quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

São Paulo: a locomotiva do atraso



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Arapongagem na USP: Victoria Benevides, “isso só acontece em estado de exceção”
A edição de janeiro da revista Fórum trouxe uma denúncia sobre um esquema de arapongagem estruturado para investigar professores, movimentos estudantis e trabalhadores na USP. Para a socióloga e professora titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, Maria Victoria Benevides, o sistema de espionagem fere o espaço estudantil e só faria sentido em um contexto de estado de exceção.
A professora comenta também que não compreende como a universidade não se manifesta diante da tamanha gravidade que traz a denúncia da reportagem. “Me espanta profundamente a falta de posição mais democrática dos órgãos da USP, das autoridades competentes da universidade. Eu me aposento neste semestre, estou afastada das atividades da universidade, mas, pelo que sei de colegas e pelo que recebo pela internet de informação, fico indignada de ver que eles não se manifestam, nem que seja para negar”, critica a professora.
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O Aniversário de São Paulo e uma Elegia para o Pinheirinho

Hoje, a capital bandeirante completa 458 anos de existência. Se há um ano já era questão de nos perguntarmos se realmente havia o que comemorar, hoje, a mesma indagação se impõe: a principal universidade da cidade - e, por sinal, do país - está sob cerco policial e o mesmo vale para parte do seu centro, enquanto problemas grassam por toda parte. Enquanto isso, menos de cem quilômetros à leste, na pujante São José dos Campos, o impacto da desocupação violentíssima e ilegal da favela do Pinheirinho ainda é assunto recorrente, haja vista que seus moradores ainda estão amontoados em abrigos improvisados, identificados com inconfundíveis pulseiras azuis. O retrato disso é o centro de São Paulo tomado por manifestantes hoje.

O potente estado construído em torno do aniversariante do dia - que apesar de não ser o município mais antigo desta unidade federada, é a causa de sua existência como tal - convulsiona. E ainda que se argumente, com razão, da torpeza de seu prefeito, Gilberto Kassab, e de tantos outros escroques pelo estado adentro, como Eduardo Cury prefeito de São José dos Campos, existe uma teia que transcende aos esquemas municipais e se funda no Palácio dos Bandeirantes: é de lá, sob a égide do catolicismo conservador que o pacato Geraldo Alckmin, sem muito rumo ou prumo, articula uma rede que passa por uma assembleia legislativa inerte, um tribunal de justiça punitivista e elitista, um ministério público estadual delirante e polícias que matam no atacado.
Nem sempre foi assim. O estado de São Paulo de cem anos atrás tinha outra tônica. A chegada em massa de imigrantes do mundo todo produzia uma explosão de cores e sons, quase apagando o legado de estagnação causado por uma elite rançosa, herdeira de implacáveis colonizadores. Aquele bom encontro de um século produziu as greves anarquistas, a Semana de Arte Moderna, mas a velha São Paulo jamais deixou de mostrar a sua cara: essa elite que amava Mussolini e odiava Getúlio nos anos 30 - o que sugere que não gostava do último por suas virtudes - soube manejar uma geração inteira de jovens intelectualizados contra o autoritarismo do então ditador para, de um golpe só, fazer voltar a República Velha em 1932, o que marca um corte histórico importantíssimo.

O ardil de 32 - isto é, a exploração ideológica e meramente oportunista da ditadura Vargas - construiu um processo que ajuda a detonar o trágico 1º de Abril de 64 e que só vai encontrar uma barreira quando, ironicamente, ocorre o martírio de um judeu: a cerimônia ecumênica pela memória de Vlado Herzog na Praça da Sé é o começo do fim da ditadura e deu em um vendaval que vai até 1992, tendo em seu interior as greves do Grande ABC e a eleição de uma mulher nordestina como prefeita de São Paulo. Muito da redemocratização passa por ali, mas a reação não tarda e engole a esquerda em plano ano da desmoralização nacional da direita com o impeachment de Collor, Maluf derrota Suplicy na capital e reafirma o pior que havia da ditadura em plena São Paulo dos anos 90.

Dali em diante, tivemos o malufismo em São Paulo - brevemente interrompido por Marta Suplicy -, a ascensão do tecnocratismo tucano em escala estadual que rapidamente termina no colo do conservadorismo católico - precisamente no de um direitista orgânico chamado Geraldo Alckmin - e duas campanhas presidenciais, ambas histéricas e assustadoras, que partem de São Paulo e chocam-se com o projeto social-desenvolvimentista de Lula - não falo tanto do Serra de 2002, mas daquele de 2010 assim como do Alckmin de 2006. Muito pode se falar do que resultou nisso. Os problemas internos da esquerda - sobretudo do PT -, a incompreensão ao pós-industrialismo, da forma de luta ou de certo desprezo pela política estadual, mas o fato é que essa conjugação de fatores nos leva à presente situação.

E o Pinheirinho é paradigmático. Não, nenhuma favela "pegou fogo" misteriosamente, não nenhuma ação foi feita com ar de legitimidade: sem ordem judicial alguma - e meio a um conflito de competência entre a Justiça Estadual e a Justiça Federal -
a tropa de choque paulista tratorou uma comunidade com quase dez mil habitantes, deixando seus moradores desabrigados e marcados com inconfundíveis pulseiras azuis - o que com ou sem ordem judicial é um grave ofensa ao dito "estado de direito". Algo muito sério se rompeu aqui de uma só vez, surpreendendo partidos, movimentos sociais e a imprensa global - e a nossa também, mas graças ao lado que ela ocupa nessa luta, ela passa a agir de forma omissiva na cobertura, como captou bem o artigo do Guardian a respeito.


A posição do governo federal é curiosa. Sim, ele atuou relativamente bem nas negociações, buscando adquirir a área e, assim, resolver o problema, mas terminou recebendo uma rasteira de Alckmin com a invasão. Um secretário da Presidência chegou a ser baleado na invasão da polícia. Mas fora declarações vagas, não houve nenhuma pressão concreta para reverter a situação. Tanto, que o PSDB se sentiu confortável para soltar uma nota responsabilizando o PT pela tragédia no Pinheirinho (?!). Dilma veio para São Paulo onde, a pouco foi laureada por Kassab, mas não se encontrou com Alckmin, que sequer compareceu à missa de aniversário da cidade - e o candidato petista para a Prefeitura, Fernando Haddad, não apareceu junto de Kassab, retratando o confronto aberto entre parte do PT nacional, que quer enfiar goela abaixo um vice do PSD kassabista em sua chapa, e o seu desejo e o do PT de São Paulo, que querem se ver longe o kassabismo.

Entre a radicalização à direita do PSDB e as ambiguidades - e desencontros - petistas, somado a um grande meio campo fisiológico e preocupado apenas com seus interesses eleitorais - vide Kassab, que transita sem problemas de lado a lado do espectro político nacional -, a democracia no país sangra. Agora é hora de movimento e ação. Supondo que partidos políticos servem para algo, ele é que estão - ou deviam estar - em função de nós, não o contrário. E o ovo da serpente que está sendo chocado precisa ser destruído antes que ecloda.
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