As novelas são uma tragédia cultural para o Brasil: ensinam a tomar cerveja e não a pensar.
E é anunciada a segunda temporada do seriado escandinavo The Bridge. Os
ingleses ficam felizes. A série passa na tevê britânica com legendas.
O fato: Bridge pegou.
Saga, a detetive sueca, cabelos loiros sempre soltos, uma cicatriz no
lábio que a torna ainda mais atraente, já rivaliza com Sarah Lund, de
The Killing, outra série escandinava de sucesso internacional.
Antes que eu fale sobre a história, a pergunta essencial: por que no
Brasil não fazemos nada que preste na televisão? Por que somos
humilhados em qualidade até pela Escandinávia com seus recursos
limitados?
Tenho minha tese: a estética da novela massacra a criatividade. Filmes e
séries no Brasil têm uma semelhança irritante com as novelas da Globo.
Mesmos atores, mesmos diretores, mesma limitação, mesma falta de
surpresa e inovação.
O florescimento do cinema e da tv na Escandinávia está conectado ao
grupo Dogma, um conjunto de cineastas iconoclastas e brilhantes entre os
quais se destacava Lars von Trier, um dos últimos gênios da direção.
The Bridge é um dos filhos do Dogma.
Nosso Dogma, lamentavelmente, é a novela das 9. Que não faz você
pensar, e sim tomar cerveja. Me conta um amigo publicitário que em
Avenida Brasil tudo era motivo para tomar cerveja, por causa do dinheiro
colocado pela Ambev não em propaganda direta, mas no controvertido e
perigoso ‘product placement’, o popular mercham. Nele, vc consome
publicidade disfarçada no meio do conteúdo.
Quer dizer, os personagens da novela bebiam desmedidamente cerveja não
porque tivessem propensão a alcoolismo, mas por conta de um contrato
milionário firmado pela Globo. Na Inglaterra, bebidas alcoólicas são
proibidas de aparecer subliminarmente, para que não seja estimulado um
hábito ruim para a saúde.
A história de The Bridge gira em torno de um cadáver descoberto na
ponte que liga Suécia e Dinamarca. Dois, na verdade. O corpo parece ter
sido serrado no meio. Mas a perícia logo descobre que a parte de cima é
de uma mulher e a de baixo de outra.
Logo aparece Saga, absolutamente desinibida, e domina a trama. Quando
quer sexo, ela vai a um bar e escolhe um homem. Depois leva para seu
apartamento. Saciada, volta ao trabalho de investigação e esquece o
homem. O melhor diálogo da série é entre ela e seu parceiro de polícia.
“Que você fez ontem?”, ele pergunta.
“Sexo”, ela responde, com a naturalidade que teria se tivesse dito que foi visitar uma velha tia reumática.
As novelas brasileiras não emburrecem apenas o público. Também os diretores e atores ficam mais burros.
Tropa de Elite 1 poderia ser a semente de uma renovação. Mas não foi
nada. A sequência já parecia uma paródia. Triunfou o espírito das
novelas.
Maldição eterna a elas.
Paulo NogueiraNo Diário do Centro do Mundo
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