Passei boa parte do tempo do debate entre os candidatos a presidente de ontem, na Record, conversando ao telefone com um dos jornalistas mais argutos da atualidade. Ele não se conformava com o desempenho de Dilma. E tinha razão. Não paro de me espantar com a incapacidade dessas pessoas públicas de se expressarem em… público. É impressionante.
Dilma, como disse o meu amigo ao telefone, parecia um autômato. Ensaiada, engessou-se em um modelo protocolar em que se esforçava para não gaguejar nas respostas decoradas, lutando furiosamente contra uma memória que parecia traí-la a cada silaba proferida.
O diabo é que o desempenho de Dilma – lento, gradual e seguro – não diferia muito do de Serra, que, a despeito da sua imensa experiência eleitoral, chegou a ficar acuado num canto pela beligerância de Marina, que, por sua vez, passou a crer no que jamais acreditara, isto é, que poderia ser mais do que mera arma do PSDB para impedir o PT de fechar a eleição no primeiro turno, lucrando com isso nada além de “musculatura eleitoral” para uso futuro.
Quem melhor se saía, a meu ver, era Marina. Mais segura, na posição de outsider e com chances crescentes, vitaminada pelas pesquisas, sabendo que anda roubando alguns pontinhos de um lado e do outro, parecia cada vez mais confiante, sobretudo diante de dois adversários reais acuados e de um quarto adversário que, nestas eleições, representa, em caráter secundário, caráter e idealismo empolgantes, mas escasso senso de realidade.
A estratégia da candidata do PV, porém, só durou até que despertasse a guerrilheira dentro do robô publicitário em que converteram a candidata do PT. Dilma, agora tenho certeza, cresce quando acuada e afrontada. O pefelê Agripino Maia já passou por essa experiência, há algum tempo, e ontem foi a vez de Marina.
A ex-laranja verde de Serra, que também foi membro do governo Lula por quase oito anos, desceu ao nível do tucano ao explorar o caso Erenice com viés nitidamente eleitoral.
Marina cobrou Dilma por ter acontecido, em sua gestão na Casa Civil, alguma coisa que não poderia acontecer sem o seu conhecimento. Fez clara insinuação sobre a honra daquela que foi sua colega no governo por anos a fio. Foi nesse momento, creio eu, que Dilma ganhou o debate.
A petista respondeu que eventuais crimes ou infrações que ainda venham a ser apurados na Casa Civil não diferirão do crime de venda ilegal de madeira desmatada que envolveu gente do ministério comandado por Marina, o do Meio Ambiente, arrematando que, em relação ao caso de corrupção em sua pasta, tomou as mesmas medidas que a candidata verde tomara na dela.
Marina acusou o golpe. Logo após a resposta de Dilma, chegou a vez de Serra escolher um adversário para perguntar. Escolheu Marina visando que esta usasse parte do minuto e meio da resposta para contestar a acusação da petista, mas a chance não foi usada. Marina respondeu a questão de Serra, que nada tinha que ver com o tema corrupção.
O resto do debate se resumiu a preocupação de todos, menos de Plínio, de não levarem gol. Serra recuou de um denuncismo que não lhe trouxe nada, eleitoralmente, e Dilma voltou a se robotizar. Marina, porém, saiu contundida. Dilma a pintou como uma oportunista que fez uso eleitoral de problemas que ela também teve em sua gestão no Meio Ambiente.
Não é à toa que a mídia esconderá o que acabo de relatar sobre o debate de ontem na Record.
Mas, enfim, a meu juízo aquele debate seria útil a Dilma se ela conseguisse não se embananar muito com respostas protocolares e decoradas e se tivesse oportunidade de passar uma rasteira em Marina, que vem lhe tomando votos. A meu ver, a estratégia petista foi a que funcionou melhor.
Um comentário:
Bastante lúcida esta análise. Concordo plenamente. A Dilma acabou levando vantagem pelo resultado geral do debate.
É uma pena que o debate da Globo não terá jornalistas com boas perguntas para todos os candidatos, como aconteceu na Record. O Serra jamais será ligado ao Arruda pelos jornalistas da Globo.
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