sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Regulação da mídia reforçará a democracia

Mário Augusto Jakobskind, Correio do Brasil / Direto da Redação 

"Na campanha eleitoral de 2014, um tema praticamente passou ao largo, perdendo a sociedade brasileira a oportunidade de conhecer, ao menos minimamente, o que venha a ser regulação da mídia. Nas poucas vezes que um dos candidatos na campanha do primeiro turno referiu-se à questão, prevaleceu a desinformação, ou seja, a ideia de que a regulação da mídia significa censura.

Regulação econômica da mídia não tem nada a ver com censura. Muito pelo contrário. É um tema que deveria ter entrado na pauta das discussões entre os candidatos e que merece toda a atenção da mídia pública, que poderá ser o espaço necessário para o debate da matéria. Será,
sem dúvida, um ponto importante a ser conquistado, sobretudo pelo fato de as mídias convencionais praticamente se recusarem a promover o debate.

Regulação da mídia em vários países

Regulação da mídia existe no país que muitos consideram como exemplo de democracia, os
Estados Unidos. Também em Portugal, França, Reino Unido, Espanha e muitos outros países onde a imprensa é absolutamente livre de censura.

Nas raras vezes que o tema entrou em pauta, a própria Presidenta Dilma Rousseff em um encontro com blogueiros independentes, admitiu que a mídia “é um setor que como qualquer outro tem que ser regulado como portos, como elétrico, como petróleo”.

Basta cumprir a Constituição

Para começar a entender um pouco mais o tema que vem sendo escondido ou desvirtuado pelos setores que não querem nenhum tipo de mudança, é necessário consultar a própria Constituição brasileira promulgada a 3 de outubro de 1988.

Muitos artigos na prática acabam se tornando letra morta. O artigo 220, por exemplo, dispõe que não pode haver monopólio ou oligopólio na comunicação social eletrônica. E o que acontece na prática? Uma única emissora controla cerca de 70% do mercado de televisão aberta.

Seguindo por esta trilha vale lembrar que demais artigos que se seguem e tratam do tema midiático na prática não são colocados em prática. O artigo 221 estimula a produção regional e independente, mas 98% de toda produção de TV no Brasil é feita no eixo Rio-São Paulo pelas próprias emissoras de radiodifusão, e não por produtoras independentes.

A maioria do espectro de radiodifusão é ocupada por canais privados que priorizam o lucro, embora o artigo 223 da Constituição defina que o sistema de comunicação no país deve respeitar a complementaridade entre os setores de comunicação pública, privada e estatal.

Caberia ao setor de jornalismo de rádios e televisão informar aos seus ouvintes e telespectadores que a Constituição brasileira também não permite que parlamentares sejam proprietários de concessionárias de serviço público.

E para complementar, publicar os nomes dos que cometem as ilegalidades.
E cabe então uma pergunta: por que até hoje não foi feito um levantamento no Congresso de quem são os deputados e senadores que passam por cima do artigo 54, que impede que eles sejam os responsáveis por estas emissoras?
Aviso importante

Como reforço para o debate, a mídia pública deveria colocar em prática para seus telespectadores e ouvintes a sugestão do jornalista e professor Laurindo Leal Filho. Sem timidez e com o objetivo de cumprir um serviço de utilidade pública deveria ser lembrado nos veículos da EBC que “esta é uma concessão pública outorgada pelo Estado em nome da sociedade” para seus telespectadores e ouvintes.

Se houvesse pressão nesse sentido, todas as mídias teriam de informar a sugestão de professor Laurindo.

Estes seriam alguns temas que deveriam ser prioritários para serem apresentados e debatidos pela mídia pública e mesmo por outras mídias que não fossem comprometidas com os barões proprietários de veículos de comunicação. Ajudariam os brasileiros a formarem opinião sem injunções e nenhum tipo de deturpação. Estaria também a mídia pública prestando um primoroso serviço de utilidade pública com o objetivo de reforçar a democracia neste país.

Em países como a Argentina, Uruguai, Equador e Venezuela, entre
outros, o tema midiático tem sido priorizado, não só com o advento de novas legislações, como pelo fortalecimento de mídias públicas. Eis também uma pauta que deve ser prioritária para ser apresentada aos ouvintes e telespectadores. Como dificilmente a mídia tradicional incentiva debates isentos sobre a matéria, a mídia pública tem também um importante papel a desempenhar, suprindo uma lacuna.

Dominação tecnológica

Além desses temas para o debate, é importante também que leitores, ouvintes e telespectadores sejam lembrados que a tecnologia na área de comunicação é totalmente dominada por empresas estrangeiras. E que na internet, por exemplo, tudo passa por uma central localizada no Estados Unidos.

Nesse sentido, é preciso divulgar o máximo possível que o Brasil e Uruguai assinaram um convênio de que passa pelo aprimoramento da fibra ótica no sentido de enfrentar essa dependência, ou seja, para não ser necessário que a comunicação nesse caso dependa totalmente de um país, no caso o Estados Unidos, que tem o controle da tecnologia.

Esta pauta é simples de ser desenvolvida. Para tanto vale apenas demonstrar quais as empresas que fabricam computadores, celulares e mesmo os programas utilizados pelos internautas. E remete automaticamente a uma pergunta que não quer calar: por que o Brasil não desenvolve esta tecnologia para fazer com que não sejamos tão dependentes de empresas estrangeiras?

Na verdade, se tudo isso for feito se estará também praticando jornalismo na pura acepção da palavra e preenchendo uma lacuna na mídia brasileira.

Mário Augusto Jakobskind, jornalista e escritor, correspondente do jornal uruguaio Brecha; membro do Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (TvBrasil). Seus livros mais recentes: Líbia – Barrados na Fronteira; Cuba, Apesar do Bloqueio e Parla , será lançado dia 17, no Rio de Janeiro.

Direto da Redação é um fórum de debates, do qual participam jornalistas colunistas de opiniões diferentes, dentro do espírito de democracia plural, editado, sem censura, pelo jornalista Rui Martins."

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