Acima de tudo, ela é mais uma escada pela qual se tenta pegar novamente Lula
Lula é, certamente, o homem mais odiado pelo chamado 1%, para usar a
já histórica expressão do Movimento Ocupe Wall St. (Para os 99%, o posto
é de Serra, com o surgimento de uma concorrência potencial em Joaquim
Barbosa, o Batman.)
É impressionante o júbilo com que é celebrada pelo 1% qualquer
notícia que possa servir de munição contra Lula, o lulismo, o
lulo-petismo e outras designações criadas pelos obsequiosos porta-vozes
de um grupo pequeno mas barulhento que torce e trabalha para que o
Brasil jamais se torne uma Dinamarca, ou uma Noruega, ou uma Finlândia.
São sociedades harmoniosas, não divididas entre 1% e 99%, como o
Brasil. Apenas para registro, o Brasil campeão mundial da desigualdade –
com todos os problemas decorrentes disso, a começar pela criminalidade –
foi obra exatamente deste grupo.
O Estado brasileiro foi durante décadas uma babá do 1%. Calotes em
bancos públicos eram sistematicamente aliviados em operações entre
amigos – mas com o dinheiro do contribuinte. Cresci, como jornalista,
nos anos 1980, com o Jornal do Brasil transformando dívidas com o Banco
do Brasil em anúncios.
Este é apenas um caso.
O BNDES foi sequestrado, também, pelo 1%: a inépcia administrativa de
tantas empresas familiares malacostumadas pela reserva de mercado era
premiada com operações de socorro financeiro. Sempre com o dinheiro do
contribuinte.
Apenas para registro também, lembremos que a reserva de mercado
sobrevive ainda – não me pergunte por que – na mídia que tanto clama por
competição, mas para os outros.
O 1% detesta Lula, não porque Lula tenha nove dedos, ou seja
metalúrgico, ou fale errado, ou torça pelo Corinthians. Detesta Lula
porque ele não representa o 1%. Se representasse, todos os seus defeitos
seriam tratados como virtudes.
Não votei em Lula nem em 2002 e nem em 2006. Portanto, não tenho
mérito nenhum na sua chegada à presidência e na consequente, e
fundamental, mudança de foco do governo – ainda que cheia de erros —
rumo aos 99%.
Mas não sou cego para não enxergar o avanço. O maior problema do
Brasil – a abjeta desigualdade social – começou ao menos a ser
enfrentado sob Lula.
Hoje, quando homens públicos em todo o mundo elegem a desigualdade
social como o mal maior a debelar, parece óbvio que Lula tinha mesmo que
prestigiar os 99% ao se tornar presidente.
Mas nenhum presidente na era moderna nacional viu o óbvio. Mesmo ao
erudito poliglota Fernando Henrique Cardoso – de quem ninguém pode
subtrair o mérito por derrubar a inflação – escapou o óbvio. Tente
encontrar alguma fala de FHC, na presidência, sobre o drama da
iniquidade social. Em qualquer uma das múltiplas línguas que ele domina.
Zero.
É dentro desse quadro de colossal ódio a Lula que se deve entender a
forma com quem está sendo tratado o caso de Rosemary Nóvoa de Noronha,
indiciada por corrupção pela Polícia Federal em suas funções como chefe
do escritório do gabinete da presidência em São Paulo.
Rosemary foi demitida imediatamente por Dilma, e agora vai responder
pelas suas supostas delinquências, como um cruzeiro e uma plástica na
faixa, pelo que foi noticiado.
Mas ela é personagem secundária na chamada Operação Porto Seguro. O
protagonista é Lula, que a indicou. Nos artigos sobre a história, Lula
ocupa o pedestal. “A mulher do Lula”, escreveu alguém.
Rosemary é uma escada pela qual, mais uma vez, se tenta pegar Lula.
Estaria Lula envolvido na plástica suspeita de Rosemary? E no cruzeiro? O
dinheiro terá vindo do valerioduto?
Chega a ser engraçado.
Tenho para mim o seguinte. Se os lulofóbicos dedicassem parte da
energia que consomem em odiá-lo na procura honesta de formas de
convencer os eleitores de que são mais capazes que Lula para combater a
desigualdade social, eles já estariam no Planalto a esta altura, e do
jeito certo, numa democracia: pelas urnas.
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