Por Mário Augusto Jakobskind
O jornal El País realmente bateu o recorde em matéria de
barriga (termo utilizado por jornalistas para designar divulgação de
informações erradas) ao publicar uma foto de um suposto presidente Hugo
Chávez entubado na cama de um hospital. Os primeiros exemplares
impressos foram rodados e distribuídos, bem como a foto divulgada no
site ficou no ar algum tempo.
Tudo começou quando o jornalista italiano Tommasso Debenedetti enviou
a foto, capturada do Youtube, para três agências de notícias, que não
divulgaram nada. Estranhamente, a imagem acabou aparecendo no jornal El País, cujos editores, sem nenhum tipo de checagem, publicaram.
Debenedetti alega que ao divulgar a falsa foto de Chávez queria
apenas testar o jornalismo que vem sendo exercido atualmente. Será?
Então, por que ao enviar a imagem se fez passar pelo Ministro
venezuelano da Cultura, Pedro Calzadilla?
O jornalista italiano não é confiável. Tem antecedentes negativos
como autor dos rumores sobre a morte do líder da Revolução cubana Fidel
Castro, do escritor colombiano Gabriel García Márquez e se apresentou no
Facebook e Twitter como personagens famosos, entre os quais Mario
Vargas llosa, Umberto Eco e até o Papa Bento XVI.
Na verdade, não é de hoje que a mídia de mercado tem publicado falsas
informações sobre a saúde do presidente venezuelano. Aqui neste espaço
já se comentou o desejo de algumas publicações em ver Chávez morto. A
Rede Globo que o diga, bem como colunistas vinculados ao famigerado
Instituto Millenium, já conhecidos e cujos nomes nem vale a pena citar.
O El País pediu desculpas aos seus leitores e teve de admitir
publicamente o erro grosseiro. Se não o fizesse perderia de vez a
credibilidade até mesmo entre os leitores que o consideram o melhor dos
melhores.
Mas o governo venezuelano entendeu que não bastam as desculpas e
decidiu entrar com uma ação judicial contra o jornal espanhol, conforme
anunciou o Ministro da Comunicação e Informação, Ernesto Villegas.
Há muitos mitos sobre os meios de comunicação pelo mundo a fora. O El País,
por exemplo, é citado por outros jornais, como “o consagrado jornal
espanhol”. A BBC de Londres é considerada pelos acadêmicos de plantão
como o exemplo de mídia pública a ser seguido. Mas nem todos pensam
assim.
Dias desses, ativistas sociais fizeram manifestação em frente à sede
da emissora britânica denunciando a parcialidade na cobertura dos
acontecimentos no Oriente Médio. Os palestinos, segundo os
manifestantes, são tratados de forma discriminada.
Na época da invasão e ocupação do Iraque pelos Estados Unidos e com o
apoio do Reino Unido, a BBC foi acusada de apenas defender os
interesses do Estado britânico, ou seja, estadunidenses, nas coberturas
sobre os acontecimentos.
Se analisarmos as coberturas jornalísticas de outras mídias
eletrônicas no Brasil, não há como silenciar diante das barbaridades que
estão sendo cometidas.
Para ficarmos em um exemplo mais recente, já comentado na reflexão da
semana passada, a intervenção francesa no Mali teve a unanimidade
favorável ao que determinou o presidente François Hollande.
Em décadas passadas, por exemplo, antes da derrota dos franceses no
Vietnã, substituídos em seguida pelos estadunidenses, vale uma consulta
aos meios de comunicação para constatar a unanimidade em torno da defesa
da ação colonial contra os “bárbaros nacionalistas comunistas”
comandados pelo General Giap. Era um tempo em que comunistas eram
acusados de “comer criancinhas” .
Na África de décadas passadas, o esquema era semelhante. Para se ter
uma ideia, há 52 anos a CIA e os serviços de inteligência belga
assassinaram Patrice Lumumba, líder da luta de libertação nacional no
Congo.
Vale também uma consulta sobre o noticiário da mídia de mercado.
Aliás, praticamente nenhum meio de comunicação brasileiro concedeu agora
espaço para analisar a figura de Lumumba, assassinado em 17 de janeiro
de 1960.
Nem é preciso recuar muito no tempo para constatar a parcialidade da
mídia de mercado em relação a fatos históricos recentes. Meios de
comunicação que hoje posam de democratas desde sempre, apoiaram a
ditadura chilena de Augusto Pinochet. Silenciaram sobre as atrocidades
que ocorriam no Uruguai depois de 1973 e assim sucessivamente. Alguns
chegaram a defender a invasão do Uruguai pelos “democratas” militares
brasileiros para coibir os tupamaros. E assim sucessivamente.
Para citar um caso mais recente, já lembrado neste espaço, o atual
presidente da CBF e do Comitê Organizador para a Copa do Mundo, José
Maria Marin, um dos responsáveis pelo assassinato de Valdimir Herzog,
ao discursar como deputado estadual da Arena pedindo “rigor das
autoridades para enfrentar a infiltração na TV Cultura”, nunca foi
questionado pelos grandes veículos de comunicação. Tem aparecido muito
em função dos cargos que ocupa, mas poucos foram informados sobre o seu
passado de extrema direita e até defensor do famigerado delegado Sergio
Fleury.
A exceção fica por conta de O Estado de S. Paulo que na semana
passada, pelo menos, editou declaração de Igor Herzog pedindo a
exoneração de Marin por considerá-lo um dos responsáveis pelo que
aconteceu com o seu pai, Vladimir Herzog, em outubro de 1975.
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