José Antonio Lima - Esporte Fino
Mineirão, oitavas de final da Copa do Mundo, Brasil x Chile.
No início da prorrogação, Hulk consegue um escanteio. Olha para a torcida
brasileira, bate no braço como quem diz que tem sangue naquelas veias, pede
vibração. Alguns respondem, mas muitos talvez não estivessem nem vendo o lance.
Esse é um dos dramas da seleção brasileira no mundial que disputa em casa. Não
há vaias, o que é bom, mas não há apoio firme, o que é péssimo. Será assim
enquanto o Brasil estiver na disputa do título, e os jogadores precisam se
acostumar com isso.
Como ocorre em todos mundiais, milhões de brasileiros viram
torcedores, mesmo que não tenham visto uma bola rolar nos quatro anos
anteriores. Para muitos, a Copa do Mundo não é o torneio esportivo mais
importante do planeta, mas motivo de festa e confraternização. Por isso é tão
comum observar, nas aglomerações onde os jogos são vistos, pessoas tocando
corneta durante as partidas ou indo embora no meio delas. Não há problema algum
nisso, pois cada um “torce” do jeito que bem entende.
O problema, para a seleção brasileira, é que nos estádios
esse tipo de comportamento parece ser a regra. Uma quantidade enorme de
frequentadores das arenas da Copa não está lá para torcer, mas para ver e ser
visto, para se divertir, e eclipsa a minoria que comprou ingresso para apoiar a
seleção. É comum ver pessoas “produzidas” no estádio; outras fazendo selfies com
a bola rolando, algumas levantando para comprar comida aos 43 do primeiro tempo
e muitas voltando do intervalo após o reinício do jogo.
No Mineirão, isso ficou claro. Mesmo diante do dramático
jogo do Brasil, houve quem desejasse tirar
foto com famosos entre o tempo normal e a prorrogação, quem sorrisse
e vibrasse quando aparecia no telão no meio da batalha com o Chile e
até gente filmando a disputa de pênaltis. Para essas pessoas, o importante não
era apoiar a seleção, mas registrar o evento e poder dizer que esteve lá. É
como se cada partida da seleção fosse um espetáculo do Cirque du Soleil.
É verdade que torcedores das 32 seleções agem assim. É
verdade também que o Brasil ganhou cinco Copas do Mundo fora de casa e,
portanto, com pouca torcida. Mas é justamente por jogar em casa que a torcida
era mais necessária.
Os 23 jogadores do Brasil convivem com a expectativa do
título, mas ao mesmo tempo correm um enorme risco. Eles estão na fila para se
tornarem os novos Barbosas. Um deles, talvez de forma injusta como o goleiro de
1950, pode ser “eleito” o culpado por uma nova derrota do Brasil em casa, que
será falada pelos próximos 64 anos. Não é uma pressão pequena, e pode ajudar a
explicar a clamorosa tensão do time e a intensa choradeira vista até aqui.
Nos momentos mais nervosos, a impressão é que a “torcida” do
estádio, em silêncio quando o time mais precisa, vai iniciar o massacre se o
time perder. No dia seguinte a uma eventual derrota, vários ali não estarão se
importando, mas atacando os jogadores.
O assunto é sensível para a comissão técnica. Tanto é que o
técnico Luiz Felipe Scolari vive agradecendo o apoio do torcedor, mesmo quando
este não ocorre. Por óbvio, a preocupação é manter o público ao lado da
seleção. Na noite de sexta-feira 27, Felipão foi além. Aceitou participar de
uma constrangedora reportagem do Jornal Nacional na qual
tentava instituir um novo grito de apoio à seleção. Não deu certo,
talvez porque a “torcida” do estádio seja tão alienada em termos futebolísticos
que nem mesmo acompanha o noticiário para saber quão ridicularizado é o “sou
brasileiro, com muito orgulho, com muito amor”.
O que temos são estádios repletos de não torcedores com
ingresso. Muitos não compreendem que futebol não é diversão, mas drama, e que
apoiar o time mesmo nos momentos mais sofridos é a primeira cláusula do
contrato que você assina na infância quando adota um clube, e que serve também
para a seleção, para quem escolhe torcer por ela, em especial em uma Copa do
Mundo.
É triste, mas é a realidade. A seleção brasileira não é a
prioridade da torcida e não vai ser. Os jogadores precisam entender isso e
buscar motivação e confiança dentro do grupo. Das arquibancadas, isso não virá.
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