A relação entre a revista Veja e o ministro
do STF Gilmar Mendes, que culminou, na última semana, em acusações
contra o ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é antiga, e sempre
costumou ser muito amistosa. A busca no acervo digital da Veja revela
140 menções a Mendes, parte delas trazendo o ministro como fonte, parte
apresentando-o como um gênio do meio jurídico brasileiro ou fazendo
supor que Gilmar Mendes é um dos grandes frasistas da História do país.
Além disso, a pesquisa traz algumas curiosidades um tanto quanto
incômodas para Mendes. Chegaremos a elas.
Entre as 140 menções, dezenas delas estão
na seção “Veja Essa”, dedicada às mais interessantes – na concepção da
Veja – frases da semana. Todas as citações de Gilmar Mendes são de
frases fortes, espirituosas, e carregadas de ataque aos movimentos
sociais e a lideranças políticas, como o atual governador do Rio Grande
do Sul e ex ministro da Justiça Tarso Genro (PT).
A
primeira aparição de Mendes na Veja acontece em 1992. Ele era, então,
assessor jurídico do Planalto, subordinado ao ex presidente Fernando
Collor, a quem defende na matéria publicada em setembro daquele ano.
Gilmar Mendes só volta a aparecer na revista dez anos depois, como
advogado-geral da União e candidato ao Supremo Tribunal Federal. Ali,
como em 1992, Gilmar e a Veja parecem não se entender muito bem. Diz a
matéria: “Dono de um estilo agressivo, Mendes é alvo de maledicências
no tribunal”.
Ainda em 2002 há o primeiro capítulo da
curiosidade citada no primeiro parágrafo desse texto. Lembremos que,
agora, em 2012, o ministro do STF acusa Lula de ter tentado interferir
nas decisões do Supremo. Pois, há dez anos, observemos o que nota
publicada na Veja relatava: “Quando não se discutia a possibilidade de o
advogado-geral da União, Gilmar Mendes, assumir uma vaga no Supremo
Tribunal Federal, a relação dele com o Poder Judiciário conheceu
momentos de atrito. Certa vez, Mendes enviou uma carta ao STF em que
pedia aos juízes que moderassem seu contato com a imprensa”. Sim,
Gilmar Mendes, quando advogado-geral da União, tentou interferir na
conduta do STF. E mais: já ministro do STF, tentou interferir na
conduta da Polícia Federal. Em nota da seção Radar, da revista Veja, em
junho de 2007, o jornalista Lauro Jardim afirma: “O ministro do STF
Gilmar Mendes telefonou na semana passada para Tarso Genro. (…)
Furioso, Mendes reclamou da atuação da PF, que vazou extra-oficialmente
o seu nome como um dos beneficiários dos presentinhos da Gautama (…)”.
Durante toda a crise institucional entre
Gilmar Mendes e Tarso Genro, a Veja sempre posicionou-se ao lado do
ministro do STF. A divergência chegou ao caso do ativista italiano
Cesare Battisti, momento em que a revista aumentou o espaço dado a
Gilmar para ecoar a gritaria contra o “terrorista” e seus
“comparsas”. Em julho de 2008, a Veja publicou uma reportagem de quatro
páginas atacando o trabalho da Polícia Federal, que estava então sob
comando de Tarso.
Em 2009 começou a paixão entre Gilmar e o
colunista da revista, Reinaldo Azevedo, que agora o defende aos gritos
contra Lula. Em abril daquele ano, a edição impressa destacava nota
publicada no blog do colunista, sobre a discussão entre Gilmar e outro
ministro do STF, Joaquim Barbosa, em que Azevedo, como de costume, se
investe de ares de juiz supremo: “Joaquim Barbosa está obrigado a
provar, como ministro do Supremo, que seu colega tem ‘capangas’. Se
Gilmar Mendes tem capangas e Barbosa tem as provas, então está
prevaricando”.
Dois anos depois, em dezembro de 2011, o
mesmo Reinaldo Azevedo publicava na Veja um artigo de duas páginas,
intitulado “Ainda há juízes em Brasília”, em que pouco mais faz do que
tecer loas a Gilmar Mendes e ao livro publicado pelo ministro. Escreve:
“Mendes é juiz num país livre que quer continuar livre. Que faça
escola”.
É claro que, com toda essa trajetória de
carinhos recíprocos, a Veja podia contar com Gilmar Mendes quando
precisasse desviar a atenção de si mesma, envolvida como está nas
ligações gravadas do bicheiro Carlinhos Cachoeira, alvo de uma CPI
neste momento. Ao tentarem lavar-se mutuamente, uma mão suja a outra.
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