Bem que procurei outro assunto mais ameno para tratar neste feriadão afro-republicano que está só começando, mas não teve jeito.
Ninguém fala de outra coisa na mídia, no trabalho, nos botecos e nas
padarias, nas feiras e nos táxis, onde quer que você vá: o medo da
violência tomou conta dos paulistanos.
Leio aqui no nosso R7 que,
"depois de duas noites seguidas de uma queda brusca no número de
homicídios na região metropolitana de São Paulo, a capital paulista e
demais municípios, juntos, tiveram um saldo de pelo menos sete pessoas
mortas e 17 feridas a tiros num intervalo de sete horas e meia, entre as
21 horas de quarta-feira e as 4h30 desta quinta-feira".
Se as causas deste clima de insegurança pública continuam as mesmas,
nada vai mesmo mudar enquanto as nossas autoridades de todos os níveis
apenas fizerem diagnósticos e não tomarem providências urgentes e
concretas para enfrentar este problema crônico da violência urbana que
tomou conta das nossas cidades.
De repente, depois das portas arrombadas, parece que todos descobriram a
pólvora. "Se fosse para cumprir muitos anos em uma prisão nossa, eu
preferiria morrer", disparou o ministro da Justiça, José Eduardo
Cardozo na terça-feira, deflagrando uma reação em cadeia que chegou até
aos ministros do Supremo Tribunal Federal.
"STF cobra do governo melhoria nas cadeias", dá hoje em manchete o
jornal "O Globo", como se a situação do nosso sistema penitenciário, de
onde partem as ordens dos chefões do tráfico para as ações contra
policiais, não fosse gravíssima faz muitas décadas, com as cadeias
transformadas em escolas do crime que não recuperam ninguém.
Só agora o ministro Cardozo constatou que a violência fora de controle
em São Paulo e outras cidades tem "tudo a ver" com a situação
carcerária. "O terror nos presídios não resolve o problema da violência,
só fortalece as organizações criminosas".
E daí? Daí se descobre que o Ministério da Justiça, que tem entre suas
atribuições o "planejamento, coordenação e administração da política
penitenciária nacional", usou apenas 16% do previsto no orçamento deste
ano para a construção de presídios.
Do total de R$ 312 milhões destinados a "financiar e apoiar as
atividades de modernização e aprimoramento" do sistema penitenciário, o
ministro aplicou apenas R$ 63 milhões.
Com o dinheiro que ficou parado daria para construir mais 8 presídios, o
que certamente poderia aliviar o drama dos condenados empilhados em
cadeias superlotadas, como o próprio Cardozo pode ver durante uma
inspeção em 2011:
"A primeira constatação grave foi a violação sistemática dos direitos
humanos e a impossibilidade de reinserção do preso. A situação é
inaceitável em quase todos eles e alguns não têm condições de
atendimento mínimo às pessoas".
Concordo com tudo o que Cardozo diz, mas eu não sou ministro e nada posso fazer para mudar esta situação.
Pois continua tudo exatamente do mesmo jeito, com a agravante de que a
população carcerária não parou de aumentar desde a última visita de
Cardozo aos presídios: já temos no país 471 mil presos que não seguiram o
conselho do ministro e continuam sobrevivendo em cadeias onde só
existem 295 mil vagas.
Já era assim, guardadas as devidas proporções, quando comecei a fazer
as primeiras reportagens em presídios nos anos 60 do século passado e
encontrei o mesmo quadro desumano e degradante que deixou o ministro da
Justiça estarrecido.
De lá para cá, o crime se organizou, armou-se mais e melhor do que a
polícia, infiltrou-se por toda parte, e perdeu o medo. Quem vive com
medo agora somos nós que pagamos impostos para ter (in)segurança,
enquanto as excelências estaduais e federais colocam a culpa umas nas
outras pelo que está acontecendo.
O jeito é aproveitar o feriado e ir-me embora logo para Porangaba,
aonde ainda é possível andar pelas ruas sem ter que olhar para os lados e
apressar o passo para chegar logo em casa. Até quando?
Ricardo Kotscho
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