Também para a história
Janio de Freitas
Três executivos do BB, nomeados no governo FHC, foram excluídos do processo do mensalão
Outras peculiaridades, além das dimensões e da fartura de condenações,
confirmam o peso histórico atribuído com antecedência ao chamado
julgamento do mensalão, também referido com frequente ironia como ação
penal 470.
É possível que já houvesse, entre os julgadores e entre os julgados,
personagens mais cedo ou mais tarde destinados à história, e outros aos
buracos de todas as memórias. O julgamento igualou-os, mas ficou a
injusta recusa a três pessoas de passarem também à história.
Documentos comprovam as assinaturas e rubricas de quatro representantes
do Banco do Brasil, dois diretores e dois gerentes executivos, nas
transações com a DNA de Marcos Valério em torno da Visanet. Incluído na
ação penal 470, porém, foi um só. Os três restantes foram deixados para
processo comum, de primeira instância, com direito a todos os recursos
às instâncias superiores, se condenados, e demandas de defesa. Ou seja,
possibilidade de sucessivas defesas e múltiplos julgamentos. Direito não
reconhecido aos julgados no Supremo Tribunal Federal, por ser instância
única.
Os três barrados da história têm em comum o fato de que já estavam nos
cargos de confiança durante o governo Fernando Henrique, neles sendo
mantidos pelo governo Lula. E, em comum com o condenado pelo STF, terem
os quatro sempre assinado em conjunto, por norma do BB, todas as
decisões e medidas relativas ao fundo Visanet. Dado que uma das
peculiaridades do julgamento foi o valor especial das ilações e
deduções, para efeito condenatório, ficou liberada, para quem quiser, a
inquietante dedução de tratamento discriminatório e político, com
inclusão nas durezas do STF apenas do diretor definido como originário
do PT.
O benefício desfrutado pelos três não foi criado pelo relator Joaquim
Barbosa, que o encontrou já na peça de acusação apresentada pelo
procurador-geral Roberto Gurgel, e o adotou. Um dentre numerosos
problemas, sobretudo quanto a provas. Por exemplo, como registrado a
certa altura do julgamento nas palavras bem dosadas de Marcelo Coelho:
"O ponto polêmico, na verdade, recai sobre a qualidade das provas
para incriminar José Dirceu. Não houve nenhum e-mail, nenhuma
transcrição de conversa telefônica, nenhuma filmagem, provando
claramente que ele deu ordens a Delúbio Soares para corromper
parlamentares".
A condenação de José Dirceu está apoiada por motivos políticos. E, à
falta das provas cabais para condenação penal, forçosamente originada de
motivações políticas. Bastará, no futuro histórico do julgamento, para
caracterizá-lo como essencialmente político. Caracterização que se
reforça, desde logo, pelo tratamento amigável concedido ao mensalão
precursor, o do PSDB, de 1998 e há 14 anos acomodado no sono judicial.
E caracterização outra vez reforçada pela incontinência do
procurador-geral Roberto Gurgel, com seu pedido de prisão imediata dos
réus condenados sem que representem perigo e sem que o processo haja
tramitado em julgado. A busca de "efetividade" da ação judicial,
invocada pelo procurador-geral para o pedido negado por Joaquim Barbosa,
ficaria muito bem no caso em que se omitiu, com explicação tardia e
insuficiente.
Houvesse, então, o apego à efetividade, o Ministério Público estaria em
condições de evitar a enrolação de negociatas que usa Carlos Cachoeira
como eixo, inclusive no Congresso.
No primeiro dia do julgamento, o relator chamou o revisor de "desleal",
por manter a opinião que o relator abandonou. No segundo, o revisor foi
posto pelo relator sob a insinuação de ser advogado de defesa do
principal acusado, Marcos Valério. E de destrato em destrato até o fim, o
julgamento criou mais uma inovação inesperada para destacá-lo nos
anais.
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