A
situação no Oriente Médio aproxima-se rapidamente do ponto crítico e o
início do conflito já aparece nas cartas. Isso, em resumo, foi o que
disse Nikolai Patrushev, secretário do Conselho de Segurança Nacional da
Rússia (e ex-diretor do FSB, a organização que sucedeu a KGB) em
entrevista à imprensa russa.
Patrushev é, sem dúvida, figura chave do establishment
político e das relações internacionais russas. Ninguém duvida de que
falou bem refletidamente, com o objetivo de enunciar a profunda
ansiedade do Kremlin, ante a evidência de que o mundo está a poucos
passos de uma conflagração no Oriente Médio, de consequências
imprevisíveis no plano da segurança regional e internacional e da
política mundial.
Patrushev,
claro, tem acesso a inteligência de alto nível e falou baseado em dados
que estão jorrando dos satélites e dos espiões e diplomatas russos. O
Kremlin disparou um sinal de alerta.
As entrevistas foram dadas em idioma russo. Posso, portanto, reproduzir passagens. Patrushev disse:
“Há informações de que membros da OTAN e de alguns estados árabes do Golfo Persa, agindo pelo cenário que se viu na Líbia, trabalham para transformar a atual interferência nas questões internas da Síria em intervenção militar direta”.
Foi específico.
“As principais forças de ataque não serão francesas, nem britânicas nem italianas, mas, provavelmente, turcas”.
Disse
que o primeiro passo será criar uma zona aérea de exclusão sobre a
Síria, para criar um santuário em território sírio próximo da fronteira
turca, para entrada de mercenários que possam ser apresentados como
rebeldes sírios. Em resumo, é intervenção ocidental ao estilo “líbio”; e
conduzida pela Turquia.
Patrushev
disse que a escalada militar alcançará provavelmente também o Irã e há
“real perigo” de ataque pelos EUA, destacando que tensões sobre a Síria,
hoje, são, de fato, tensões relacionadas à questão iraniana. “Querem castigar Damasco, menos pela repressão à oposição e, mais, por a Síria ter-se recusado a romper relações com Teerã”.
Sobre a situação iraniana, Patrushev disse:
“Já se veem sinais de escalada militar no conflito, e Israel está empurrando os americanos para a guerra. Há perigo real de um ataque militar norte-americano contra o Irã. Nesse momento, os EUA veem o Irã como seu principal problema. Querem converter o Irã, de inimigo, em parceiro apoiador; e, para conseguir isso, o plano é mudar o atual regime, pelos meios necessários”.
E qual será a provável resposta dos iranianos? Patrushev avalia:
“Não se pode descartar que os iranianos sejam capazes de cumprir suas ameaças de suspender exportações do óleo saudita pelo Estreito de Ormuz [1], se sofrerem ataque militar direto”.
Patrushev também falou sobre as políticas dos EUA para Rússia, China e Índia.
Disse que os EUA estão “persistentemente buscando manter sua dominação econômica, política e militar no mundo”. Põe sob essa luz a instalação dos sistemas de mísseis antibalísticos dos EUA na Europa.
”Hoje, [a instalação dos mísseis antibalísticos] talvez não seja grave ameaça à Rússia, mas o objetivo daquela ação, no longo prazo, é reduzir nosso potencial estratégico. Pelo que sei, os planos para uma barreira global de mísseis de defesa norte-americanos também estão sendo negativamente avaliados em Pequim.”
“Apesar das mudanças radicais no alinhamento global de forças, como resultado da modernização, os EUA insistem em manter sua dominação econômica, política e militar em todo o mundo. No presente, é importante para os EUA eliminar o que veem como ameaças a essa dominação – e ameaças que vêm da China, como creem os EUA”. (...)
Como
“amigo de muito tempo” da Índia, Patrushev, evidentemente, não falaria
contra a abordagem dos indianos e as atitudes de “sedução” de Tio Sam.
Em vez disso, falou da “vizinhança estendida” da Índia:
“Simultaneamente, os EUA buscam acesso direto aos recursos e às facilidades de transporte na vasta área do Cáucaso, do Cáspio e da Ásia Central. Há inúmeras declarações de políticos norte-americanos sobre a necessidade de pôr sob controle dos EUA a energia, a água e outros recursos da Rússia”.
Mas, apesar de tudo, Patrushev não ignorou a importância que Moscou dá às relações Rússia-EUA, porque “os EUA são líderes do mundo ocidental e, faça a OTAN o que fizer, as estratégias da OTAN são sempre modeladas em Washington”.
Além disso, “Nossos
países [Rússia e EUA] têm vários e importantes interesses coincidentes
em matéria de segurança. Por exemplo, estamos combatendo juntos contra o
terrorismo, dentre outras coisas, ao tornar acessível a rota do norte,
para atender as necessidades das forças dos EUA no Afeganistão; estamos
enfrentando juntos o crime organizado e o comércio ilegal de armas,
narcóticos e substâncias psicotrópicas, e cooperamos também na luta para
manter a segurança das informações” – concluiu Patrushev, com boa dose do humor russo, ao acentuar o caráter profundíssimo da atual “parceria” entre Rússia e EUA.
Nota dos tradutores
[1] Sobre isso, ver 8/1/2012, “Geopolítica do Estreito de Ormuz: Marinha dos EUA pode ser derrotada pelo Irã no Golfo Persa?”, Mahdi Darius Nazemroaya, Global Research.
MK Bhadrakumar
foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou
serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha,
Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em
questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e
segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia
Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran
(1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de
Kerala.
Indian Punchline
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu
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