Os indícios e o pau que dá em Chico
Do Direto da Redação - Publicado em 14/10/2012
Rodolpho Motta Lima*
As eleições que estão em curso entre nós permitem diversas análises
e, para usar a palavra da moda, fornecem indícios bastante
significativos. O primeiro deles parte das expectativas dos direitistas
de plantão de que o julgamento do “mensalão" – estrategicamente
colocado, com requintes cirúrgicos, no meio do processo eleitoral –
levaria à derrocada das forças políticas de esquerda, convenientemente
confundidas com a corrupção. Afinal, há robustos indícios de que os
elitistas de sempre, com uma mãozinha do STF, tenham imaginado pôr fim a
tantos projetos de inclusão social, com tanta gente saindo da pobreza,
tantas pessoas comendo e estudando mais e (pasmem !) até poluindo os
aeroportos do país...
Mas as urnas acabaram fornecendo outros indícios. Um deles: o de que o
povo brasileiro parece estar aprendendo a ler nas entrelinhas e não
aceita as falsas generalizações que buscam fabricar uma verdade
conveniente. Com toda a propaganda antigovernista que o “mensalão”
permitiu – em fragrante agressão ao rigor que usualmente cerca o período
eleitoral – amplificada por uma mídia comprometida que controla a
comunicação no país, o resultado das eleições mostra que os programas
das esquerdas, uma vez mais, obtiveram a aprovação popular. O partido
com maior número de votos foi o da Presidenta Dilma e o do ex-Presidente
Lula, os partidos que mais perderam foram, até aqui, as agremiações
neoliberais de direita, sendo que o DEM, em breve, ao tudo indica – vai
despedir-se do cenário político, sem pompas e circunstâncias...
Todo o processo eleitoral deixou, assim, claros indícios de
manipulação por parte dos órgãos de comunicação (esses, que vivem às
custas de concessões governamentais e gordíssimas verbas de propaganda
oficial que, um dia, esperamos, venham a ser extintas ou destinadas aos
interesses do povo). A pauta da mídia hegemônica, capitaneada por
segmentos da elite e alicerçada em comprometidos analistas políticos,
esmerou-se em estabelecer a ideia de que , nas eleições, se estaria
julgando Lula e, por tabela, o governo Dilma. Agora, como os resultados
não foram os esperados, levantam a tese de que eleições municipais não
se vinculam ao cenário federal, constituindo apenas uma radiografia de
situações regionais específicas. É engraçado verificar as contradições
malandras nessa teses todas, porque é nítida a atual intenção de
glorificar nacionalmente o tucano Aécio e o político pernambucano
Eduardo Campos, até apelidado de “noiva da vez” por essa imprensa
traiçoeira.
Há indícios, sim, que as eleições repercutem o cenário maior da
política nacional. Isso é inegável, por exemplo, em São Paulo, onde
teremos o embate entre um político novo no cenário – cujas causas são
totalmente opostas às do vetusto Serra que, pelo que se pode perceber,
corre o risco de um inglório fim. Nítida influência de Lula, dizem agora
os mesmos que esperavam o ocaso do“partido do mensalão e seu chefe”.
Haddad, para essa turma, agora é um “novo poste”guindado à política
pelas artes do ex-Presidente. Mas há indícios de que esse poste pretende
iluminar a mesma estrada onde já brilha um outro, que o lulismo também
“inventou”, e que hoje tem mais de 70% de aprovação popular...
Voltando ao “mensalão”, e obedecendo ao “script” que o quis vincular
ao processo eleitoral, há marcantes indícios de que tudo isso vai acabar
constituindo um autêntico tiro no pé daqueles que hoje enchem as
páginas dos jornais e os noticiários globais. Com repercussões
eleitorais, sim, mas não para agora, e sim para daqui a dois anos...
Afinal, o que se espera a partir de agora é que esse mesmo tribunal que
tanto se esmerou em buscar argumentos para condenar por indícios,
continue a sua “cruzada pela ética”. Espera-se, assim, que, por justiça,
se utilizem da mesma jurisprudência para investigar e punir com igual
rigor os outros mensaleiros – os do PSDB de Minas -, a turma do Arruda
em Brasília, os marginais da cachoeira do Demóstenes e, por que não,
eventuais piratas da privatização... Se isso não acontecer, teremos
alarmantes indícios de incoerência da justiça maior em face da política
menor dos interesses dos ricos e do mercado. E aí, das duas uma: ou
ficará definitivamente desmascarada essa “aura”de retidão de que os
vestais demotucanos pretendem cercar-se, ou ficarão claros os objetivos
estratégicos do atual justiçamento, com suas perigosas teses de
condenação por “fortes indícios” (confundidos com provas cabais), a
propalada “teoria do domínio do fato” e a atribuição do “ônus da prova
por conta do acusado”.
Não resisto a uma citação de versos que têm sido erroneamente
atribuídos a Bertolt Brecht, mas cuja discussão sobre autoria e exata
tradução é pouco importante diante da inquietação que provocam:
“Primeiro levaram os comunistas, / Mas eu não me importei / Porque não era nada comigo./ Em
seguida levaram alguns operários, / Mas a mim não me afetou / Porque eu
não sou operário. / Depois prenderam os sindicalistas, / Mas eu não me
incomodei / Porque nunca fui sindicalista. / Logo a seguir chegou a vez /
De alguns padres, mas como / Nunca fui religioso, também não liguei. /
Agora levaram-me a mim / E quando percebi, / Já era tarde. “
Se, contudo, houver alguém que não entenda o porquê da citação, posso
trocar os versos por um delicioso ditado popular, em reverência ao
saber do povo: “O pau que dá em Chico dá em Francisco”...
*Rodolpho Motta Lima. Advogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil)
e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado
pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de
Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente
no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.
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