Aconteceu em 3 de janeiro, no Recife, o enterro de mais uma suposta
tentativa de criar algo novo na política brasileira. Com pompa e
circunstância adequadas, a data marcou o embarque dos tucanos do PSDB no
governo de Eduardo Campos, do PSB. O discurso do anfitrião mais parecia
um obituário envergonhado.
"Aprendi com meu avô, o ex-governador Miguel Arraes, o valor das
alianças políticas. Mas não alianças feitas para interesse de políticos
ou de partidos. Temos sempre de saber fazer alianças colocando os
interesses do povo no centro do que está sendo feito. Esta é a distinção
entre a velha e a nova política", comemorou o governador, no melhor
estilo me engana que eu gosto.
Todos sabemos a que "povo" interessa a cerimônia realizada no Centro de
Convenções, sede provisória do governo estadual. Pergunte a algum
cidadão comum pernambucano que grande diferença fará a entrada de um
tucano na secretaria estadual do Trabalho e na presidência do Detran
local ""cargos assumidos pelo PSDB.
A resposta é óbvia. Ou alguém sinceramente acha que o emprego no Estado
vai disparar ou ao menos a carteira de habilitação local sairá mais
rápido com tais mudanças? A própria (pouca) importância dos postos
aceitos pelo PSDB escancara o sentido da barganha. O fato é que a
cerimônia serviu para mostrar que, entre a velha e a nova política, o
governador cravou sua opção: escolheu a velha, levando junto a
ex-ministra Marina Silva.
Que fique claro: ninguém pode contestar o direito de Campos aliar-se com
quem quiser. Se há alguma coisa em que o Brasil é insuperável é na,
vamos dizer, elasticidade das composições partidárias. Do governo
federal às administrações locais, é possível encontrar misturas que
desafiam tanto a coerência de programas quanto os limites da análise
combinatória. Alianças sempre, evidentemente, "em nome do interesse do
povo".
O que se discute mais uma vez é a propaganda enganosa. Pouco tempo
atrás, Campos e Marina firmaram um acordo para o ingresso da ex-ministra
no PSB. No evento, anunciado como a aurora de um novo modo de fazer
política, as duas figuras discorreram sobre a importância daquele
momento. Lideranças da Rede usaram e abusaram do repertório sonhático
para dourar o enlace.
Mas na prática a teoria é sempre outra. Como se viu, nem foi preciso
muito tempo para sentir o cheiro de mofo na própria casa do anfitrião.
Em mais um rasgo de sinceridade, a deputada Luiza Erundina, do PSB de
Campos e Marina, foi direto ao ponto. "A lógica eleitoral se superpõe a
tudo. Somos vítimas desta lógica", disse em entrevista publicada na
Folha de ontem.
E a lógica eleitoral do momento, para Campos e cia., é impedir a
reeleição de Dilma e ponto final. Nada de errado nisso: faz parte do
jogo e é seu direito. Pede-se apenas ao pessoal que chame as coisas pelo
nome, sem tentar vender como novidade as práticas mais gastas e
requentadas da política brasileira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário