Ricardo Melo
A candidata das eleições deste ano não é a mesma de 2010, tampouco as circunstâncias
A candidata das eleições deste ano não é a mesma de 2010, tampouco as circunstâncias
Na sequência imediata de eventos como a morte de Eduardo Campos, poucas certezas se impõem. Já as incógnitas se multiplicam. Qualquer enquete ou pesquisa feita "à quente" sob o impacto do desastre aéreo será de pouca serventia.
O efeito da comoção causada pelo acidente inevitavelmente terá um peso
significativo, o que torna os números descartáveis em termos de
previsões do cenário político.
Nem sempre é assim. Um de tantos exemplos: em 1988, a morte de três
grevistas em Volta Redonda (em novembro) impulsionou a vitória de vários
candidatos do PT em prefeituras, inclusive o triunfo de Luiza Erundina
em São Paulo. Diferenças cruciais: embora sem a projeção de um político
presidenciável, as três vítimas morreram num conflito sindical e a
poucos dias do pleito. Agora, o prazo que separa a tragédia de Santos do
dia da eleição presidencial é tempo suficiente para diluir o fator
comoção.
Muita gente dá como favas contadas um segundo turno. Será? Sem pretender
diminuir as qualidades de Eduardo Campos, o fato é que ele ainda
engatinhava como liderança nacional. Nem sequer teve tempo de deixar um
legado político expressivo, difere ntemente do avô Miguel Arraes. E as
últimas ações do neto iam no sentido contrário da decantada novidade que
dizia representar.
Campos patrocinou alianças com Deus e o diabo em seu Estado e pelo país
afora. Para os correligionários, uma prova de "capacidade de
articulação", a velha desculpa para engavetar princípios em troca de
dividendos na urna. Adversários e observadores tarimbados faziam uma
leitura distinta. Identificaram nas atitudes do ex-governador apenas
mais do mesmo oportunismo eleitoral prevalecente no Brasil.
Em termos programáticos, Campos recorria às generalidades de sempre.
Espremida, a bandeira da terceira via resumia-se ao seguinte: se você
está cansado dos petistas e dos tucanos, vote no PSB. Depois a gente vê o
que faz. Fora a situação esdrúxula de uma chapa em que a vice aparecia
em pesquisas com mais que o dobro dos votos do candidato oficial.
Sobrou para Marina Silva. Impossibilitada de emplacar sua própria
legenda, adotou o PSB como uma espécie de barriga de aluguel. De repente
virou a estrela da companhia. Mas, no curto tempo em que Rede e PSB já
conviveram, as faíscas se espalharam. As alianças regionais criaram um
clima de atrito permanente (curiosidade: Marina e Alckmin vão subir no
mesmo palanque em São Paulo?). O discurso ambientalista da Rede viu-se
confinado a um quadro moldado por valores coronelistas e interesses do
grande agronegócio. Não é à toa que muito "marineiro" de primeira hora
não gostou do que viu e pulou fora do barco.
A personalidade de Marina Silva garantiu a ela, por um tempo, um papel
singular na política nacional. Mas a candidata de 2014 não é a mesma de
2010, tampouco as circunstâncias. Sua imagem de pureza, de integridade e
de defensora intransigente de princípios foi bastante golpeada desde o
compromisso com o PSB. A própria Rede já nascera como produto de uma
maionese política, intelectual e financeira. Banqueiras, bilionários de
cosméticos e economistas ortodoxos passaram a dividir sessões de
meditação com a moçada sonhática, adoradores de bagres e gente bem
intencionada à procura de rumo. Difícil saber o resultado desse
emaranhado ideológico quando o assunto é dirigir um país.
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