Quem impede o debate sobre a democratização dos meios de comunicação força o jogo na sombra de verbas públicas
Este é o debate.
Paulo Moreira Leite. Diretor da Sucursal da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".
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ISTOÉ Independente - 3/6/2014
Paulo Moreira Leite
Vamos falar da substância das
coisas. A caçada a blogueiros simpáticos às conquistas criadas no país
depois da posse de Lula, em 2003, iniciada com a investigação sobre um
suposto “bunker” do PT na prefeitura de Guarulhos, deve ser visto como
aquilo que é.
Uma tentativa autoritária de silenciar vozes que divergem do monopólio político da mídia.
Sei que essa frase parece panfleto esquerdista mas não é.
Num país onde 141 milhões de
eleitores foram transformados em reserva de mercado de uma midia
monopolizada pelo pensamento conservador, a internet tornou-se um
espaço de resistência de uma sociedadde contraditória e diversificada.
Todo mundo – direita, esquerda, centro, nada, tudo, xixi, cocô – está
ali.
Vamos combinar. Hipocrisia demais não funciona. Truculência também não.
Até para ter um pouco de
credibilidade, sem traços claros de ação eleitoral, a denúncia contra
bloqueiros deveria ser acompanhada pela exposição pública da
contabilidade dos grupos de mídia que loteiam cada minuto de sua
programação e cada centímetro quadrado de suas páginas com milionárias
verbas de publicidade federal, estatual, municipal – sem falar em
empresas estatais.
Estamos falando de serviços de mendicância publicitária, de caráter milionário.
Seguido o método empregado em
Guarulhos, seria didático exibir cada cifrão ao lado de cada pacotão de
texto e fotos, concorda? Teriamos bom circo por meses e meses.
Tentar criminalizar
blogueiros pela denuncia de gastos públicos – uns caraminguás, pelos
padrões de mercado -- é um esforço que apenas trái uma visão contrária à
liberdade de imprensa, típica de quem não aceita diversidade nem
contraponto, mas apenas elogios e submissão. É o pensamento único em
método linha dura e capa de falso moralismo. Apesar do escândalo, é uma
denuncia verbal-investigativa. Nada se provou de ilegal.
Nós sabemos qual é a questão de fundo.
Enquanto não se aceitar o
debate sobre democratização dos meios de comunicação, que poderia
permitir uma discussão pública, às claras, expondo imensos interesses
econômico e politicos em conflito, como se fez em vários países
avançados do capitalismo, o jogo nas sombras será inevitável.
Isso
porque as pessoas precisam receber informações, falar, conversar, dar
opiniões. Elas concordam, discordam, rejeitam e querem mais.
Não adianta adiar a chegada de
um novo grau de democracia e civilização. Ela transborda. Na agonia do
regime de 1964, quando a imprensa amiga dos generais chegava a proteger a
ditadura por todos os meios -- inclusive derrotas eleitorais eram
transformadas em vitória -- os governadores de oposição financiavam nova
publicações, sem ranço e sem compromentimento. Enquanto isso, até
jornais alternativos, de faturamento menor do que a quitanda da esquina,
eram alvo de uma devassa permanente por parte da ditadura. Empresários
privados eram pressionados a saber quem ajudar -- e a quem negar ajuda.
Aparelhismo?
Os
últimos anos mostraram – e os blogueiros expressam isso -- que o país
não cabe nos limites mentais, políticos, culturais, do ideário
conservador. Quer mais, quer diferente e por três vezes disse isso nas
urnas. A internet e os blogueiros expressam isso. Têm este direito.
Alguma dúvida?
Paulo Moreira Leite. Diretor da Sucursal da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".
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