Igor Natusch - Sul 21.
O crescimento da internet, visível em todos os níveis, ganhou dimensão inédita na última eleição presidencial brasileira. Mais do que a simples disseminação de informações, os blogues políticos multiplicaram-se na rede e surgiram como espaço de análise, resgate histórico e discussão política. Especialmente no segundo turno, as acusações entre Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) encontraram nos blogues, e também em redes sociais como o Twitter, espaço não apenas para sua disseminação, mas também para sua contestação. Os blogues e o Twitter não só promoveram os candidatos como foram alvo de ações inéditas. O TSE chegou a conceder um direito de resposta a José Serra no Twitter, a respeito de mensagens publicadas pelo deputado estadual Rui Falcão (PT-SP). Tem mais: blogues e Twitter podem ser o germe de um novo tipo de organização política.
A importância dos blogues foi tão grande que chegou a ser criada uma rede de blogueiros progressistas, ligada à candidatura de Dilma Rousseff (PT). Além de participarem da frente pró-Dilma (que chegou a congregar mais de 340 blogues), muitos dos integrantes se envolveram ativamente nas discussões políticas e promoveram um Encontro Nacional, ocorrido no final de agosto. Entre os identificados com o movimento, estão alguns dos blogueiros mais acessados do Brasil, como Luís Nassif, Luiz Carlos Azenha, Rodrigo Vianna, Eduardo Guimarães e Paulo Henrique Amorim.
Alternativa importante
Luiz Carlos Azenha, jornalista e responsável pelo blogue Viomundo, defende opinião semelhante. “Eu diria que o papel dos blogues foi maior do que a grande mídia gostaria de admitir, mas menor do que o imaginado”, diz. Para ele, há uma “discriminação de informação” que se manifesta em vários níveis, inclusive na dificuldade que boa parte da população enfrenta para acessar a internet. “Para a classe média, que tem acesso à internet rápida, os blogues políticos acabaram oferecendo uma alternativa. Não foram decisivos, mas foram uma alternativa importante de debate”.
Contrainformação
Para o sociólogo, o impacto dos meios digitais no segundo turno de 2010 pode ser comparado ao impacto da televisão, registrado no segundo turno das eleições de 1989, entre Lula e Fernando Collor. “Nos assustamos com a dimensão que a coisa (internet) estava tomando, e ninguém estava muito preparado para saber como lidar com uma rede sem hierarquia. O Marcelo Branco (coordenador de redes sociais da campanha de Dilma Rousseff), por exemplo, apanhou o tempo todo. Tivemos todos que aprender na marra”, explica.
O jornalista e blogueiro lembra de pontos no qual a participação dos blogueiros alinhados com Dilma foi importante, como na lembrança de que o governo de Fernando Henrique Cardoso tentou rebatizar a Petrobras como Petrobrax. “Serra garantiu, durante um debate, que o nome Petrobrax foi só ideia de um publicitário, nunca chegou a ser aprovado. Os blogues se encarregaram de resgatar material da época, e o Twitter ajudou a disseminar a informação. Muita coisa não estava mais disponível, e nós fomos atrás. Se isso tivesse acontecido há alguns anos, um número bem menor de pessoas teria tido contato com esse material”.
Critérios jornalísticos
“No final do primeiro turno, o nível da campanha na internet caiu muito”, lembra o blogueiro Rudá Ricci. Nesse sentido, os blogues teriam sido decisivos, inclinando a disputa para o lado de Dilma Rousseff (PT). “Os blogues trouxeram muita informação. No caso envolvendo Paulo Preto (assessor de Serra que teria fugido com dinheiro arrecadado para a campanha), os blogues postaram fotos de José Serra ao lado dele. O candidato, que tinha negado, foi forçado a admitir que o conhecia. A organização da militância pró-Dilma soube usar os blogues de forma bem mais efetiva. A Rede de blogueiros progressistas foi importante, mas a atuação não se resumiu a isso”.
Luiz Carlos Azenha aponta uma outra dimensão política dos blogues, geralmente ignorada pelos analistas: as discussões motivadas nas caixas de comentários. “Algumas postagens no meu blogue, durante essa eleição, tiveram mil comentários ou ainda mais. Existe uma grande militância digital, geograficamente bem distribuída, mas sem organização formal, que fazem contato por meio dos posts de um determinado blogue. Nesse sentido, os blogueiros acabam sendo mediadores, enquanto os comentaristas funcionam como formigas, abelhas que disseminam informação”.
Desobediência civil no DNA
Luiz Carlos Azenha, do Viomundo, diz que a Justiça Eleitoral foi pega de surpresa pelo crescimento da internet nessas eleições. Ele defende que a liberdade da internet deve ser “ainda maior” que a de imprensa. “O único limite deve ser o do crime ou delito, coisas que já estão previstas no Código Penal”, diz, exemplificando com recentes demonstrações de preconceito contra nordestinos, disseminadas por usuários do Twitter após a votação de 31 de outubro.
O cientista político da CAC Consultoria Política acredita ser “complicado” cercear a liberdade característica da internet. “A autorregulamentação é uma característica fundamental da internet. Tentar impor leis sobre ela está condenado a cair no ridículo. É impossível aplicar a lei eleitoral da mesma forma que na TV ou na mídia impressa, porque uma informação lançada na rede acaba tendo um voo próprio. Tem que deixar correr”, defende.
Importância deve crescer
Fábio Bebber, da My Image, acredita que a TV continua sendo o grande veículo de impacto político junto ao eleitor. Mas vê perspectivas para o crescimento da internet nesse panorama. “É importante pensar as mídias digitais dentro de uma estratégia contínua, indo além de simplesmente enviar o endereço do site ou usar o Twitter como um mecanismo de conversa online. Os blogues, em especial, servem como um meio de sistematizar informações. Muitos eleitores ainda estão pouco expostos à internet, a tendência é que isso aumente com o decorrer do tempo”.
O blogueiro Luiz Carlos Azenha detecta uma migração crescente para a internet, a partir da universalização da banda larga no Brasil. Os efeitos sobre o eleitorado, acredita, serão intensos. “Já temos um grande número de eleitores que se informam quase exclusivamente pela internet”, diz. A queda de custos de aparelhos eletrônicos, como celulares e câmeras digitais, amplia ainda mais a margem de atuação dos blogues e das mídias eletrônicas em geral. “Hoje em dia, com um pequeno treinamento, qualquer um já é capaz de criar conteúdo jornalístico original”, afirma Azenha. “A atualização e disseminação de informação será cada vez mais rápida. Não há como prever onde isso vai parar”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário