Foi lançado, recentemente, pelos procuradores paulistas um
abaixo-assinado contra a Proposta de Emenda Constitucional que põe em
jogo o poder de investigação criminal do Ministério Público. É
apelidada de “PEC da Impunidade”. A referência é, certamente, uma
tentativa de ganhar popularidade em decorrência do julgamento do chamado
“mensalão” petista.
Há, no entanto, uma discussão na sociedade em sentido contrário ao que
essa PEC da Impunidade busca: manter o direito de o MP investigar. O
debate vem de longe e é guiado por uma frase lançada pelo advogado
Sepúlveda Pertence, quando se despediu da função de procurador-geral da
República (no governo Sarney): “Eu não sou o Golbery, mas também criei
um monstro”.
Pertence. Ao se despedir, repetiu a frase de Golbery a respeito do SNI |
Golbery do Couto e Silva, general articulador do golpe de 1964, foi o
idealizador e o primeiro chefe do Serviço Nacional de Informações
(SNI), que ganhou vida própria e, posteriormente, engoliria o próprio
criador por ocasião das bombas do Riocentro em 1981. Golbery pediu a
cabeça do general Gentil Marcondes, comandante da Vila Militar de onde
haviam saído os terroristas fardados. O general Octávio Medeiros, então
chefe do SNI, se opôs com o apoio do ditador Figueiredo. A demissão de
Golbery não tardaria.
Pertence, afastado do Ministério Público, também foi engolido pelo
“monstro” criado por Golbery e expurgado do Ministério Público. Para, em
1985, ser escolhido por Tancredo Neves para a Procuradoria-Geral da
República. Despediu-se dela com um adeus a um “monstro” perigoso à
democracia.
O modelo atual do Ministério Público nasceu da Constituição de 1988.
Com a ação do tempo e a ambição dos homens, ampliou indevidamente seus
poderes, incluindo o poder investigatório que, de um modo geral,
transformou o promotor em um agente a serviço do Estado e não do réu.
Em vez de “exercer o controle externo da atividade policial”, como
prevê a Constituição, o MP passou a endossá-lo. É possível ouvir frases
como essa entre procuradores que, preocupados, estudam a situação: “Não
é aceitável que o MP participe da produção da prova, investigue,
-acuse e ainda pertença ao sistema de Justiça”.
Lula colaborou com essa deformação. Estabilizou a lista tríplice para
escolha do procurador-geral e, ainda mais, indicou sempre o mais votado
pelos pares. Assim consolidou o processo eleitoral de escolha, quando,
pela Constituição, a indicação é única e exclusivamente da Presidência.
A disputa por lista alimenta o monstro.
O atual procurador-geral, Roberto Gurgel, defende o poder
investigatório. Omite sempre, para reforçar a tese, a quantidade de
atribuições do Ministério Público brasileiro. Nenhum outro país do mundo
as tem: move ação de improbidade, fiscaliza o meio ambiente, defende
os direitos dos índios, interfere na saúde e… e resta a pergunta: onde
sobra tempo para investigar?
O MP teria um papel importante na fiscalização da situação jurídica dos
presos e na aplicação das verbas para a construção de presídios. Mas
não o exerce. Não incorre na corresponsabilidade com a calamidade
existente nos presídios brasileiros?
Há outras questões mais graves. É o caso da banalização dos aparelhos
de escuta telefônica, o chamado “Sistema Guardião”. O governo
brasileiro não sabe quantos aparelhos há em funcionamento no MP. O
sistema é operado sem controle. Para isso, o MP tem agentes de
inteligência, os espiões, em seus quadros.
Essa situação é explosiva. O membro do MP pode investigar valendo-se de
uma atribuição originária da polícia e utilizando estrutura própria
das agências de inteligência, aptas a promover espionagem por pessoas e
por aparelhos.
Terá o MP se transformado em agência de espionagem sem marco regulatório?
Andante MossoInterventor. Este pretende reformar a Constituição |
Caso a Câmara aprovasse uma lei pela qual o Supremo Tribunal Federal
fosse obrigado a julgar os processos na ordem cronológica de ingresso, o
que aconteceria?
Muito provavelmente o STF diria tratar-se de indevida intromissão na sua regulação interna.
Como pode o ministro Fux intervir no regimento do Congresso ao declarar
inconstitucional a aprovação do pedido de urgência para os royalties?
No gabinete dele os processos são despachados por ordem de chegada? Ou
será que urgência só existe para o Judiciário, não para o Legislativo e
o Executivo?
Linha do tempo
Veteranos executivos da Petrobras reclamam de uma suposta política da
estatal no sentido de favorecer funcionários jovens no preenchimento de
chefias.
Cargos de gerente, normalmente alcançados após um mínimo de 15 anos,
estariam sendo entregues a funcionários com tempo mínimo de trabalho.
Seria somente um processo natural de renovação de quadros ou política de privilégios?
Os petroleiros do Rio de Janeiro têm certas dúvidas. Por isso, em carta à presidenta da empresa, Graça Foster, reagiram assim:
“Nas Forças Armadas, antiguidade é posto. Na Petrobras, é castigo”.
Risco de critério
Sarney nomeou a primeira mulher de um tribunal superior, Cnéa Moreira,
para o TST. FHC fez o primeiro ministro negro, Carlos Alberto Reis de
Paula, para o TST.
O mesmo FHC escolheu a primeira mulher para o STF, Ellen Gracie. Lula
nomeou o primeiro ministro negro para o STF, Joaquim Barbosa.
Dilma nomearia uma ministra negra para a vaga de Ayres Britto, no STF?
É um dos muitos bochichos na capital. Não seria melhor voltar às exigências constitucionais?
Terrorismo jurídico
A pressa em prender não guarda relação com as regras democráticas.
É a lição que ministra o advogado Erick Wilson Pereira, doutor em
Direito Constitucional pela PUC-SP, sobre a pressa de Roberto Gurgel de
pedir a prisão imediata dos réus condenados no processo do “mensalão”.
“O procurador-geral não pode inverter os valores constitucionais,
porque o princípio da presunção de inocência exige o trânsito em
julgado.”
Diante dessa regra, Gurgel faz terrorismo barato.
Joaquim e Frei Luiz
Joaquim Barbosa, inflexível presidente do STF, cedeu às pressões.
Na sexta-feira 7, foi ao Lar de Frei Luiz, bem frequentado centro
espírita kardecista, no Rio de Janeiro, dedicado a tratamentos e a
“operações” espirituais.
Por insistência de amigos, ele busca alternativa às variadas tentativas de se livrar de terríveis dores no quadril.
Pelo sim, pelo não, é bom lembrar que Frei Luiz (1872-1937), alemão de
nascimento, ensinava Direito Canônico, onde não consta a “teoria do
domínio do fato”.
Mas, enfim, nunca se sabe até onde JB pretende alargar seus conhecimentos.
Alves. Exímio nadador |
Tradição, traição
Em breve, o confronto entre o Legislativo e o Judiciário, semente de
uma crise institucional de fundamento duvidoso, sairá das mãos de Marco
Maia (PT) para as de Henrique Alves (PMDB).É quando, efetivamente, as
coisas serão resolvidas, após a publicação do acórdão do STF e a
avaliação dos embargos da defesa.
Os Alves, embora avaliados com ceticismo no meio político, têm
compromisso histórico com o Congresso, em razão de marcas deixadas pela
ditadura. Aluizio, pai de Henrique, em 1969, foi cassado, acusado de
corrupção.
O filho, no entanto, boia em qualquer circunstância. Tem a densidade política de uma rolha.
Armação
Após acabar com o conforto dos terminais sob concessão que, agora, com o
recente pacote dos portos, poderão enfrentar ampla e forte
concorrência de novos investidores, a presidenta Dilma Rousseff olha com
lupa o setor de armação nacional.
Há uma explicação para tanto cuidado. Embora as companhias de navegação brasileiras detenham oficialmente o monopólio da cabotagem, o transporte entre portos nacionais representa menos de 2% do modal de transporte no País.
O governo quer entender se o armador pátrio é preguiçoso ou pouco empreendedor.
No chamado longo curso, ou seja, entre portos nacionais e internacionais, sobretudo no segmento de navios porta- -contêineres, a situação é ainda mais incompreensível: hoje 100% do transporte é feito por companhias estrangeiras, com fretes pagos por exportadores e importadores nacionais.
O curioso – quem quiser, ou souber, pode achar isso muito estranho – é que nada menos que 95% do comércio exterior brasileiro é feito por via marítima.
Maurício DiasHá uma explicação para tanto cuidado. Embora as companhias de navegação brasileiras detenham oficialmente o monopólio da cabotagem, o transporte entre portos nacionais representa menos de 2% do modal de transporte no País.
O governo quer entender se o armador pátrio é preguiçoso ou pouco empreendedor.
No chamado longo curso, ou seja, entre portos nacionais e internacionais, sobretudo no segmento de navios porta- -contêineres, a situação é ainda mais incompreensível: hoje 100% do transporte é feito por companhias estrangeiras, com fretes pagos por exportadores e importadores nacionais.
O curioso – quem quiser, ou souber, pode achar isso muito estranho – é que nada menos que 95% do comércio exterior brasileiro é feito por via marítima.
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