Roma - Sexo e dinheiro sacodem o coração da cidade santa. Uma lista de
grandes pecados espreita a cúria do Vaticano no momento em que o papa
Bento XVI se prepara para renunciar ao seu pontificado. A corrupção
dentro do Vaticano e os casos de pedofilia voltaram ao primeiro plano
com as revelações feitas nas últimas horas pela imprensa italiana.
Segundo o diário La Repubblica, que cita uma fonte vaticana, os detalhes
mais recentes “giram em torno do sétimo mandamento”. Esse mandamento
diz “não roubarás” e é interpretado como uma disciplina de retidão para a
gestão na atividade econômica e na vida social e política. Também se
refere à proteção do próximo. Mas o diário italiano vai muito mais longe
em suas revelações e afirma que o papa decidiu renunciar após ter
tomado conhecimento de que uma rede de padres homossexuais circulava no
Vaticano.
Estas revelações fariam parte do informe que o papa encomendou a três
cardeais no ano passado. Julián Herranz, Jozef Tomko e Salvatore De
Giorgi entregaram em meados do ano passado parte do resultado da
investigação realizada tanto sobre o vazamento de documentos roubados do
papa como sobre a corrupção. La Repubblica publica em sua última edição
uma informação escabrosa: o jornal afirma que, em outubro passado, o
cardeal Julian Herranz, presidente do Pontifício Conselho da Santa Sé
para os Textos Legislativos, evocou ante o papa a existência de uma
“chantagem” exercida desde fora do Vaticano contra padres homossexuais.
O Vaticano negou estas informações. No entanto, este prestigiado jornal
italiano fornece detalhes abundantes assegurando que o informe – dois
volumes de 300 páginas cada – dava perfeitamente conta de uma “rede
transversal dentro do Vaticano unida pela orientação sexual”, ou seja, a
homossexualidade. O jornal escreve textualmente: “pela primeira vez a
palavra homossexualidade foi pronunciado no Pontificado”. Além disso,
revela que o informe da comissão de cardeais aponta para um grupo de
prelados que sofreram pressões por parte de pessoas laicas externas ao
Vaticano. A revelação coincide com o que Ratzinger disse dois dias
depois da entrevista com os cardeais que lhe entregaram o informe. De
forma improvisada, Bento XVI falou dos “maus peixes” que caem na rede da
igreja.
La Repubblica assegura de maneira convicta que foi essa revelação que
levou o papa a renunciar. A mesma publicação conta que a comissão de
cardeais entrevistou dezenas de bispos, cardeais e laicos, obtendo um
relato apavorante sobre o interior do Vaticano: grupos de poder em
disputa, articulados segundo as distintas congregações religiosas ou a
região do mundo a qual pertencem ou as suas preferências sexuais. A
investigação dos cardeais adianta que altas autoridades da Igreja
poderia estar sendo vítimas de “influências externas” por conta de “suas
relações de natureza mundana”. O padre Federico Lombardi, porta-voz do
Vaticano, negou com veemência todas essas informações. Ele chamou essas
revelações de “fantasiosas” e garantiu que muitas delas eram
“simplesmente falsas”.
No entanto, quem conhece parte do que ocorre dentro da Santa Sé diz que a
reportagem do La Repubblica contém dados exatos e verídicos. O jornal
italiano indica que o informe em mãos do papa menciona um escândalo que
remonta ao ano de 2010 e que tem como centro Angelo Balducci . Esse
personagem era, na época, presidente do Conselho Nacional de Obras
Públicas, no período em que Berlusconi estava no poder. Balducci era
objeto de uma investigação judicial quando se descobriu que, para
conseguir os serviços de jovens homossexuais, se relacionava com um
nigeriano, Chinedu Thomas Ehiem, do coral da capela Júlia da Basílica de
São Pedro.
A existência de um lobby gay dentro da Santa Sé provocou um alvoroço
gigantesco no país, aumentando a tormenta que, a medida que se aproxima a
data da renúncia do papa – 28 de fevereiro – se forma sobre o conclave
que deve designar o sucessor de Bento XVI. A polêmica se estabelece
agora sobre uma disjuntiva muito polêmica em torno da presença ou não no
conclave dos cardeais que esconderam os padres pederastas e até os
protegeram. É o caso do cardel Roger Mahony, responsável pela diocese de
Los Angeles e acusado de encobrir ao longo de um quarto de século 129
sacerdotes implicados em abusos de menores. Os outros cardeais
comprometidos com a mesma sujeira são o cardeal primaz da Irlanda, Sean
Brady, e o cardeal belga Godfried Danneels. Estes personagens são os
maiores implicados na proteção que deram aos pederastas apesar de seus
atos criminosos. A lista, porém, é muito mais ampla. Nela entram o
norteamericano Justin Francis Rigali, o australiano George Pell, o
mexicano Norberto Rivera Carrera, o polaco Stanislaw Dziwisz e o
argentino Leonardo Sandri.
Dia após dia, a caixa de Pandora deixa escapar suas piores sombras. Os
demônios que a cúria escondeu durante tantas décadas passeiam à noite
como espectros ressuscitados pela Praça São Pedro de Roma: corrupção,
sexo e dinheiro, uma trilogia explosiva que ninguém poderia imaginar
instalada na cúpula da Santa Sé. A Igreja vive, sem dúvida, seu pior
momento. As guerras entre a cúria, a disputa por dinheiro e poder, a
pederastia tardiamente reconhecida e sancionada deixaram órfãos de
autoridade moral e terrena a milhões e milhões de fiéis em todo o mundo.
Em sua profunda fé eles são, também, vítimas da explosão da Igreja
Católica.
Eduardo FebbroTradução: Katarina Peixoto
No Carta Maior
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