Mauricio Dias, CartaCapital
Desde 1996, Marcus Figueiredo investiga os processos eleitorais a partir da cobertura feita pelos jornais Folha de S.Paulo, O Globo e O Estado de S. Paulo.
Nesse período, Figueiredo, agora coordenador do Instituto de Estudos
Sociais e Políticos (Iesp) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(Uerj), reuniu evidências sólidas para poder afirmar com segurança: “Há
certa resistência, da parte dos jornalistas, em admitir a legitimidade
da análise de mídia. Os próprios meios dedicam pouco espaço ao tema”.
Há poucos dias, no entanto, o veterano jornalista Merval Pereira, de O Globo, quebrou essa regra não escrita e se dedicou ao tema. Saiu em defesa da revista Veja, envolvida com questões do receituário da CPI.
“O relacionamento de jornalistas da revista Veja com o bicheiro Carlinhos Cachoeira e seus asseclas nada tem de ilícito”, assegurou Merval.
Essa afirmação vigorosa se sustenta em bases frágeis. Merval enalteceu o
“jornalismo investigativo” praticado na revista. Veja, no entanto, foi
parceira de um jogo criminoso. Aliou-se a um contraventor e, no afã de
denunciar escândalos, criou escandalosamente um deles. Cachoeira oferecia a munição e Veja atirava.
No futuro, esse episódio e outros deverão ser objeto de estudo acadêmico possivelmente sob o título de “O caso Veja”. Melhor seria abandonar o formalismo acadêmico e chegar a um título mais adequado à tese “Veja é um caso sério”.
Não é a primeira vez que a revista sapateia sobre as regras do
jornalismo. Mais do que isso. Frequentemente, ela sai do jogo e -adota o
vale-tudo.
Em 2006, por exemplo, Veja foi protagonista de um episódio
inédito no jornalismo mundial, ao acusar o então presidente Lula de ter
conta no exterior. Na mesma reportagem, no entanto, confessa não ter
conseguido comprovar a veracidade do documento usado para fazer
sustentar o que denunciava. Só o vale-tudo admite acusação sem provas.
A imprensa brasileira, particularmente, tem assombrosos erros
históricos. Um prontuário que inclui, entre outros, a participação na
pressão que levou Vargas ao suicídio, em 1954, e quando se tornou porta-voz do movimento de deposição de Jango, em 1964.
A ascensão de um operário ao poder é outro marco divisório da imprensa
brasileira. A eleição de Lula acirrou os ânimos dos “barões da mídia”. O
noticiário passou a se sustentar, primeiramente, nas divergências
políticas e, depois, mas não menos importante, no preconceito de classe.
A imprensa adotou o que Marcus Figueiredo chama de “discurso ético de
autoqualificação diante dos leitores”.
No exercício diário, semanal ou semestral, porém, essa propaganda se esfuma. Figueiredo fez um flagrante em 2006:
“(…) o que vimos são diferenças no tratamento conferido aos
candidatos, de amplificação de certos temas negativamente associados a
Lula, contraposto à benevolência no tratamento de temas espinhosos
relacionados aos seus adversários”.
É possível recolher na história das redações inúmeros exemplos de
desvios éticos provocados pela busca da informação exclusiva. Mas tudo,
em geral, provocado pelo afã de profissionais em busca do “furo”
sensacional.
Essa prática se mantém, mas sustentada muitas vezes em parceria criminosa e não em investigação jornalística.
Certas reportagens de Veja nos põem diante de um caso assim. A informação chega à redação de mãos beijadas. No caso, as mãos de Carlinhos Cachoeira.
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