Apelidado de papa de Hitler, Pio XII vira venerável - Por Wálter Fanganiello Maierovitch
Apelidado de papa de Hitler, Pio XII vira venerável - por Wálter Fanganiello Maierovitch
O papa Bento XVI anunciou, no final de semana, que os antigos papas João Paulo II e Pio XII tornaram-se ”Servos de Deus” e, assim, veneráveis pelos católicos.
Para diversos jornais europeus, Wojtyla, de reconhecido carisma e méritos, encabeça o elenco. Como para quebrar o impacto com relação ao polêmico Pacelli, que adotara o nome de Pio XII.
Pacelli foi papa durante a Segunda Guerra Mundial e, diante das atrocidades nazistas e das leis raciais, manteve-se em silêncio. Nenhum protesto. Nenhuma crítica. Daí, ter sido apelidado de o “papa de Hitler”.
Ao se tornar venerável, confirma-se o decreto da Congregação para a Causa dos Santos, que reconheceu em Pacelli “virtudes heróicas”.
Em 16 de outubro de 1943, do gueto romano saíram em fila e presos, sob a mira de fuzis portados por autoridades nazifascistas, 1.021 judeus italianos.
Os 1.021 judeus, num ruidoso cortejo ouvido do outro lado do rio Tevere, ou seja, no Vaticano, foram conduzidos para a estação ferroviária de Tiburtina (Roma). De lá, foram embarcados para o campo de concentração polonês de Auschwitz.
Informado e ciente do que ocorria, Pio XII manteve-se em silêncio. Naquele dia fatídico, Eugenio Pacelli nem se aproximou da janela onde falava urbi et orbi, ou melhor, do Vaticano para o mundo. E foi Pacelli quem introduziu a recitação domenical do Angelus, da janela dos seus aposentos. Ele foi eleito papa em 2 de março de 1939.
Lógico que transformar católicos em veneráveis representa ato interno da Igreja e só diz respeito a ela.
Também se sabe da versão de que Pacelli, reservadamente, autorizava conventos e mosteiros a receber judeus perseguidos pelos nazifascistas. Só que o Vaticano não abriu os seus arquivos aos historiadores laicos. Em outras palavras, os documentos do pontificado de Pacelli continuam secretos.
O papa Bento XVI esteve em visita a Israel e o diálogo inter-religioso encontra-se aberto. No museu da Shoah continua a ser exibida a famosa placa a recordar o silêncio de Pio XII.
PANO RÁPIDO. A trabalho, e cerca de quatro vezes ao ano, vou a Roma.
Quando atravesso a praça Collona em direção a Campi dei Fiori onde, em pleno gueto judeu, foi queimado Giordano Bruno, condenado pelo tribunal da Inquisição, passo ao lado da igreja do beato João XXIII, recordado como o “Papa Bom”. Sinto bons fluídos.
Parêntese. João XXIII foi um reformador. Nunca perdeu a humildade e jamais esqueceu das minorias oprimidas. Os seus críticos falam ter ele aberto as portas para a difusão dos “cattocomunistas”, isto é, católicos-comunistas: “Il termine cattocomunismo definisce, nel panorama filosofico e politico italiano, l’insieme di quei pensatori, religiosi e politici che, pur essendo di dichiarata fede cattolica, optarono per una scelta politica e programmatica vicina alle posizioni comuniste, accettando - senza tuttavia aderirvi completamente - gran parte del pensiero marxista”.
Ao cruzar a piazza Argentina e entrar no antigo gueto judeu, nunca deixo de recordar o supracitado e trágico episódio de 16 de outubro de 1943, com 1.021 judeus italianos sendo encaminhados para a morte, em Auschwitz. De pronto, me vem a imagem do silêncio de Pio XII, que estava bem próximo dali.
Pacelli, um virtuoso para a Igreja e os seus fiéis. Para mim, será sempre o papa que calou e que, em momento algum, protestou contra os campos de concentração e os massacres nazistas. Pacelli não merece o meu respeito e, muito menos, veneração. A propósito, sigo idéias e não pessoas.
No jubileu de 1950, soltou uma famosa frase: ”Nada se perde com a paz. Tudo pode ser perdido com a guerra”. Seguramente, sabia Pacelli do que falava.
–Wálter Fanganiello Maierovitch–.
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