BARBOSA PERDEU MAIS UMA
20/04/2014
O PAINEL do Leitor,
localização nobre que a Folha destina às contestações, críticas e outras
considerações sobre o que publicou, não foi visto pelo secretário de
comunicação do Supremo Tribunal Federal, Wellington Geraldo Silva, como
apropriado a uma nota sua para desejada defesa do ministro Joaquim
Barbosa.
Em exaltada cobrança telefônica há uma semana, no domingo passado,
indagou "que espaço temos para responder?". Por mim, todo o de que eu
possa dispor, sem com isto diminuir meu apreço pelo sentido democrático
do Painel do Leitor.
A nota é a propósito do artigo
"Nos passos de Obama", do domingo, 13.abr.14, sobre o uso ardiloso de
coordenadas geográficas pela promotora Márcia Milhomens Sirotheau Corrêa
para pedir quebra de sigilos telefônicos que, a pretexto de verificar
alegado telefonema de José Dirceu na Papuda, violaria também as
comunicações de todos os celulares do Planalto. Soube-se, no decorrer da
semana, que também os sigilos de celulares do Senado, da Câmara e do
próprio Supremo Tribunal Federal cairiam, na violação pretendida.
Passados cinco dias do artigo, na sexta, 18, diz a nota: "Na coluna
de 13.4.2014, que trata de pedido formulado ao Supremo Tribunal Federal
pelo Ministério Público do DF à Vara de Execuções Penais de Brasília, o
ministro Joaquim Barbosa é acusado de participação em um ato criminoso,
qual seja a quebra ilegal de sigilo telefônico.
Sem que o ministro tenha sido ouvido, são feitas afirmações sobre a
conduta dele, tais como: 'É interessante que o juiz da Vara de Execuções
Penais e o ministro Joaquim Barbosa não dessem sinal algum de
estranheza...' (...) 'A alternativa a essa indiferença seria o
conhecimento prévio, por ambos, da artimanha...'. São acusações graves,
desprovidas, porém, de amparo na realidade dos fatos".
Segue: "Uma simples consulta ao andamento do processo -que é público,
diga-se- permitiria ao senhor e a qualquer pessoa interessada verificar
todos os procedimentos adotados pelo presidente do STF. Nessa consulta,
seria possível concluir que a primeira providência adotada foi o envio
do pedido para manifestação da Procuradoria-Geral da República. Só após
esse parecer é que o ministro estará habilitado a analisar todos os
aspectos envolvidos no pedido, e então tomar uma decisão. Isso é o que
manda a lei. Todos esses procedimentos também teriam sido informados
caso o presidente do STF tivesse a oportunidade de ser ouvido antes da
publicação da sua coluna. O fato é que ainda não houve nenhuma
manifestação do ministro Joaquim Barbosa sobre o pedido formulado pelo
Ministério Público do Distrito Federal".
Por fim: "Esclarecemos ainda que o Supremo Tribunal Federal atua
dentro dos parâmetros da Constituição Brasileira [sic] na AP 470 e em
todas as [sic] milhares de Ações que julga. Portanto, refutamos qualquer
insinuação sobre a legalidade dos procedimentos adotados pelo
tribunal".
Transcrevo o
parágrafo de onde a nota pinçou dois pedaços de frases, e deu-lhes
reticências sugestivas mas inexistentes no artigo:
"É também interessante que o juiz da Vara de Execuções Penais e o
ministro Joaquim Barbosa não dessem sinal algum de estranheza -sem
falarmos nas providências legais necessárias- ao deparar-se com
coordenadas geográficas de latitude e longitude para pedir quebra de
sigilo telefônico de números, endereços e portadores de celulares não
citados. A alternativa a essa indiferença seria o conhecimento prévio,
por ambos, da artimanha e do alcance da alegada identificação de
telefonema no presídio da Papuda."
O juiz e o ministro deram
algum "sinal de estranheza" ante o ofício com anormal uso de
coordenadas, em vez de números telefônicos e nomes, sem qualquer
explicação para isso? Não. Logo, a frase não contém acusação,
referindo-se a um fato real e não negado. Fato que a mim, e a outros de
semelhante reação, nada proíbe de achar interessante.
A outra "acusação grave". O
artigo diz que a alternativa SERIA, condicional, não diz que foi, nem o
insinua. Para quem a lê sem presunção, o que a frase diz é que o juiz e o
ministro só não estariam faltando com a atenção merecida pelo ato
anormal do ofício, e razão bastante de estranheza, em caso de terem
conhecimento prévio da artimanha. Não os acusa de o terem.
O acusado passo a ser eu. A
nota me acusa, em referência a Joaquim Barbosa, de o haver "acusado de
participação em um ato criminoso". A nota faz uma afirmação
inverdadeira. E reiterada.
Quanto à afirmação de que ao ministro cabe receber e mandar ofício ao
procurador-geral da República, para só depois opinar, é esquecer duas
obviedades. Primeira: o
ministro tem a autoridade e o dever de examinar cada ofício recebido e
lhe dar o encaminhamento adequado, sendo um deles a rejeição por
impropriedade. Segunda: o oposto disso é reduzir ministro do Supremo a
tarefas de estafeta, entregador de papéis de um lado para outro, como
sugere a nota.
Aproveito a ocasião para um acréscimo nesse caso das coordenadas. O
pedido de quebra dos sigilos foi encaminhado ao presidente do Supremo
em 28 de março, quando o juiz que o encaminhou já se dissera impedido de
atuar no processo, por "motivos de foro íntimo", e sua transferência já
estava determinada pelo Tribunal de Justiça.
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Janio de Freitas, colunista
e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes
jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões
políticas e econômicas. Escreve aos domingos, terças e quintas-feiras.
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