194,4 gigas em 2010.
A China, geralmente associada à grande queima de combustíveis fósseis, é a principal responsável pela rápida expansão dos parques eólicos nos últimos anos. Responde por um quinto de toda a energia gerada por moinhos de vento no mundo está no gigante asiático, o que coloca os asiáticos no topo da lista dos maiores produtores, à frente dos Estados Unidos e da Alemanha. Só em 2010, os chineses inauguraram 16,5 gigas em capacidade de geração, quase metade de todo o crescimento mundial. É mais do que o Brasil pretende fazer em uma década.
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