Marcos Coimbra
Quando os historiadores do futuro fizerem o balanço da época em que
vivemos, é bem provável que sobressaiam coisas às quais hoje não damos
nenhuma importância. É quase impossível dizer quais serão. Alguém
perceberia, em 1960, nos trabalhos de um obscuro engenheiro da Rand Corporation, a semente da internet?
O que, do presente, entrará para a história? De tudo que achamos
importante hoje, o que, no futuro, permanecerá significativo? Ninguém
sabe.
Mas há um consolo: é fácil perceber o que se provará irrelevante. Em
tudo – na vida social, nas artes, na ciência, na tecnologia – não é
complicado enxergar o desimportante.
Também na política. E se há um candidato ao troféu de maior não evento
deste período de nossa vida política, seu nome é “o julgamento do
mensalão”. Quem lê a dita grande mídia brasileira tem a impressão
oposta. Fica com a sensação de que se trata de uma coisa fundamental.
Que é a mais transcendental de todas as que temos em nossa agenda.
Isso só se acentuou depois que a CPI do Cachoeira se tornou inevitável. A
partir daí, os principais veículos de nossa indústria de comunicação,
seus editorialistas, colunistas e comentaristas, decretaram que o
“julgamento do mensalão” seria a prioridade.
Exigem que seja logo, que conclua pela culpa dos -acusados e reclamam
punições exemplares. Têm consciência de que, juridicamente, o caso é
frágil, mas não se importam: afirmam que a “opinião pública” clama por
uma “resposta firme”. E que o STF tem a obrigação de atendê-la. E que o
ministro que titubear na condenação é fraco – para dizer o mínimo.
O que querem do julgamento? Simples – e errado – seria dizer justiça. Na
democracia, essa só aparece ao final, depois que o rito judiciário é
integralmente cumprido. Nunca antes.
Admitamos, por hipótese, que o STF resolva pela absolvição de todos ou
alguns dos acusados – o que, pelas provas coletadas contra eles, não
seria surpresa. Estará nossa mídia disposta a aceitar o julgamento como
justo? Ou, como já condenaram todos por antecipação, a decisão será
questionada e ridicularizada?
É possível que ela se sinta “representante” e “guardiã do povo”, em seu
nome exigindo justiça. O problema é que nada sustenta a tese. A
sociedade não dá qualquer mostra de que deseja que ela exerça tal papel.
O “julgamento do mensalão” não quer dizer nada para a vastíssima maioria
do País. Ela nem sequer sabe que está por acontecer. É claro que existe
uma militância oposicionista na sociedade, que se agita e reivindica
rigor no julgamento. Só que é pequena. Quando, por exemplo, tentaram
encher as ruas de “indignados”, ficou claro que são poucos.
Que vitória política terão os adversários do governo e do “lulopetismo”
se os acusados forem condenados? Isso alteraria a avaliação largamente
favorável dos oito anos de Lula e dos quatro de Dilma, que começaram
bem, aos olhos da população? Isso mudaria o favoritismo de ambos – pois
Lula e Dilma lideram com imensa vantagem as pesquisas – para vencer as
eleições de 2014? O “julgamento do mensalão” não vai reescrever o
passado ou modificar o futuro da política brasileira.
A campanha para que aconteça já e para que redunde na condenação de
todos os acusados nada tem a ver com a ideia de justiça. Não responde a
anseios reais da vasta maioria da sociedade. Nada altera de concreto em
nossa política. É por isso que seu significado no longo prazo é tão
limitado.
Mesmo que, nos próximos meses, tenhamos de ouvir falar do assunto até não poder mais.
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