Quites com a França
Para ficar quites
Ficamos quites com as desfeitas da França de Hollande e de seu antecessor ao Brasil
O melhor da compra dos caças suecos não está nas condições do negócio
nem nas conveniências do avião, já muito conhecidas. Está no momento em
que foi comunicada. Foi só o presidente francês François Hollande dar as
costas, encerrada a vinda a Brasília com ofertas e um chefão da fábrica
do caça Rafale, e Dilma Rousseff noticiou a vitória dos suecos. Ficamos
quites com as desfeitas da França de Hollande e de seu antecessor
Sarkozy ao Brasil.
Não foi a única retribuição dada ao medíocre Hollande. Mas a outra, por
acaso concomitante com aquela, aplica-se também a todos os que aqui
ridicularizaram a iniciativa de Dilma e do então ministro Antonio
Patriota, das Relações Exteriores, de apresentar à ONU uma proposta de
resolução motivada pela espionagem dos Estados Unidos: estender às
comunicações digitais, em todo o mundo, os direitos de proteção já
reconhecidos a governos, cidadãos, empresas e entidades.
O "socialista" Hollande não permitiu a adesão da França à proposta. Só a
conservadora Angela Merkel, entre os governantes citados na espionagem
denunciada, teve a dignidade de juntar-se a Dilma. A resolução foi
aprovada por consenso da Assembleia Geral, na quarta-feira, sem sequer
precisar de votação. A França de Hollande teve de se curvar. Aqui, para
conhecimento (ligeiro) desse êxito, só esmiuçando o noticiário.
Apesar de nem lembrado, foi uma grande vitória também do denunciador
Edward Snowden, extensiva ao jornalista Glenn Greenwald, que o ajudou na
revelação de injustificáveis espionagens americanas. A nova
consequência das denúncias dá-se, aliás, em momento de certa confusão a
propósito de asilo de Snowden no Brasil. Minha leitura da sua carta aos
brasileiros não vê ali uma proposta de asilo no Brasil em troca de
revelações. Seu impedimento de atender a pedidos de senadores
brasileiros, "até que um país conceda asilo permanente", aplica-se a
qualquer país. E, a meu ver, reflete muito menos um possível pedido do
que uma realidade conhecida: mesmo na Rússia, seu asilo provisório está
sob a condição de que não revele documentos da espionagem americana.
Daí que não tenha havido recusa do governo brasileiro a asilo de
Snowden. Nem decisão negativa de Dilma Rousseff a respeito, só a ela
cabendo decidir. A campanha para concessão do asilo está crescendo, mas o
fator decisivo, não só no Brasil, será outro. Como ninguém sabe o que
Snowden tem ainda a revelar, prevalece o temor de que grandes novidades
provoquem reações extremadas dos Estados Unidos. Não é de pedido e
concessão que Snowden depende, mas de encontrar, com seus coadjuvantes,
solução para os medos que provoca.
A propósito, a eliminação do caça americano, na compra brasileira, está
identificada por muitos como represália à espionagem de e-mails de
Dilma. Do ponto de vista moral não faz muita diferença, mas outra razão
fixou-se desde longe: os americanos não são confiáveis. Por mais que a
Boeing ofereça garantias de transferência de tecnologia, acima dela
estará sempre o governo americano, para impor limitações e proibições
quando queira, por motivos políticos e não necessariamente reais. Com a
democracia sueca não há risco.
Nenhum comentário:
Postar um comentário