8 dez
Publicado em vários jornais brasileiros hoje.
Em vários mitos de criação, a
existência do mundo se deve ao confronto de uma força do bem com um
inimigo maligno, numa luta que atravessa os tempos. No universo do
candomblé, orixás bons e orixás ruins brigam sem parar pelo controle das
nossas almas. Na cosmogonia cristã, embora não apareça na Bíblia, o
diabo é o outro filho de Deus, o anjo caído que inferniza a vida do Pai e
o enfrenta pela eternidade. (Segundo alguns teólogos heréticos, Deus só
fez a luz para que o diabo não tivesse como se esconder dele. Assim
devemos a criação do mundo não a Deus, mas ao diabo).
Pode-se, com alguma boa vontade, dizer que a vida econômica das
nações vem sendo regida por um enfrentamento parecido de opostos, no
caso as teorias do austríaco Friedrich Hayek, deus dos neoliberais, e do
inglês John Maynard Keynes, defensor do estado interventor. A analogia
só não é completa porque — ao contrário de orixás e anjos desgarrados —
não se sabe com certeza que lado é o bom e que lado é o maligno nesse
confronto. Richard Nixon surpreendeu todo o mundo quando, na presidência
dos Estados Unidos, declarou: “Somos todos keynesianos agora.” O tempo
mostrou que sua afirmação tinha sido prematura. Nos anos seguintes o
neoliberalismo conquistou os corações e mentes da maioria dos
economistas e nem desastres como a crise financeira causada pela
desregulação dos bancos — ou seja, pelo Estado mínimo dos sonhos
neoliberais — diminuíram sua força. Enquanto isto o keynesianismo
sobrevivia na sua forma espúria, como subsídio do governo ao complexo
militar-industrial americano.
Os recentes protestos na Europa contra medidas de austeridade de acordo com a receita neoliberal podem significar uma reação do keynesianismo ao predomínio do inimigo — ou não. Os economistas mais influentes, ou pelo menos mais salientes, do mundo continuam do lado de Hayek e da suposta sabedoria do mercado. Há exceções, claro, mas não se pode continuar lendo só o Paul Krugman todo o tempo.
Os recentes protestos na Europa contra medidas de austeridade de acordo com a receita neoliberal podem significar uma reação do keynesianismo ao predomínio do inimigo — ou não. Os economistas mais influentes, ou pelo menos mais salientes, do mundo continuam do lado de Hayek e da suposta sabedoria do mercado. Há exceções, claro, mas não se pode continuar lendo só o Paul Krugman todo o tempo.
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