Sábado 3, setembro 2011
Decisão criou novas expectativas econômicas e políticas. De um lado, o mercado financeiro especulativo chiou, mas o setor produtivo, empresários e trabalhadores, e os estudantes aplaudiram. A bolsa subiu e os investidores se dividiram entre criticar e apoiar. Tudo isso, no entanto, deve melhorar a imagem de Dilma perante a opinião pública
A presidenta Dilma Rousseff seguiu o conselho do poeta: não esperou acontecer, fez a hora. A decisão do governo, na quarta-feira (31), de reduzir a taxa de juros de 12,5% para 12%, surpreendendo o mercado em geral, o financeiro e o produtivo, criou novas expectativas econômicas e, sobretudo, políticas. Abriu novas picadas. Especialmente, despertou o espírito animal dos empresários, que se encontra arrefecido, diante da taxa de juro real mais alta do mundo, inibidora dos investimentos e proibitiva para a competitividade nacional em meio ao dólar sobredesvalorizado, desatado pela política monetária dos Estados Unidos. Decisão econômica com reflexos políticos a produzirem consequências na sucessão presidencial.
Encantoada, de um lado, pelo aumento da dívida pública decorrente do juro alto, que atrai excessiva quantidade de dólar em face da sobrevalorização do real e coloca a economia diante do perigo de ataques cambiais, e, de outro, pela inflação resistente, pressionada pelo próprio dólar barato que obriga os produtores de commodities a reajustarem os preços para compensar prejuízos produzidos pela sobrevalorização do real, a titular do Planalto ousou alto e colheu controvérsias sem fins.
O mercado financeiro especulativo e seus porta-vozes chiaram brabo, mas o setor produtivo, empresários e trabalhadores, assim como os estudantes, aplaudiram. A bolsa subiu e os investidores se dividiram entre criticar e apoiar. Politicamente, Dilma Rousseff faturou. Tal fatura tende a contribuir para melhorar sua imagem na opinião pública, que já se vê satisfeita com as decisões dela no sentido de enquadrar eticamente os ministérios que foram pegos com a mão na massa da corrupção.
A nova instância do poder dilmista, ou seja, o Conselho Monetário Nacional, composto dos ministérios da Fazenda e Planejamento e o Banco Central, avaliou os aspectos econômicos, financeiros, políticos e sociais, para tomar a decisão, indiscutivelmente, de impacto popular, que produziu, no Congresso, consequências políticas.
Os aliados, PMDB-PT-etc adoraram. Já os oposicionistas se dividiram. Uns disseram que o Banco Central se rendeu à pressão do governo, como se o BC não fosse integrante da nova instância do neo-poder político e econômico, o CMN. Outros preferiram o silêncio conveniente.
Atraindo a opinião pública
Como os efeitos a serem gerados no campo da produção e do consumo tenderão a atrair positivamente a opinão pública, se os oposicionistas radicalizarem contra essa nova expectativa aberta pela redução da taxa de juros no campo econômico, evidentemente, terão mais a perder do que a ganhar.
Essencialmente, diante da grande crise internacional, que coloca as economias mais desenvolvidos, europeia e americana, em situação crítica, com dificuldades para crescerem, já que o FMI prevê performance média do PIB delas em 1,8% este ano e no próximo, sinalizando perigo de recessão global, o governo Dilma partiu para inverter a política econômica.
Até agora vinha predominando a orientação de se ter uma política monetária apertada – juro alto – e uma politica fiscal frouxa – aumento de gastos. Com a decisão do Copom, de quarta-feira, passa a vigorar política monetária mais frouxa e política fiscal mais dura.
Foi tão dura a pretensão fiscal dilmista que, logo de saída, criou confronto com o Poder Judiciário. O Planalto autorizara o Ministério do Planejamento a não conceder nenhum aumento real de salário para ele. O mundo veio abaixo. O presidente do STF, Cézar Peluso , protestou e Dilma Rousseff voltou atrás.
