Os 'barracos' no STF
O Estado de S. Paulo (editorial)
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Na véspera da retomada do julgamento do mensalão, na quarta-feira, o
relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, participava de um
congresso de juristas, em Aracaju, quando foi perguntado sobre a sua
popularidade, traduzida em cumprimentos, fotos e pedidos de autógrafos,
por onde quer que passe. "Há uma identificação cada vez maior da
população com as questões jurídico-institucionais tratadas pelo
Supremo", comentou. "Esse julgamento trouxe o tribunal para dentro das
famílias, e o que vem acontecendo no plano pessoal é consequência
disso." A elegância e a modéstia destas suas palavras, no entanto, são
tudo que lhe tem faltado no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF),
que completou ontem 44 sessões, enredado na questão dos critérios para a
fixação das penas dos réus condenados por uma variedade de delitos.
As divergências a respeito estimularam Barbosa a reincidir no
comportamento que vem caracterizando a sua participação no exame da mais
importante ação penal da história da Casa. Desde as primeiras
manifestações de inconformismo com o parecer do revisor da matéria,
ministro Ricardo Lewandowski, a sua atuação destoa do que se espera de
um membro da mais alta Corte de Justiça do País, ainda mais quando os
seus trabalhos podem ser acompanhados ao vivo por todos quantos por eles
se interessem. Em vez da serenidade - que de modo algum exclui a defesa
viva e robusta de posições, bem assim a contestação até exuberante dos
argumentos contrários -, o ministro como que se esmera em levar "para
dentro das famílias" um espetáculo de nervos à flor da pele,
intolerância e desqualificação dos colegas.
Um integrante do STF não pode reagir com um sorriso depreciativo à
exposição de um ponto de vista de um de seus pares, por discrepar de
suas convicções sobre a questão da hora. Foi o que se passou anteontem
quando o ministro Marco Aurélio Mello defendia uma interpretação
antagônica à do relator - e mais benigna para os réus - sobre crimes e
penas. O desdém estampado na face do relator fez o colega adverti-lo:
"Não sorria porque a coisa é muito séria. Estamos no Supremo. O deboche
não cabe aqui". Barbosa retrucou dizendo saber aonde o outro queria
chegar, para ouvir em seguida: "Não admito que Vossa Excelência suponha
que todos aqui sejam salafrários e só Vossa Excelência seja uma vestal".
Decerto ele não supõe nada parecido com isso, mas é a impressão que
transmite, principalmente para aquela parcela do público que assiste
pela primeira vez a um julgamento no Supremo.
(...)
O estilo, digamos assim, do relator deve preocupar por outra razão
ainda. A partir do próximo dia 18, quando o presidente do STF, Carlos
Ayres Britto, deixar o cargo e a Corte por ter completado 70 anos,
Barbosa o substituirá por um biênio. E de forma alguma é descabido
perguntar se ele sabe que terá de domar o seu temperamento para conduzir
o tribunal com a paciência e o comedimento demonstrados por Ayres
Britto - duramente testados, aliás, nos "barracos" que teve de acalmar
no curso deste julgamento. O presidente do tribunal incumbido de dar a
última palavra também em demandas que envolvem a conduta alheia deve ser
o primeiro a vigiar o próprio comportamento.
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