Na Copa de 1970, Dilma estava presa e era torturada nos porões da ditadura, enquanto o futebol brasileiro encantava o mundo. Hoje, ela é a presidente de um novo “Brasil Grande”
Leonardo Attuch – No dia 16 de janeiro de 1970, Dilma Rousseff, a “guerrilheira Wanda”, foi enfim capturada num bar da Rua Augusta, em São Paulo. Um ano antes, a organização VAR-Palmares, encabeçada por ela, planejara o sequestro do ministro Delfim Netto, símbolo do milagre econômico e do regime militar. Dilma foi levada aos porões da ditadura, onde foi torturada durante 22 dias consecutivos. Do lado de fora, o País cantava: “Noventa milhões em ação, pra frente Brasil, salve a seleção”. A canção, do compositor Miguel Gustavo, até hoje evoca as glórias da seleção canarinho e o passado sombrio do regime militar.
Na Copa de 1970, no México, Dilma estava trancafiada, enquanto Pelé encantava o mundo. Numa cela escura, a guerrilheira mal recebia notícias do mundo exterior. O futebol era uma exceção. E foi na cadeia que ela aprendeu a gostar do esporte mais popular do planeta. Hoje, 41 anos depois, e na condição de presidente da República, Dilma estava visivelmente emocionada ao se referir ao seu “amigo Pelé”, a quem convidou para ser embaixador extraordinário do Brasil na Copa de 2014 – Dilma foi efusiva e calorosa com Edson Arantes do Nascimento e seca com Ricardo Teixeira, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol.
No presídio Tiradentes, em São Paulo, Dilma acompanhava as vitórias do Brasil em 1970 pelo rádio. E discordava da tese, propalada por muitos esquerdistas, de que o futebol era o ópio do povo. Num encontro recente que tive com a presidente, na campanha presidencial de 2010, e às vésperas da Copa da África do Sul, ela falou com conhecimento de causa sobre a seleção brasileira. Disse que Dunga deveria convocar os jogadores Ganso e Neymar, do Santos, que, hoje, curiosamente, são os principais astros da seleção brasileira e estavam no sorteio dos grupos eliminatórios da Copa de 2014. Durante a prisão, dizia Dilma, o futebol foi seu ponto de contato com o mundo exterior.
Brasil Grande
Hoje, curiosamente, Dilma é a presidente de um novo “Brasil Grande”. Seu governo de grandes obras e dos megaprojetos de infraestrutura também evoca o tempo dos generais, a quem ela tanto combateu. E o evento de transmissão do sorteio da Copa também lembrou o passado. Havia um quê de “Amaral Neto” no oficialismo da transmissão da Rede Globo, que recebeu R$ 15 milhões da prefeitura do Rio de Janeiro para organizar o evento.
No mais, todos os chavões da brasilidade. Ivete Sangalo cantando País Tropical, um neto de Tom Jobim executando um clássico da Bossa Nova, uma orquestra tocando Aquarela do Brasil e até um poeminha piegas de Pedro Bial sobre as belezas naturais do Brasil.
Enquanto isso, do lado de fora, o pau comia. Era o polícia do Rio de Janeiro reprimindo com cassetete os manifestantes que protestavam contra o mandarinato de Ricardo Teixeira na CBF e a farra com dinheiro público nos estádios da Copa – nossos novos elefantes brancos.
Sim, o Brasil mudou muito desde a Copa de 1970. Mas será que mudou mesmo na sua essência?
Tendo mudado ou não, vale a pena escutar Pra frente, Brasil:
Fonte: Brasil 247
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