segunda-feira, 6 de setembro de 2010

R$ 680 bilhões em investimentos


Petróleo e gás movimentarão economia nos próximos 10 anos. Produção de óleo deve crescer 126%


Gustavo Paul e Eliane Oliveira – O GLOBO

BRASÍLIA Uma brincadeira contada dentro do governo diz que a Petrobras é tão grande, tão rica e poderosa, que deve ser encarada “no máximo, como uma nação amiga”. Essa mesma impressão poderá ser sentida, em um futuro próximo, em relação à economia que gira em torno do petróleo brasileiro.

As cifras gigantescas justificam o interesse despertado nas últimas semanas em torno da capitalização da Petrobras: estima-se que, embalado pelo pré-sal, em dez anos, o setor vai demandar investimentos de, pelo menos, R$ 680 bilhões, somando-se a demanda por bens, serviços, exploração e produção.

Ao longo da última década, a participação do setor no Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) cresceu quatro vezes, passando de 2,5% em 1999 para cerca de 12% este ano e deve aumentar ainda mais. Enquanto isso, o volume de petróleo exportado pelo país cresceu 2.674% em dez anos, levando a venda de óleo do 21olugar da pauta brasileira em 2001 para o segundo lugar este ano. A produção brasileira de petróleo deverá crescer pelo menos 126% até 2019, enquanto a de gás vai dar um salto de 188%. Já as reservas nacionais devem dobrar de tamanho em quatro anos.

BNDES tem R$ 24 bi para setor naval

Só o BNDES tem, aprovados e em fase de aprovação, na área naval voltada ao petróleo, investimentos que somam R$ 24,983 bilhões do Fundo de Marinha Mercante em 85 projetos. É mais do que o banco vai disponiblizar para empreendimentos como a usina de Belo Monte (até R$ 13,5 bilhões) e o Trem de Alta Velocidade (TAV, até R$ 19,9 bilhões), que ligará o Rio a São Paulo.

— A demanda está muito grande e o fato gerador são as descobertas do pré-sal. Esses investimentos na parte naval e em navipeças são inéditos — afirmou Vinícius Figueiredo, gerente do Departamento de Gás e Petróleo do BNDES.

Acompanhando o movimento do setor, há duas semanas, o banco criou um departamento exclusivo com foco na cadeia produtiva do petróleo. Ao mesmo tempo, grupos empresariais estão se juntando para ganhar musculatura e pleitear um naco dessa atividade econômica, que será turbinada, a partir de 2011, com a produção do pré-sal já licitado e, provavelmente, com as primeiras licitações nos megacampos.

O Portal de Oportunidades do Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (Prominp) já contabiliza 3,3 mil empresas cadastradas. Segundo o coordenador executivo do Prominp, José Renato Ferreira Almeida, cerca de 500 empresas de todo o tamanho e de vários estados do país estão aderindo a esse banco de informações todo mês. Ali eles expõem seus produtos e podem também buscar fornecedores.

— Devemos chegar a 5 mil até o final do ano e 40% são empresas paulistas, onde o setor de petróleo e gás ainda inicia suas atividades — diz Almeida.

Exigência é de 65% de conteúdo local

O setor não se limita aos novos campos do pré-sal. Com três anos de existência, a OGX, braço da holding EBX, do bilionário Eike Batista, tem em caixa US$ 3,4 bilhões para investir em 21 blocos no pós-sal da Bacia de Campos e também já se aventura em poços em terra. O diretorgeral da empresa, Paulo Mendonça, também vê a movimentação de fornecedores que, segundo ele, está apenas no começo.

— O Brasil deixou de ser um país de petróleo para ser um país petrolífero, como a Venezuela, o México e outros — afirma Mendonça.

A WD Group, holding formada por quatro empresas especializadas em verificação de dutos, soldas e superfícies em plataformas de petróleo e gás, estaleiros e portos, aposta na expansão do setor.

— Atendemos a grandes empreiteiras que atendem a Petrobras — diz Marcelo Freitas, diretor do grupo.

O empresário André Lincol, da IWC Engenharia, entrou no mercado de petróleo e gás dando consultoria no Rio. Hoje, dirige um curso de treinamento técnico presente em diversos estados brasileiros e abriu uma empresa de construção de equipamentos para offshore (no mar), estruturas metálicas diversas, tubulação e instalação de dutos submersos.

— O pré-sal ainda não começou.

Hoje, o que vemos mais é o desenvolvimento de tecnologias, e não pondo a mão na massa. Enxergamos oportunidades — diz Lincol.

