Não deixa de ser uma contradição. O País que se gaba de ter um dos mais
modernos e eficientes sistemas de votação e apuração é ainda um
adolescente quando o assunto é maturidade política. Há três dias, desde o
fim da campanha eleitoral, pipocam por todos os lados, em todas as
bandeiras partidárias, sintomas graves de que não estamos perto, mas nem
um pouco perto, de cravar, ao menos desta vez, que vivemos num sistema
permanente de aprimoramento democrático. Neste mundo ideal, ainda
distante da realidade, vencedores governam, oposição fiscaliza e o
contraditório impele a avanços, não a rancores. Tese, antítese e síntese
é tudo o que não se vê no rescaldo eleitoral.
Imagem: Galeria de marcelinoportfolio/Flickr |
Pelo contrário. A depender das declarações públicas recentes, estamos
mais próximos de transformar em adjetivo um tipo de candidato e eleitor
que mostra as garras, com métodos cada vez mais rudimentares, a cada
dois anos. É o candidato/eleitor “Soninha”, que em 2012 se transformou
em sinônimo de quem se treme diante do contraditório, perde a compostura
quando não tem mais argumento, e é adepto do “quanto pior melhor”.
(Vide “ave de agouro”, “piti”, “#mtoloco”, “sinais dos tempos”).
Em outras palavras, é o candidato/eleitor que se comporta durante o
processo de sucessão como quem berra numa arquibancada de futebol. Que, a
dois meses da posse de um prefeito eleito, deixa claro o quanto torce
para que tudo dê errado. E que, no primeiro tropeço do candidato
eleito, não contém o sorriso para dizer “bem-feito, eu avisei”.
E aposta que, se 10% das obras prometidas pelo rival estiverem prontas, faria no corpo uma tatuagem do “inimigo”.
O eleitor/candidato Soninha não é só sintoma de um sistema imaturo. Ele
é o adolescente político. E, como adolescente, não se sente
representado por quem governa sem o seu voto e manifesta rebeliões das
mais eficientes: bater o pé, chorar, dizer “não, não e não”.
Adepto do “nós contra eles” (discurso corrente também em alas
petistas), o candidato/eleitor Soninha pensa que, como no futebol, a
vitória nas urnas representa a automática eliminação do adversário num
sistema mata-mata. A doença atinge inclusive ministros que, diante da
crise de segurança do governo “rival”, corre para dizer: “eu ofereci
ajuda, não pegou porque não quis. Bem-feito”. Atinge também mesários
que, ao ver um ministro do Supremo Tribunal Federal que não vota como
ele quer, parte para o “método CQC” de conscientização política: o
método que esculacha, não informa, confunde alhos com bugalhos e
criminaliza o sistema ao repetir velhos chavões. Porque, para o
adolescente político, não basta divergir do contraditório. É preciso
eliminar tudo o que o representa.
É o caldo que permite o protesto indignado (e seletivo) de quem acusa
quando há suspeita, condena quando tem acusação, pune quando há
julgamento e cobra o direito à eliminação, de votar ou respirar, de quem
está julgado, condenado, punido.
Nas redes sociais, o eleitor Soninha nada de braçada. Por exemplo:
bastou o prefeito eleito de São Paulo explicar que o bilhete único
mensal pode ficar para 2014, em razão do rito democrático básico –
apresentação do projeto, apreciação pela Câmara, detalhamento de
orçamento, aprovação e sanção – para propagar seu grau de diferenciação
política. “Parabéns pra você que acreditou em um partido condenado por
ser uma quadrilha”.
Se você é dessas correntes, caro leitor, você é também um sujeito
Soninha. Você não entendeu nada do que foi o “mensalão” e nem tem ideia
de como funciona uma eleição. E se você acredita também que só a
alienação leva à vitória do candidato A, e não do seu querido B, talvez
devesse conversar com eleitores de fora de sua bolha. É o método mais
eficiente de se combater a alienação – a sua.
Porque o mundo real, este que permite tragédias como o chamado
“mensalão”, é de todos, e não do seu rival, e só a lógica da
arquibancada permite o elemento irracional do “nós contra eles”. A
logica da vida democrática, não. Quando você transfere um método para o
outro, você passa longe de espalhar consciência política. O que você
faz é reduzir o mundo entre bons e maus, “tucanos elitistas que não
gostam de pobres” de um lado e “pobres petistas comprados por benesses
eleitoreiras” de outro.
Sim, porque para cada tucano que contém o sorriso ao ver um ex-ministro
petista condenado há um petista feliz diante da atual crise de
segurança em São Paulo. A lógica do “nós contra eles” é sintoma, e não
patrimônio partidário.
O Brasil pós-ditadura completou em 2012 quase 30 anos de tradição. Já passou da hora de abandonar a puberdade.
Matheus PichonelliNo Carta Capital
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