Mais do que uma "vendetta" contra o fanfarrão, a CPI pode explicar o que existia além da ligação de patrão e empregado entre Cachoeira e Demóstenes
O episódio que revelou a escandalosa participação do senador Demóstenes
Torres (ex-DEM) em uma organização criminosa merece algumas reflexões e,
olhando para o futuro, uma ação imediata.
Desde que foi constatada a cumplicidade do senador com uma gama
infindável de crimes, assistimos a uma tentativa (às vezes ridícula)de
explicação para o logro em que alguns caíram.
Como justificar que o arauto da moralidade, crítico feroz dos governos
Lula e Dilma, trabalhava e traficava informações, obtidas pelo uso
indevido do mandato, para um conhecido contraventor?
Até a psicanálise foi fonte de argumentos na tentativa vã de entender as
ligações do senador com o contrabando, o jogo ilegal, a escuta
clandestina e a espionagem, todas práticas tipificadas no Código Penal.
O certo, porém, é que a veneração que setores da mídia nutriam por
Demóstenes refletia uma espécie de gratidão pela incansável luta, essa
sim verdadeira, do parlamentar contra todos os avanços sociais obtidos
pelos governos petistas.
Ressalte-se, aliás, que mesmo depois de flagrado na participação ativa
em organização criminosa, o ainda senador, fingindo ignorar o mundo
real, arvora-se a analisar, sob o crivo crítico dos tempos de falsa
vestal, ações do governo Dilma.
Mais do que uma ªvendettaº contra o fanfarrão, porém, o Congresso está
diante de uma oportunidade única de desvendar um esquema que, pelo que
foi divulgado até agora, não se resume à ligação de empregado e patrão
entre Demóstenes e o contraventor Carlinhos Cachoeira.
A morosidade do inquérito em algumas de suas fases e as ligações
pessoais do promotor de carreira Demóstenes Torres com membros do
Judiciário precisam ser investigadas. O mesmo se exige na apuração de
vínculos obscuros do senador com altos mandatários de seu Estado, Goiás,
bem como de sua quadrilha com veículos de comunicação. Que não se
permita a operação abafa em andamento. Que se apure tudo, até para
dissipar suspeitas.
O único caminho para o esclarecimento passa por uma CPI no Congresso,
onde alguns parlamentares também foram ludibriados pelo falso paladino
das causas morais.
Cabe à Câmara e ao ao Senado, sem nenhum espírito de corpo, aproveitar a oportunidade única de desmascarar a farsa até o fim.
Talvez, no caminho da investigação, descubramos outros pregadores da
moralidade que também se beneficiem do esquema que se abastecia das
informações colhidas e transmitidas ao chefe pelo senador Demóstenes
Torres.
A história brasileira registra outros episódios em que a pregação das
vestais serviu para embalar a defesa de interesses sempre contrários aos
da maioria da população. O falso moralismo udenista não está tão
distante.
Se a forma do engodo não é nova, cabe ao Congresso provar, com a CPI,
que o país está disposto a dar um basta a esquemas de banditismo. O
Partido dos Trabalhadores defende a instalação de CPI no Congresso e
conclama a sociedade organizada a se mobilizar em defesa da mais ampla
apuração do esquema corrupto desvendado pela Polícia Federal na Operação
Monte Carlo.
RUI FALCÃO, 68, é deputado estadual (SP) e presidente nacional do PT
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