No ano passado, participei de um bate-papo com estudantes de Jornalismo
da universidade local. Fiz a minha pergunta e recebi as mesmas
respostas de sempre (“Para... hmmm... dar uma voz à comunidade?”) Quando
disse a resposta aos estudantes, o instrutor discordou e repetiu a
mesma besteira que os estudantes já haviam proporcionado. Minha resposta
era uma observação de senso comum, dita com delicadeza. Como
recentemente me escreveu um amigo, “se você quiser ver cabeças
explodirem, tente explicar às pessoas que elas não são o cliente e o
jornal não é o produto... Os anunciantes são o cliente e a atenção do
leitor é o produto”. Se você fizesse essa experiência com uma faculdade
de Jornalismo típica, as detonações cranianas que se seguiriam seriam
registradas no sismômetro do departamento de Geologia.
E no entanto, é a verdade pura e simples, 100%.
Nós, na Redação, não deveríamos alimentar ilusões. Nosso objetivo total
é preencher o “buraco das notícias”, que é o espaço que sobra depois
que os anúncios tiverem sido colocados na página. Esse é o fato por trás
da observação cômica do seriado de televisão Seinfeld: “É
fantástico como a quantidade de notícias que acontece no mundo
diariamente sempre se encaixa à perfeição no jornal.” É tudo decidido
pela publicidade.
Preparando jovens para ‘salvar o mundo’
Se os jornais servem o público, isso é um feliz efeito colateral do
principal objetivo de ganhar dinheiro. E, na verdade, servir o público
depende completamente da condição de fazer dinheiro. Como estes simples
fatos escapam à atenção dos estudantes de Jornalismo e professores de
Jornalismo, é óbvio. Eles vivem numa Terra do Nunca onde os fatos da
vida vêm em segundo lugar, depois do engajamento ideológico.
Ocupados, os professores preparam-se para enfrentar oralmente as
injustiças do mundo, tais como definidas pelos professores do mundo. O
resultado é aquilo que o colunista Jeff Jacoby, do Boston Globe,
recentemente descreveu como uma “falta de diversidade ideológica” que
se encontra na maioria das redações americanas. Jacoby listou os
atributos mais comuns, incluindo “o apoio reflexivo aos democratas, a
antipatia pela religião e pelos militares, o apoio ruidoso a entusiasmos
liberais como controle de armas e casamento homossexual...”
Por que são necessários quatro anos para preparar jovens jornalistas
para salvar o mundo – isto é, refazê-lo em sua imagem filosófica – é
algo que não entendo. Nunca fiz um curso de Jornalismo, o que considero
uma bênção para minha carreira e, em especial, para minha atividade de
repórter. Eventualmente, um superior me diz: “Não é assim que se faz.”
Quando pergunto por que, invariavelmente a resposta é: “Porque eu
aprendi que não é assim que se faz.”
Regulação e legislação
Empresários podem recuar diante dessa frase. Espero que o façam.
Afinal, nos negócios nenhuma frase é tão perigosa quanto “não é assim
que fazemos aqui”.
Em parte, o resultado é um modelo estilístico que se recusa a envolver-se por completo com o leitor. Você sabe por que esta frase seria cortada por um copidesque?
Porque usei a palavra “você”. O copidesque preferiria “os leitores
poderiam se surpreender se soubessem que esta frase seria cortada pelo
copidesque”.
Na atual era midiática, quando o exibicionismo por categoria é
comemorado, nós, do ramo dos jornais, continuamos muito melindrosos para
usar o enorme poder de envolvimento da segunda pessoa. É claro que
todo mundo sobrevaloriza o treinamento acadêmico que recebeu. Torna o
débito uma inconveniência e o tempo gasto, válido, ou menos fútil, pelo
menos. E imagine a emoção de usar o “lede”, que é a nova forma de
escrever lead [guiar, conduzir], como em frase de abertura de
uma matéria. Seu uso proporciona a agradável sensação de possuir
conhecimento especializado, um conhecimento bem para lá dos conhecidos
do mediano zé ninguém.
Isso é particularmente agradável para aqueles que sabem tão pouco sobre
todo o resto. Por exemplo, sempre pergunto aos candidatos a emprego uma
segunda questão: “Qual é a diferença entre regulação e legislação?” Um
único estudante graduado sabia a resposta. Timidamente, ele admitiu
que sabia porque no verão anterior havia trabalhado como assessor
legislativo.
Incompetência e corrupção
Diga-me, por favor. Como é que se prepara um estudante para uma
carreira como “cão de guarda do governo” e não se dá a mais elementar
instrução sobre como funciona um governo? Como convém à sua orgulhosa
reputação e seu orgulhoso objetivo, os jornalistas trabalham sob o
vínculo de uma orgulhosa construção ética. Infelizmente, ela é tão
imperfeita e juvenil quanto sua proposta jornalística. De vez em quando,
os imperativos éticos são simplesmente incompatíveis. Por exemplo: 1)
salvar o mundo; e 2) objetividade jornalística. Isso ilustra à
perfeição um fato importante: não foi filosófica ou acidentalmente que
se chegou à ética jornalística.