Na prática, o arrocho fiscal dilmista, nessa fase de retração da economia internacional, ocorre quando os servidores dos poderes da República – Executivo, Legislativo e Judiciário - já tiveram, ao longo do governo Lula, reposições de suas perdas salariais, acumuladas durante a era neoliberal do Governo FHC, submetido a uma orientação draconiana do Consenso de Washington, que chegou a fixar superávit primário de 5% do PIB, enquanto estabeleceu que o PIB potencial brasileiro não poderia superar o crescimento de 3,5%.
Manutenção dos ganhos
As contas públicas, naquele período, de adaptação da economia brasileira às consequências decorrentes da crise monetária desatada pelos Estados Unidos, de elevarem os juros externos para combater os déficits americanos, nos anos de 1980-90, foram excessivamente contidas e os salários dos servidores sucateados.
A reposição das perdas, ao longo de cinco anos, a partir de 2005, equilibrou econômica e politicamente as tensões e abriu novo espaço de convivência entre os poderes. Não estaria, agora, o governo Dilma na obrigação de ser mais tão generoso na recuperação das perdas que já foram recuperadas. Apenas cumpriria a tarefa de manutenção dos ganhos recuperados pela inflação, sem maiores ganhos reais, para compatibilizar-se com situação financeira estatal, prejudicada pelos juros altos.
Dessa forma, no novo contexto, frente às contas públicas pressionadas, Dilma aperta os gastos, mas busca compensar esse ajuste, aliviando a política monetária, para que a demanda efetiva global seja sustentada mais pelo setor privado e menos intensamente pelo setor público.
As decisões recentes da titular do Planalto para abrir espaço ao empreendedorismo nacional, fortalecendo as micro e pequenas empresas, mediante política tributária favorecida, juros mais baixos etc, representa aposta total na iniciativa privada.
O mesmo ocorre relativamente ao Programa Brasil Maior, de desoneração fiscal mais forte das atividades produtivas, de modo a elevar o poder competitivo das empresas, afetado pelo dólar sobredesvalorizado, que deverá ser mais valorizado frente ao juro interno mais baixo, com tendência cadente, daqui para frente. Com essa nova estratégia, portanto, tornou-se indispensável maior flexibilidade relativamente ao custo do dinheiro, para sustentar crédito tanto à produção como ao consumo.
Evidentemente, se a economia, diante do novo contexto que se inicia essa semana, eleva prestígio político de Dilma Rousseff, as chances de reeleição dela ganha novos contornos. Afinal, juro básico mais baixo incidirá nas dívidas dos governos estaduais e municipais, diminuindo as exigências de pagamento por meio de comprometimento menor das receitas correntes líquidas para satisfazer o tesouro nacional.
Inflação sobe e CPMF ressuscita
Quanto às pressões fiscais que estão em curso por conta das demandas políticas no Congresso Nacional em favor de maior volume de recursos para as áreas sociais, prejudicadas pela insuficiência de gastos, como são os casos da saúde, a titular do Planalto joga o problema para os congressistas. Se eles querem mais dinheiro para a saúde, que votem uma fonte de recursos para garantir isso.
Por isso, entrou em cena a discussão em favor da ressurreição da CPMF, que foi derrubada pelo Senado no final do governo Lula. Com maioria nas duas casas do Legislativo, a presidenta poderá conquistar essa nova fonte de recursos, mas os desgastes por conta de aumento da carga tributária podem ser inevitáveis, a menos que, dessa vez, o dinheiro levantado não seja desviado de suas funções e sua aplicação correta para o setor saúde reverta o desgaste e produza apoio popular.
CPMF volta à discussão como proposta de aumentar recursos para a saúde
De acordo com as pesquisas de opinião pública, a insatisfação maior da sociedade se localiza na saúde. Remover a incompetência e melhorar o atendimento e as condições de funcionamento do setor representariam passo tão impactante como o que aconteceu essa semana no setor financeiro com a recuada forte na taxa de juros em nome da sustentação do desenvolvimento.
