Macunaíma, o herói sem caráter de Mario de Andrade, disse
que “pouca saúde e muita saúva, os males do Brasil são”. Isso foi em 1928,
quando foi lançado o livro e o personagem.
De lá para cá, as saúvas já não representam mais tanto
perigo, e os males do Brasil são outros.
Da segunda metade do século passado em diante, forças
dominantes apoiadas pela mídia corporativa trataram de desconstruir a imagem
dos políticos brasileiros. Desde Juscelino Kubitschek, tanto Executivo quanto Legislativo
foram alvo de investidas pesadas no sentido de colocar todos no mesmo balaio:
político é ladrão!, repete, insistentemente, o velho jornalismo comprometido
com o atraso. Daí, o golpe militar de 64.
A instituição que parece ter sobrevivido até aqui, foi o
Judiciário. Um ou outro fato pouco relevante, de juízes corruptos, de sentenças
vendidas, foi noticiado sem alarde, com o devido respeito à classe de
magistrados que atuam para garantir o cumprimento da Constituição. A mais alta
corte do país, o Supremo Tribunal Federal, nunca foi alvo de denúncias e suas
resoluções sempre foram respeitadas.
Hoje, entretanto, o STF colocou-se numa posição prá lá de
inconveniente.
O julgamento do “mensalão”, previsto para agosto, pode ser o
marco da derrota da Justiça, seja qual for a decisão. O risco é enorme; a falta
de garantias de que a lei será respeitada pode levar ao colapso o tribunal se
nada for feito.
O processo é político, e cada membro do STF tem sua
preferência partidária. Não podem negar. Ao mesmo tempo, a
isenção deve ser total; a análise de cada um dos processos dos réus deve ser
cuidadosa e baseada, exclusivamente, nas provas produzidas pelo inquérito. É
assim que deve proceder o julgador. Sem pressão e sem pressa.
O alvo da oposição, neste processo, é o ex-Ministro da Casa
Civil José Dirceu. São 36 réus, mas apenas um nome é o que aparece com
frequência na mídia. O operador, o chefe, o articulador. Os demais, os
jornalistas demonstram pouco ou nenhum interesse.
E é ai que está o grande nó: se Dirceu for inocentado, a
oposição e a imprensa reacionária dirão que o governo exerceu pressão sobre os
Juizes. Se, por outro lado, for condenado, o governo dirá que a pressão partiu
da oposição e da manipulação da imprensa corporativa que influenciou os
magistrados.
Não haverá meio termo; a imagem do STF sairá abalada
qualquer que seja a decisão.
O risco de se formar uma divisão clara na sociedade existe,
e nada foi feito pelos Ministros do STF para frear a onda de especulações sobre
o julgamento. Pelo contrário, a exposição de certos membros do Supremo na TV
provoca ainda mais a sensação de comprometimento de quem vai julgar!
Não haverá recurso da decisão; o STF deve refletir com muita
calma sobre as consequências que irão provocar. O resultado não será unânime,
com certeza, e vai gerar ainda mais desconforto para as partes que não
vislumbrarem que foi feita a devida justiça.
A única solução será basear o andamento dos processos nas
provas, nos documentos reais e nas denúncias comprovadas, se é que existem.
Caso contrário, a desmoralização pode ser irremediável.
Ninguém quer Macunaímas vestindo toga!
***
Um dos maiores interessados no julgamento é o próprio
ex-Ministro José Dirceu.
Já declarou inúmeras vezes que aguarda, ansioso, pelo
momento de se defender. Até agora, não obteve sucesso para expor suas
razões à opinião pública, pois os meios de comunicação nunca pretenderam
dar-lhe
espaço.
Dirceu insiste que não há provas de que se montou um esquema
de compra de votos no Planalto para aprovar medidas de interesse do governo
Lula. É tão categórico ao afirmar sua inocência que sua postura incomoda seus
opositores.
Até Roberto Jefferson, que criou o termo "mensalão" já afirmou que nunca existiu o pagamento mensal de propina a deputados.
Quanto ao risco de prescrição dos “crimes”, tão comentado
pela imprensa, é de estranhar que não cobrem a mesma velocidade do STF para
julgar o “mensalão” do PSDB, anterior ao do PT.
Se é lei que exigem, deveriam
ser mais honestos.
***
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