A providencial cirurgia na próstata anunciada por Eliseu Padilha, 24
horas depois de ter sido denunciado pelo amigo presidencial José Yunes
como destinatário de uma mala de dinheiro, confirma que o fim de Michel
Temer está próximo.
Por mais que seja possível insistir na coreografia — e Brasília já viu
muitos espetáculos semelhantes — o governo acabou esta manhã.
A versão de que Padilha afasta-se do governo por razões médicas não merece credibilidade. A história inteira é outra.
Antes do depoimento de José Yunes vir a público, o chefe da Casa Civil
seguia em sua vida normal de ministro e grande manda-chuva do Palácio.
Por exemplo. Até agora, o ministro possuía uma agenda normal às suas
atividades. Tinha compromissos marcados até para a quarta-feira de
cinzas, cinco dias depois da entrevista do amigo do Temer que o acusou.
Um deles envolvia uma audiência com empresários e sindicalistas
envolvidos no debate sobre conteúdo local nos investimentos do pré-sal.
Agora, está cuidando da próstata.
Sem Padilha, a solidão política de Temer chega ao nível da calamidade.
No final de novembro, no escândalo envolvendo uma cobertura milionária
em Salvador, o outro amigo, Geddel Vieira Lima, já havia deixado a
Secretaria de Governo.
Juntos há muitos anos, até há pouco eles formavam um trio azeitado, os
verdadeiros chefes do grupo político que assumiu o Planalto após o
golpe que derrubou Dilma.
Eram os protagonistas no centro das grandes decisões, aqueles com a
palavra final nos assuntos graves e fundamentais — inclusive nomear e
demitir.
Funcionavam assim desde o governo Fernando Henrique Cardoso, que deixou
o Planalto em janeiro 2003, isto é, quatorze anos atrás. Em suas
memórias FHC emprega a expressão "cheirando mal" para se referir a
movimentos de Padilha — sempre em companhia de Temer e Geddel — para
emplacar um ministério, que, afinal, acabou conseguindo.
Olhando para o futuro próximo, basta recordar que as delações da
Odebrecht ainda não saíram do forno. Ainda podemos aguardar pela Camargo
Correa, OAS, para imaginar o que aguarda a última ponta do triângulo.
Por enquanto, basta lembrar que o próprio Yunes acertou o peito de
Temer ao revelar — empregando uma estranha linguagem de traficantes de
drogas — que tinha informado ao presidente que havia atuado como "mula"
a serviço do chefe da Casa Civil.
Neste ambiente, a saída de Temer caminha para se tornar uma necessidade
prática antes de se tornar um clamor nacional. Pode ser fruto de um
ato de renúncia, voluntário e unilateral, possível a qualquer momento.
Outra hipótese é o julgamento pelo TSE. No inferno em que se
transformou o governo, a cassação do mandato de Michel Temer será um
favor.
Neste momento, o debate sobre a sucessão antecipada de Temer ganha corpo e velocidade.
Há uma operação vergonhosa em andamento. Depois de desrespeitar a
Constituição quando isso era conveniente a seus interesses, as forças
que articularam a derrubada de Dilma tentarão esconder-se atrás da
Carta de 1988 para operar um pleito indireto, num Congresso que o suíço
Eduardo Cunha montou. Com isso, manterão o povo, mais uma vez, longe do
direito de opinar sobre os destinos do país. Também será possível
tentar algum lance de mágica para mudar o cenário atual para 2018,
assim descrito na Folha de S. Paulo, edição de hoje, pelo insuspeito
Reinaldo Azevedo: "as nuvens que se armam ameaçam jogar o país, mais
uma vez, no colo das esquerdas. Tudo o mais constante (...), é ao
encontro delas que marchamos."
Não é uma boa ideia. Só ajuda a criar tumultos desnecessários e
incertezas. A solução — urgente — consiste em retomar o debate sobre a
emenda que o obriga a realização de diretas-já, unica forma para o país
recuperar a democracia.
Paulo Moreira Leite
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