quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Caos Aério: culpa do Amorim ou do Fantástico?


O Fantástico tem até o próximo Domingo para dar resposta à manifestação do Comando da Aeronáutica, que desqualificou a reportagem que foi ao ar no último programa, reproduzida na manhã do dia seguinte, no Bom Dia Brasil.

Com a experiência que acumulei nas redações dos principais telejornais do país vou contar para os leitores como as coisas funcionam internamente.

Assim que nota chegou à emissora desencadeou-se um processo de apuração, para saber quem eram os responsáveis pelos erros cometidos. Fossem outros tempos seria simples: bastava demitir o editor e dizer que foi um equívoco. Já vi isso acontecer em ao menos duas ocasiões.


Na mais acintosa delas, no mesmo Fantástico, a jornalista tinha editado uma reportagem dessas em que IPT confere se os produtos estão ou não de acordo com as especificações da embalagem. Ao final, em nota, as empresas se explicam sobre as falhas encontradas. Como as explicações quase sempre são imensas, é praxe o editor reduzir tudo para caber numa nota curta lida pelo apresentador.

Dou um exemplo: AS EMPRESAS TAIS INFORMARAM QUE OS PRODUTOS ESTAVAM FORA DE ESPECIFICAÇÃO POR ISSO, OU AQUILO. E QUE VÃO RECOLHER O LOTE PARA AVERIGUAÇÕES.

Só que a nota era genérica demais para contemplar os interesses de uma das empresas, multinacional anunciante de peso da emissora.

Quando veio a reclamação foi simples: bastou demitir a colega. Neste caso em questão foi até bom. Depois da demissão a jornalista "ganhou asas" e, hoje, no papel de executiva de comunicação de multinacional, é sua vez de dizer aos antigos chefes o que o patrão anunciante quer ver escrito no telejornal. Uma senhora volta por cima, não acham?

No entanto, em tempos de internet, não vai ser possível, depois das dimensões que o caso ganhou, simplesmente mandar um editor embora. Desta vez eles terão que ser um pouco mais convincentes.

Como a tese da matéria era a de que é inseguro voar no Brasil, para contestar a crítica de falta de isenção e incorreção, o certo seria fazer uma reportagem de igual teor e mesma duração desdizendo o que foi dito. Seria um fato inédito e positivo, mas que permitiria ao menos duas leituras.

Leitura 1: A Globo passa recibo de sua incompetência jornalística.

Leitura 2: A Globo mostra que é fiel a seu Código de Conduta.

Mas, não nos iludamos. Dificilmente isso aconteceria, considerando-se a dinâmica do telejornalismo e as características do programa. Vale lembrar que a concorrência no horário é feroz e abrir tanto espaço assim para um assunto "velho" poderia ser, do ponto de vista da audiência, um tiro no pé.

Portanto, é provável que a emissora procure algum especialista que endosse a tese da reportagem, para sustentar as constatações feitas pelo repórter (neste caso não faltarão aqueles que adorariam a vitrine), ou se retratar de forma curta e grossa.

Como sou a favor da retratação e sei que muitos colegas lá dentro, mesmo sob intensa pressão, são grandes jornalistas, estou disposto a ajudar e, para isso, vou oferecer três versões de notas que podem ser copiadas e coladas no espelho para o apresentador ler, sem que seja necessário dar crédito a este velho editor.



versão 1 - light:

DIFERENTEMENTE DO QUE O FANTÁSTICO INFORMOU NO ÚLTIMO DOMINGO, HÁ REGRAS DIFERENTES PARA TRÁFEGO AÉREO EM AERONAVES DE PEQUENO PORTE E AQUELAS QUE SERVEM PARA VÔOS COMERCIAIS.

EM NOTA, O MINISTÉRIO DA AERONÁUTICA INFORMOU QUE MESMO AS AERONAVES VOANDO PRÓXIMAS UMAS DAS OUTRAS, ISSO NÃO IMPLICA EM RISCO DE COLISÃO NECESSARIAMENTE.

A NOTA TAMBÉM ASSEGURA QUE INFORMAÇÕES METEOROLÓGICAS ESTÃO DISPONÍVEIS E DESQUALIFICA AS FONTES DA REPORTAGEM.

versão 2 - casual:

EM NOTA, O MINISTÉRIO DA AERONÁUTICA CONTESTOU INFORMAÇÕES LEVADAS AO AR PELO FANTÁSTICO NO ÚLTIMO DOMINGO E INFORMOU QUE TEM UM DOS CINCOS MELHORES CONTROLES AÉREOS DO MUNDO.

A REPORTAGEM ERA SOBRE AS CONDIÇÕES DE VÔO E DO CONTROLE DE TRÁFEGO AÉREO NO BRASIL.

A REDE GLOBO DE TELEVISÃO, AO CONTRÁRIO DO QUE DIZ A NOTA, EM NENHUM MOMENTO FOI SENSACIONALISTA.

FEZ UM RELATO JORNALÍSTICO COM BASE EM DEPOIMENTOS DE DOIS PROFISSIONAIS DO SETOR.
versão 3 - emphasis:

O FANTÁSTICO ERROU.

NO ÚLTIMO DOMINGO, AO NOTICIAR A INSEGURANÇA NO TRANSPORTE AÉREO DO BRASIL, NOSSA REPORTAGEM OMITIU O FATO DE QUE, TANTO O CONTROLADOR DE VÔO ENTREVISTADO, QUANTO O PILOTO, SÃO PESSOAS DESQUALIFICADAS PARA SUSTENTAR DENÚNCIAS DE TAMANHA GRAVIDADE.

AO PROCURAR A AERONÁUTICA, NOSSA PRODUÇÃO TAMBÉM OMITIU O REAL INTERESSE DA REPORTAGEM.

E RELATOU FALHAS QUE NÃO EXISTEM, NUM GESTO SENSACIONALISTA, TÍPICO DE QUEM NÃO É ISENTO E AGE SEM CORREÇÃO, O QUE CONTRARIA OS PRINCÍPIOS EDITORIAIS DA EMISSORA.

Desafio os leitores a apostarem qual será a nota que irá ao ar...

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