Com a alíquota de 0,38% da CPMF, enquanto ela durou, o governo estava conseguindo arrecadar cerca de R$ 40 bilhões por ano. Essa quantia, invariavelmente, era sequestrada para realizar superávits primários elevados, a fim de garantir o serviço da dívida pública interna, enquanto os hospitais, carentes de recursos, ficavam a ver navios.
Mudaria a situação, se a base governista ressuscitar a CPMF com outro nome, provavelmente?
A presidenta ganhou mais credibilidade para defender mais recursos para a saúde, depois que balançou o cenário político e econômico durante a semana. Criou ambiente novo para as atividades produtivas e colocou desafios para as atividades políticas no Congresso. Essa novidade deixou controvérsias no ar. Se a política fiscal é de maior arrocho, mas a monetária é de maior flexibilidade, haveria espaço ou não para previsão de maior crescimento da economia, tanto nesse ano como no próximo?
A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LD0) para 2012 prevê crescimento do PIB em 5%, quando o mercado financeiro aposta em 3,5%, até menos, 3%. A sustentação da arrecadação em alta, no entanto, anima o governo. As políticas sociais, que estão mantidas e foram e continuam sendo as bombeadoras do mercado interno, revelam-se responsáveis pelo maior ingresso de tributos, que levam o governo, mediante maior volume de arrecadação, a apostar todas as suas fichas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Aposta principal
Se a sustentação da demanda interna passa a conviver com juro mais baixo, significa que, estrategicamente, a aposta principal do governo deixa de ser o combate à inflação, a ferro e fogo, na base da perseguição de metas que têm se revelado irrealista, como a de alcançar patamar inflacionário de 4,5%.
O Banco Central, na justificativa para diminuir o juro, frisou que as condições internacionais, apontando deflação, são garantias de que não haverão pressões inflacionárias. Será? Alem disso, a valorização do dólar, por conta do juro mais baixo, diminui as pressões por reajustes de preços das commodities, responsáveis por pressões inflacionárias.
Afinal, os produtores de matérias primas, diante da sobredesvalorização do dólar, reajustavam seus preços em reais, para compensar os prejuízos. Com a taxa de juros cadente, ganham folga para não exercitar esse jogo de perde e ganha, favorecendo o controle interno da inflação. De qualquer forma, porém, menor taxa de juros, que eleve as expectativas de investimentos e de consumo interno pressionam os preços.
Na prática, o governo Dilma flexibiliza a dureza da políica econômica voltada para alcançar, a qualquer custo, as metas inflacionárias. A meta perseguida de 4,5% pode ser adequada para país desenvolvido, onde tudo já está pronto em matéria de infraestrutura. Para país em que , praticamente, tudo está por fazer, como é o caso do Brasil, soa pura subjetividade, como demonstra a realidade. Enquanto o discurso oficial , até agora, era o de seguir a meta de 4,5%, a inflação se encontra, em 12 meses, na casa dos 7%.
Ao que tudo indica, ao decidir por juro mais baixo, Dilma Rousseff ajusta o discurso à realidade. É a resposta que dá, apostando na produção, à situação internacional em que predomina o oposto, ou seja, as tensões deflacionárias.
A guinada dilmista na política monetária sinaliza novos comportamentos do mercado financeiro. As apostas de que a selic iria subir para conter a inflação se reverteram. O mercado passou a apostar no inverso.
Nas próximas reuniões do Copom, os analistas preveem novas quedas sucessivas de 0,5 pontos percentuais, de modo que o patamar, em 2012, fique na casa dos 9%. Descontada a inflação, que poderá estar ascendente, na casa dos 7%, como ocorre no momento, a taxa real ficaria em 2%.
Ou seja, emerge um contexto que, politicamente, favorecerá as forças governistas. Diante disso elas teriam ou não maiores motivações para apostar na reeleição da titular do Planalto? Por César Fonseca - Redação Jornal da Comunidade
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