A ex-senadora transpôs as barreiras sociais. Caiu, porém, nas velhas armadilhas
por Mauricio Dias
Marina silva, ex-senadora (PT) e candidata (PV) à Presidência da
República em 2010, obteve votação surpreendente e retumbante.
Projetou-se com mais de 19 milhões de votos, expressando 19,33% do total
de válidos no primeiro turno.
Foi uma vitória quase individual. Ela obteve apoio financeiro, mas não
fez concessões às alianças partidárias. No segundo turno, manteve o
individualismo. Adotou a solução “nem, nem”: nem Dilma, nem Serra.
Voltou à cena, posteriormente, com a proposta de fundar um partido dela,
o Rede Sustentabilidade. Perdeu, porém, o prazo de registro na Justiça
Eleitoral e a chance de disputar a eleição em 2014 cavalgando um
puro-sangue. Sem a contaminação dos partidos apelidados por ela de
“tradicionais”.
Após isso, tomou outra decisão solitária. Deixou o PV e filiou-se ao
PSB, partido tradicionalíssimo, presidido pelo governador Eduardo Campos
(PE), político também tradicional.
Contradição? Marina foi, por cinco anos, ministra do Meio
Ambiente do governo Lula. Não chutou o balde quando surgiu a história do
“mensalão”. Saiu do cargo e do PT por outras razões. Ela continua em
cena. A mais recente pesquisa Datafolha indica: se a eleição fosse hoje,
só a presença de Marina Silva abriria possibilidade de haver segundo
turno. Vale entender Marina com um olho na origem social dela. A
ex-senadora encarna o papel de vencedora. Veio do fundo da sociedade. Na
infância e na juventude, viveu em palafitas. Saltou as difíceis
barreiras sociais. Caiu, porém, na velha armadilha.
O emergente, sem noção do mundo em que vive, no qual a ascensão de
alguns sugere falsamente a ascensão de todos, olha o espelho e se vê com
orgulho. Não raramente, porém, apedreja a mão que ajuda, como diz em
verso célebre Augusto dos Anjos. Na história da valente Marina Silva
alguns episódios refletem isso.
Em 1992, foi diagnosticada como portadora de mercúrio no sangue,
doença rara que a levaria à morte. Esse diagnóstico só foi dado a partir
da perícia médica de David Capistrano Filho, que sugeriu exames na raiz
do cabelo de Marina. Ela morava em Rio Branco (AC) e era deputada
estadual do PT. Não podia, portanto, ser tratada na rede pública de
Santos (SP), então governada por Telma de Souza.
Capistrano era o secretário municipal de Saúde. Veio deste a ordem para o
tratamento dela. Apoiou-se no que acreditava, como disse, e botou “a
legalidade burguesa na lata do lixo”. Capistrano morreu em 2000, sem
ouvir o obrigado de Marina.
Em 1994, foi eleita senadora. Em 1995, já empossada, solicitou aos
petistas José Genoino e José Dirceu interferência junto a Antonio Carlos
Magalhães, presidente do Senado. Buscava autorização para a Casa
custear o tratamento dela nos EUA. Os dois foram a ACM e, imediatamente,
ele pediu o parecer dos assessores. O parecer foi negativo. O Senado
não poderia arcar com tratamento de doença existente antes da posse. No
entanto, autorizou. Arcou com o risco de processo por improbidade
administrativa. Ela se tratou no Massachusetts Hospital.
ACM, a exemplo de David Capistrano, morreu sem ouvir o obrigado de Marina.
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