Alguns comentaristas tem insistido em alertar contra uma onda eleitoral que produza não só a vitória de Dilma já no primeiro turno, neste domingo, como o de uma maioria muito nítida dos candidatos do governo no Congresso e nos governo estaduais. Chegou-se a falar em riscos para as instituições democráticas ou para algumas das nossas liberdades fundamentais, pela suposta fraqueza em que ficariam as forças representativas da oposição.
Deixemos de lado o argumento de circunstância ou hipócrita consistente em arvorar esse pressuposto quando se trata das eleições federais e esquecer da situação no Estado de São Paulo, por exemplo, onde um mesmo partido governa há 16 anos com uma sólida maioria na Assembleia Legislativa, sem provocar os mesmo gritos de alerta.
Alguns pretendem que o próprio sistema eleitoral em dois turnos visa a permitir um debate mais apurado entre os dois principais candidatos, após uma primeira seleção provocada pelo voto nas mais diversas opções. Nada mais alheio à realidade.
A essência do presidencialismo, como sistema basado na eleição do presidente pelo sufrágio universal visa a delegar ao escolhido o mandato soberano do povo, designado-o pelo voto majoritário dos cidadãos. A instauração de um segundo turno é um recurso inserido pelo legislador para evitar precisamente a eleição de um presidente que não represente a maioria absoluta dos eleitores. A razão de ser da escolha pelo sufrágio direto é assegurar essa maioria, mesmo quando ela inexiste inicialmente, “obrigando” os eleitores a afirmar um mandato claro.
A melhor situação para um país democrático com sistema presidencialista, é a existência de maiorias definidas e de minorias estruturadas e atuantes que não possam travar o funcionamento institucional, mas que possam opor, mobilizar, manifestar e criticar a atuação do governo respeitando seu mandato.
Todas às pesquisas indicam que essa maioria existe no país em favor da Dilma e da continuidade do atual governo. Todos os candidatos tiveram igualdade de condições para defender suas bandeiras, reivindicar seus espaços e disputar o voto. Uma das bandeiras mais fortes desta campanha eleitoral foram os resultados de oito anos de governo do presidente Lula. Essa bandeira esta identificada na candidatura Dilma, após o fracasso da tentativa de Serra de apropriar-se dela. A escroqueria, lançada com apoio de setores da imprensa, foi rejeitada rapidamente pelos eleitores e abandonada estrepitosamente pelos seus mentores. Os próprios eleitores da oposição recusaram acompanhar seu candidato no caminho do estelionato que pretendia.
Percebendo que a identificação dos resultados governamentais, da popularidade do Lula eram transferidas para a candidata que representa esta continuidade lançou-se mão do recurso às acusações e denuncias visando exclusivamente a impedir a manifestação de uma maioria clara para o novo mandatário. Fernando Henrique Cardoso reconhece hoje que a eleição do presidente no 1° turno seria normalmente uma situação mais positiva para o eleito. Segundo o ex-presidente, “Em condições normais, a vitória no primeiro turno dá muita força política ao novo presidente e torna seu apoio político no Congresso mais fácil”, disse Fernando Henrique à Reuters. Mas ato seguido procura colocar em dúvida esse significado político para Dilma, por ter sido uma escolha de Lula e eleita com seu apoio, como se o voto dos cidadãos fosse desprezível.
Para atingir o objetivo de enfraquecer o futuro governo, utilizam o recurso a denuncias e acusações lançadas pela metralhadora giratória fornecida por setores da mídia, identificados com a candidatura da oposição, visando o objetivo de impor um segundo turno. Não que todas as acusações sejam necessariamente invencionices, nem que exista um plano preconcebido por um suposto estado maior mediático. Bem que no caso do sigilo fiscal a tentativa seguiu um plano consciente do candidato tucano e contou com o apoio da mídia em peso. Já a denuncia de espionagem feita pelas autoridades judiciais contra um colaborador da tucana Yeda Crusius não teve o mesmo tratamento. Atirasse à esmo, mas na mesma direção, e às vezes acertasse algum alvo; depois se faz um esforço para tentar convencer o eleitor que todos são pássaros do mesmo teor e que a única ave que presta é a de plumagem preta e bico predador. En passant, sonegasse ao eleitor a discussão de propostas e programas, balanços e perspectivas para o país, evitando assim que ele identifique nos progressos conquistados nestes oito anos a candidata a ser escolhida no pleito. Note-se que esse clima de denuncismo só estourou quando o candidato tucano perdeu a liderança nas pesquisas. Quando ainda era o favorito e afirmava com muito cinismo que Lula estava acima do bem e do mal, pouco espaço fornecia-se a esses tiros à granel aos quais assistimos posteriormente.
Os últimos cartuchos estão sendo utilizados agora em apoio a uma suposta onda, na qual quem pretende surfar é o candidato tucano. As pesquisas são trituradas para apresentar uma versão mais acorde com à vontade de impor um segundo turno, que com a frieza que corresponde ao tratamento isento dos resultados fornecidos com certo rigor pelos próprios institutos. Isso permite a alguns analistas e jornais pretender à existência de uma queda generalizada em todos os segmentos e todas as regiões da candidata favorita, como escreveu cheio de otimismo Merval Pereira ontem no Globo.
Não é que as pesquisas sejam manipuladas para criar esse impacto. Seus resultados não apresentam enormes diferencias entre si, todas mais ou menos coincidentes nas margens de erro. Mas sonegasse uma informação aqui – a rejeição de Serra, por exemplo -; destacasse um fato ali – o voto de um segmento, outro exemplo – mas não se diz de quanto é a margem de erro da pesquisa aplicada a esse segmento, e por ai vai. Tempera-se o conjunto com manchetes apropriadas e diagramação estudada para obter o objetivo pretendido. Sempre existirá o álibi da margem de erro, do resgate de matérias críticas publicadas sobre outros governos ou a publicação de uma crítica aqui e outra denuncia acolá. Mas o senso geral do procedimento é muito claro, só que difícil de ser implementado. A dificuldade provem em primeiro lugar, e pode parecer paradoxal, da liberdade total de expressão e de imprensa existente no Brasil. De sorte que a diversidade acaba se expressando na ação de inúmeros atores do processo de transmissão da informação e da formação da opinião pública. Jornais, revistas, publicações regionais, internet, blogs, e mais geralmente uma população com acumulo de experiência e o trabalho de milhares de militantes anônimos de partidos, sindicatos e entidades das mais diversas.
Esse embate acabou provocando “vítimas colaterais” e cruzadas inadequadas. Como o adversário se dissimulava detrás de alguns biombos, alguns investem contra os mesmos como se estes fossem o candidato a ser derrotado no domingo. Alguns pegam carona nesses embates, para resolver suas próprias pendencias ou galgar reconhecimento. Coube a direção da campanha da Dilma a sabedoria de não se deixar arrastar para esse confronto.
Ainda teremos outras pesquisas com resultados semelhantes e diferentes. Assim até o domingo inclusive. Ainda teremos um debate e a pesquisa do debate. Teremos denuncias e denuncismos, rumores e boatos, guerra suja e factoides. Nada de isso alterará substancialmente a determinação do eleitorado que já esta com o voto bastante consolidado, mas pode definir se a disputa se encerra no domingo.
Para o país seria o melhor desfecho. Os eleitores decidirão.
Luis Favre
Postado por Luis FavreComentários Tags: 2010, eleições, Favre
Do Blog do Favre.
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