De repente, a eleição presidencial de 2010 “descobriu” que o Brasil tem um imenso segmento social de pensamento conservador, com expressiva porção de votos. Claro que os setores progressistas sempre souberam disso. Tanto que o discurso sempre foi a renovação contra os 500 anos de coronelismo e seus costumes arcaicos.
A novidade, porém, é a mobilização desse segmento de pensamento conservador por um candidato historicamente vinculado ao progressismo. O candidato José Serra (PSDB) prestou um desserviço ao Brasil, ao incorporar em sua campanha instituições ultraconservadoras, com o objetivo de conquistar os votos do conservadorismo.
A inflexão à direita de José Serra (PSDB) foi planejada. Ao se dar conta de que, no primeiro turno, a campanha tucana não tinha empolgado o eleitorado, Serra resolver interagir com setores conservadores e começou a crescer em segmentos religiosos, no entorno do agronegócio e até mesmo nos bolsões residuais da extrema-direita militarista, as viúvas do golpe militar de 1964.
O abandono da modernização dos costumes foi evidente. Serra é primo (político) de Fernando Henrique Cardoso. No governo FHC, em 2002, quando José Gregori era secretário dos Direitos Humanos, foi aprovado o Plano Nacional dos Direitos Humanos – 2. No capítulo sobre o aborto este PNDH 2 é idêntico ao PNDH 3, que foi criticado agressivamente na campanha eleitoral pelos partidários de Serra.
Da mesma forma, Serra declarou-se contrário à lei contra a homofobia. Na questão do aborto foi um retrocesso gritante. Lembrem-se que, quando o Papa João Paulo II veio ao Brasil, a primeira-dama, Ruth Cardoso, criou um incômodo diplomático por se declarar a favor da legalização do aborto. Com Serra, a candidata a primeira-dama, Mônica Allende Serra, chegou a dizer que Dilma era a favor de “matar criancinha”.
Serra cedeu ao pensamento conservador ao usar como tema de campanha a questão do aborto, do homossexualismo, ao usar o Evangelho como cartilha eleitoral, ao articular setores reacionários da Igreja Católica e de segmentos evangélicos, e até ao demonizar militantes que combateram a ditadura militar.
De repente, os cidadãos que enfrentaram tortura, prisão, clandestinidade na luta armada contra os militares da ditadura passam a ser “terroristas” porque teriam “pegado em armas”. Sobretudo, ao questionar na prática o conceito republicano de estado laico, retrocedendo alguns séculos.
Não foi somente Serra que perdeu. Todos os setores progressistas perderam. O Brasil moderno perdeu. A modernização dos costumes deveria acompanhar a democracia. A questão do aborto não pode ser vista isoladamente. O pensamento conservador, que só encontrava eco nas páginas da revista Veja, retornou com força eleitoral. Graças a Serra.
# posted by Oldack Miranda @ 9:58 AM 0 comments
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