domingo, 14 de março de 2010

Vinte anos do plano Collor

Leiam por favor com atenção. No blog de Nassif, http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2010/03/13/vinte-anos-do-plano-collor/#more-51460

13/03/2010 - 23:29

Na posse de Fernando Collor estava em Brasília. Alguns anos antes, a Folha havia entregado minha cabeça de bandeja a Saulo Ramos, depois que denunciei o segundo decreto do Cruzado – que beneficiava empresas em liquidação extrajudicial.

Tinha começado a trabalhar, também, na rádio Bandeirantes AM, no programa do José Paulo e do Salomão Esper, de belíssima penetração em São Paulo.

A Dinheiro Vivo já tinha saído do papel. Alguns meses antes, convidamos Zélia Cardoso de Mello para o almoço mensal que promovíamos. Foi um vexame. Seu despreparo era evidente. O outro palestrante era o professor Affonso Celso Pastore. Temi que, com sua rude franqueza, desse uma desqualificada em Zélia. Ele foi cavalheiro. Mas alguns dos convidados, empresários em formação econômica, questionaram suas afirmações, demonstrando seu amplo despreparo.

No mesmo período, a ANORO (Associação Nacional do Ouro) promoveu um debate entre os candidatos em São Paulo, para saber o que pensavam sobre o ouro – na época, o grande ativo para permitir alguma flexibilidade cambial. O representante do Lula – Carlos Eduardo, que escrevia eventualmente a capa do Guia Financeiro – deu uma aula, mostrando como poderia ser utilizado para a constituição de reservas e para dar alguma conversibilidade ao país. O de Collor falou sobre os problemas do mercúrio nos rios onde havia garimpo. Os presentes se entreolhavam, sem entender nada.

Havia poucas cabeças lúcidas na equipe: o Ibrahim, o Luiz Carlos Assis, o Kandir.

Pouco antes da posse de Collor, nosso boletim Guia Financeiro, havia aventado a possibilidade de um bloqueio de cruzados. Mas tudo meio nebuloso, no campo das especulações amplas que antecederam a posse de Collor.

No dia da posse, estava eu no Tenis Club de Brasilia, do lado de fora da sala onde se encontravam Zélia, Ibrahim Eris, Antonio Kandir, se não me engano também o Luiz Gonzaga Belluzzo. Em determinado momento Eris saiu da sala. Não o conhecia até então. Fui até ele, mas não consegui arrancar nenhuma declaração.

Pouco depois, saiu Zélia. Eu estava a uns trinta metros dela. Ameacei caminhar em sua direção mas ela me enviou um segurança para alertar que não podia chegar perto dela. Saí bufando, descendo as escadas do Clube. Ela percebeu, veio em minha direção e disse para compreender a importânciad o momento. Respondi-lhe que não conseguia entender apenas grosserias.

Só sei que dali não saiu nada.

Pouco depois fomos para o Ministério da Fazenda. Lá, permitiram a um grupo restrito de jornalistas entrar na sala para a entrevista. Estávamos eu, o Paulo Henrique, Joelmir, a Lilian, o Tamer, entre outros.

Foi uma entrevista caótica. Zélia não sabia do que falava. Quando anunciou que as pessoas só poderiam ficar com R$ 50 mil na conta, foi uma confusão. O Paulo Henrique entendeu que dali para frente estavam proibidos ganhos mensais acima de R$ 50 mil. O Joelmir tinha acabado de vender uma casa e estava com o dinheiro no banco. A Lilian Witte Fibe levou no ar, na Globo, sua estupefação. Refletia de modo tão genuíno a surpresa geral que marcou por muitos anos (positivamente) sua imagem.

No meio da entrevista, Zélia foi explicar um fator que seria aplicado na inflação. Era uma formulação matemática similar ao do vetor, aplicado em outros planos econômicos, para impedir que a inflação passada contaminasse a futura.

Indaguei se era vetor. Ela disse que não. Insisti, mostrando a lógica do que ela dissera. De repente, me dou conta do Ibrahim Ëris, atrás de Zélia, me olhando fixamente. Quando devolvi o olhar, ele balançou afirmativamente a cabeça, como que dizendo «é vetor sim, mas não aperte a Zélia».

Depois da coletiva restrita, fomos para o auditório da Fazenda, onde os setoristas aguardavam membros da equipe para tirar as dúvidas. Nem mesmo eles sabiam de todos os desdobramentos sobre contratos e ativos.

Um deles – Eduardo (que depois chegou a presidente da Petrobras) -, extremamente nervoso, mostrava-se agressivo com qualquer descrição de dramas individuais por parte dos jornalistas. Mandei um bilhetinho para ele: «Prezado, pare com isso. Você está tripudiando em rede nacional sobre o drama que afeta milhares de pessoas». Parece que de acalmou um pouco.

Os meses seguintes foram de uma loucura ampla. O sistema financeiro possuía sistemas capazes de administrar apenas uma moeda. Com o bloqueio, havia a necessidade de dois sistemas, uma para o cruzado novo, outra para o cruzeiro.

Durante dias o sistema parou e ficou-se no escuro. Não se tinha a menor ideia, depois de baixada a espuma, sobre que banco estaria quebrado ou não.

Na volta a São Paulo, deu para perceber o estrago que o bloqueio produziu em Collor. Desci no Aeroporto junto com um conhecido, herdeiro do grupo BIC – de um dos famosos coronéis do Ceará, primeiro a dar apoio a Collor.

Perguntei como a família estava encarando o apoio. Enquanto falava, o filho, de 5 anos, entrou correndo em sua direção na sala de embarque. Enquanto o filho chegava ele me contava que o entusiasmo anterior era tão grande que o filho batizara seu canário de Collor.

Aí o menino pulou em seu pescoço e ele perguntou:

- O que o Collor é, filho?

E o moleque:

- É um FDP.

Matéria publicada por Leda Ribeiro (Colaboradora do Blog)

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