Como é o caso com muitos códigos de ética, a ética na indústria do
jornalismo tem como um de seus principais objetivos a manutenção do status quo, principalmente do status quo econômico.
Os leitores mais velhos se lembrarão que antigamente os advogados
americanos evitavam a publicidade. Funcionava às mil maravilhas como
forma de diminuir a concorrência, tanto em termos de preço quanto de
atrair novos clientes. Para um equivalente em jornalismo, imaginemos que
a maioria das redações dos jornais americanos funciona isolada dos
aspectos “comerciais” da empresa. O suposto objetivo é o de garantir que
os repórteres não sejam influenciados pela sujeira da troca de
dinheiro que ocorre em algum outro lugar daquele prédio. Eles devem
trabalhar como se os bancos locais não estivessem, de fato, comprando
anúncios de página inteira e, com isso, ficam livres para fazer
perguntas sobre a incompetência ou a corrupção dos bancos com a mesma
frequência que o fazem àqueles que não anunciam.
Notícias insípidas
Na prática, a coisa não funciona tão bem.
Entretanto, bate na tecla – tão presente entre os moradores das
redações – de que a maioria dos negócios é uma atividade corrupta, ou
pelo menos questionável. Todos os donos de negócios são vistos como
“gananciosos”. Os repórteres acham a ideia de maximizar os lucros um
pouco perigosa. Lembre-se que os repórteres não estão trabalhando por
recompensas semelhantes àquelas dos negócios. Eles querem salvar o
mundo.
Há séculos que os donos de jornais usam essa propensão para pagar uma
mixaria aos repórteres. Na realidade, a profissão dos repórteres é uma
das que recebem pior pagamento entre as que exigem diploma
universitário. Na maioria dos lugares, ganham de 40 a 50% menos que o
bibliotecário local. Os donos dos jornais aproveitam-se, e muito, da
ingenuidade do pessoal que está em suas redações. Eles não dizem uma
palavra.
Depois temos a ideia de “objetividade”, outro conceito completamente
ridículo e que também é altamente útil para gerar lucros. Objetividade
jornalística é uma coisa que não existe. (Para uma explicação detalhada,
veja “Why the News Makes You Angry”.)
Um pouco antes do final do século 19, toda a cidadezinha americana
tinha um ou mais jornais e cada um atendia a leitores de determinada
tendência religiosa, social ou política. Foi então que se introduziu a
“objetividade”. O resultado não eram notícias objetivas, mas notícias
que não sofriam objeções por parte de nenhum grupo. Notícias insípidas e
comentários mostraram ser um ótimo modelo de negócios porque eram
vendidos ao público como estritamente factuais, sem a suspeita de
preconceito.
Magia negra
Os consumidores confiaram. E engoliram essas notícias.
As notícias objetivas foram e continuam sendo uma piada, mas os
americanos continuam a acreditar que existem. As pessoas que assistem ao
canal CNBC dirão que é objetivo. Os espectadores que assistem à Fox
acreditam que escutam a verdade nua e crua. Como iriam essas mesmas
pessoas penetrar o noticiário tendencioso, mas muito mais sofisticado,
do New York Times?
A maioria dos consumidores de informação acredita que as notícias que
recebe são “objetivas” simplesmente porque lhes disseram que são. É um
fenômeno psicológico bastante conhecido, normalmente citado como uma
“grande mentira”. A Sociedade dos Jornalistas Profissionais fornece uma
interessante recapitulação de toda essa história de ética jornalística
em seu website.
Você verá que é exigido dos “jornalistas profissionais” – o que quer
que isso signifique – que “descrevam na matéria a diversidade e
magnitude da experiência humana com ousadia, mesmo quando não seja
popular fazê-lo” – o que quer que isso signifique. E, finalmente,
exige-se dos jornalistas que “exponham a conduta aética por parte de
jornalistas e da mídia de informação”. Certo. Se porventura alguma vez
existiu um argumento a favor do valor de jornalistas de pijama online,
isto deveria acabar com ele.
Durante décadas, a grande mídia trabalhou numa bolha, completamente
livre do controle de outros. Todos vimos os resultados disso. Diminuíram
nossas vidas diárias. E foi tudo consequência de um acordo de
cavalheiros: nós não iremos olhar para vocês se vocês não olharem para
nós. E nunca deveremos, jamais, olhar criticamente para nossas próprias
operações.
Agora, felizmente, aquele modelo foi destroçado – não por jornalistas
profissionais, mas por amadores. Diletantes é como os chamariam meus
condescendentes colegas – se seu vocabulário fosse suficiente.
Pessoalmente, adoro essa gente. Eles estão finalmente conseguindo forçar
a responsabilidade numa indústria singularmente poderosa que, por um
tempo demasiado longo, às vezes praticou sua magia negra com o olhar do
público.
Tradução de Jô Amado, edição de Leticia Nunes. Artigo de Theodore Dawes “The Fall of Journalism”, American Thinker
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