As elites já temem efeito no ordenamento jurídico do país dos
excessos no julgamento da Ação 470. Não é para menos. O rol de
barbaridades cometidas com a nossa Constituição põe a perigo garantias
individuais. E a principal vítima, foi princípio da “presunção da
inocência”. Agora, perante o STF, são todos culpados, sem provas em
contrário.
Talvez seja por isso que os barões da mídia, através da Folha de São
Paulo, Valor Econômico e O Globo, começaram a reconhecer excessos
cometidos pelo seu “herói”, o ministro Joaquim Barbosa, na dosimetria
das penas dos réus do dito “mensalão petista” (outros, mensalões, como o
do PSDB e o do DEM um dia, quem sabe, podem baixar naquela Corte).
Começa assim o editorial “Para quem precisa”, publicado no dia 25/10
na Folha: “Penas de prisão deveriam, em tese, caber a criminosos
violentos, para os demais, como no mensalão, conviriam severas penas
alternativas”. Mas à frente, novo alerta: “As punições hão de ser
drásticas, e seu efeito, exemplar, mas sem a predisposição vingadora que
parece governar certas decisões (e equívocos) do ministro Joaquim
Barbosa”.
Na mesma linha, e o dia seguinte (26/10), matéria do Valor, com o
título “Pena de Valério é maior que de Chico Picadinho”, alerta o
Supremo Tribunal Federal para os exageros cometidos no julgamento do
“mensalão”, ressaltando que a punição ao publicitário Marcos Valério
equivale àquelas de criminosos que cometeram crimes hediondos como
“Suzane von Richthofen, condenada a 39 anos de prisão por planejar o
assassinato de seus pais a pauladas em 2002, enquanto dormiam, e do
famigerado Chico Picadinho, condenado a 30 anos de prisão pelo homicídio
e esquartejamento de duas mulheres nas décadas de 60 e 70”.
Finalmente, em O Globo 27/10, Merval Pereira, escreve em sua coluna o artigo: “O Voluntarismo de Barbosa” (http://migre.me/bnkL8), em que critica a sanha condenatória do ministro. “Quando ele
(Barbosa) critica nosso sistema penal e se põe claramente a favor de
penas mais duras, dá margem a que acusados vejam nele um carrasco e não
um juiz”.
Ficção e realidade
Um dos diálogos que compõe uma das cenas do filme “A Casa dos
Espíritos”, de Isabel Allende, expõe parte do temor das elites, de perda
do controle sobre os verdugos. Na cena o ator Jeromy Irons interpreta o
senador Esteban Trueba. A conversa se dá na sede do Ministério da
Justiça, entre Esteban e um coronel nos primeiros dias da ditadura de
Augusto Pinochet. Esteban é um rico proprietário de terras, senador pelo
Partido Conservador, ele apoiou o golpe, mas foi supreendido com a
prisão da filha, Blanca Trueba (Winona Ryder), por seu romance com o
líder de esquerda, Pedro Segundo (Antônio Banderas).
Por que minha filha foi presa ontem a noite?
- Responda! Onde está minha filha?
- Dê-me a chave do seu carro.
- Fechamos o Congresso. Fim dos privilégios dos congressistas.
- Vocês estão todos loucos!
- Quem acha que estabeleceu contatos com seus generais?
- Quem estabeleceu o elo com os americanos?
- Que dinheiro e reputação garantiu armas para vocês?
- Sabe quem sou eu?
- E você prende minha filha… e quer confiscar o meu carro?
- Quero falar com o ministro.
- Fale comigo.
- O ministro!
- Não há mais ministro!
- Agora você fala comigo.
- Entendeu?
- Quer encontrar sua filha?
- Preencha o formulário.
- Você e seus amigos ainda têm o poder econômico.
- Mas nós governamos o país.
- Agora… dê-me a chave do carro.
As elites do Chile que apoiaram o golpe contra o presidente Salvador Allende em 11 de setembro de 1973 talvez não acreditassem que o regime de Pinochet fizesse da brutalidade sua regra de governo. Números oficiais dão conta de 60 mil vítimas do regime, sendo 3.227 mortos. No Brasil as elites abriram a caixa de Pandora nove anos antes, em 1964. As consequências ainda estão em discussão através da Comissão da Verdade. A tortura ainda persiste como regra em nosso sistema policial e os números da violência em São Paulo demonstraram a falência da Polícia Militar (outra herança da ditadura), no combate à criminalidade.
Mas, tal e qual o persongem Esteban Trueba, do romance de Isabel
Allende, o que espanta mesmo as elites é a possibilidade de que um de
seus filhos seja vítima do monstro que soltaram nas ruas para reprimir a
plebe.
Já pensou o STF pega gosto, e com apoio da opinião publica, engata
uma quinta marcha e faz os personagens da “Lista de Furnas”, aqueles
citados no livro “Privataria Tucana”, de Amaury Júnior, e também os
envolvidos no “Mensalão do PSDB” e no “Mensalão do DEM”, passarem uma
temporada no xilindró?
Por Marcus Vinícius
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