Essa movimentação impressiona até quem tem décadas de vivência no setor. É o que relata o secretárioexecutivo do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), Álvaro Teixeira, que começou na Petrobras em 1960, quando a meta era produzir petróleo para ajudar a suprir o país: — Estamos vivendo um momento mágico. Nas décadas de 60 e 70, ninguém podia imaginar que o Oriente Médio estava ao lado do Rio — disse, referindo-se às bacias de Campos e Santos, no litoral fluminense.

A Organização da Indústria do Petróleo (Onip) viu aumentar em dez vezes o número de empresas cadastradas desde 2000, passando de 210 para 2.164. Para José Velloso, vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), esse número poderá crescer, diante da decisão do governo de estabelecer um índice médio de conteúdo local de 65% na fase de exploração do présal.

Por enquanto, lembra, ainda existem muitos empecilhos.

— Temos ainda uma corrida de obstáculos, como câmbio, tributos e custo de dinheiro. Mas esse percentual vai incentivar a produção local — afirma Velloso.

Estados produtores tentam preservar seus royalties

Antecipação da produção em campos do pré-sal reforçaria argumento de direito adquirido de RJ, SP e ES

BRASÍLIA. A pujança da economia do petróleo tem por trás a disputa em torno das receitas que irão para os cofres de estados, municípios e União.

A discussão sobre a distribuição de royalties, que nos últimos meses pôs em pé de guerra os estados produtores (Rio, Espírito Santo e São Paulo) com os demais entes da federação, ainda não foi resolvida.

Os governos dos estados produtores apostam agora na antecipação da produção em dois campos do présal.

Em julho, começou a exploração de Baleia Franca (ES). E a Petrobras deve antecipar, de dezembro para setembro, o início em Tupi, na Bacia de Santos. Assim, criam um fato consumado contra as mudanças nos campos de pré-sal já licitados, reforçando o argumento de que não se pode mudar um direito adquirido.

— A exploração no pré-sal já é uma realidade incontestável — disse um dos estrategistas dessa mobilização dos produtores.

No campo parlamentar, sob comando dos governadores, as bancadas estaduais vão tentar protelar ao máximo a votação do projeto que cria o modelo de partilha e muda a distribuição dos recursos. Se possível, até 2011. A votação está prevista para depois das eleições, mas o governo ainda não decidiu quando tentará levar o texto ao plenário. Segundo um dos estrategistas, quanto mais tempo demorar a votação, melhor.

Enquanto isso, os estados produtores estão se movimentando discretamente.

A estratégia tem algumas frentes: jurídica, parlamentar e política.

A parte política começou no início de agosto quando, pela primeira vez, as autoridades do governo paulista se manifestaram com mais veemência contra as mudanças.

Desde que a discussão sobre os royalties esquentou, no fim de 2009, o ex-governador paulista José Serra, manteve-se calado. De olho na candidatura presidencial, Serra não quis se indispor com os demais estados. A mudança de estratégia atual é fruto de conversas, em julho, entre os governadores Alberto Goldmann e Paulo Hartung, do Espírito Santo.

Em evento recente, o secretário paulista de Desenvolvimento, Luciano Almeida, criticou as mudanças propostas.

Sua secretaria fez uma projeção das perdas com a emenda do deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS). De uma arrecadação de R$ 68 bilhões (para reservas de 30 bilhões de barris no présal), São Paulo levaria R$ 1,7 bilhão durante a produção, ou 2,5% do previsto.

A receita anual, de R$ 1,2 bilhão, cairia para R$ 66 milhões em 2018.

Rio e Espírito têm ações prontas para entrar no Supremo

A Emenda Ibsen altera a lei atual, redistribuindo entre todos os estados e municípios a receita de royalties e participações especiais com os campos já licitados e as futuras áreas do pré-sal. Para o Rio, isso representará uma perda anual de R$ 7 bilhões.

Projeções da Empresa de Planejamento Energético (EPE) apontam que São Paulo terá uma arrecadação ascendente com as áreas do pré-sal já licitadas. Sob as regras atuais, em 2020, a arrecadação deverá ser de R$ 9 bilhões e, em 2025, R$ 16,9 bilhões.

As procuradorias jurídicas de Rio e Espírito Santo já deixaram prontos pareceres para contestar no Supremo Tribunal Federal (STF) o projeto a ser aprovado na Câmara dos Deputados, caso o presidente Lula não vete o artigo sobre os royalties. Em julho, o procurador do estado Luís Roberto Barroso entregou à ProcuradoriaGeral do Rio parecer de que as mudanças são inconstitucionais.

O procurador-geral do Espírito Santo, Rodrigo Rabelo, na argumentação da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), diz que a Emenda Ibsen fere o princípio constitucional do “direito adquirido”.

(Gustavo Paul)

Postado por Luis Favre
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Do Blog do Favre.

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