Mensalão só foi denunciado ao STF porque Lula não interferiu
Se você anda espalhando por aí que acredita nessa denúncia de Gilmar
Mendes contra Lula que a revista Veja publicou, ou é estúpido ou não tem
um pingo de caráter. É possível a qualquer pessoa, mesmo não sendo
muito inteligente, concluir, sem a menor sombra de dúvida, que tal
denúncia não faz o menor sentido.
Lula foi acusado de tentar interferir no andamento do inquérito do
mensalão propondo um escambo ao magistrado: ele postergaria o julgamento
até depois das eleições em troca de indulgência da CPI do Cachoeira em
relação a supostas evidências de seu envolvimento com Demóstenes Torres e
Carlos Cachoeira.
Gilmar foi Advogado-Geral da União do Governo Fernando Henrique Cardoso.
No último ano de seu mandato, FHC o indicou para ministro do Supremo
Tribunal Federal. Naquele momento, o professor da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo Dalmo de Abreu Dallari teve um artigo
publicado na Folha de São Paulo em que declarou o seguinte sobre tal
indicação:
Se essa indicação
(de Gilmar Mendes) vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em
afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no
Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional.
(…) o nome indicado está longe de preencher os requisitos necessários
para que alguém seja membro da mais alta corte do país.
Gilmar tentou processar criminalmente o jurista Dallari por esse artigo,
mas a Justiça recusou a instauração da ação penal que o agora ministro
do STF pretendia mover. Dizia a sentença: “A
crítica, como expressão de opinião, é a servidão que há de suportar (…)
quem se encontrar catalogado no rol das figuras importantes”
A previsão de Dallari se faria sentir cerca de seis anos após a nomeação
de Gilmar. Em 2008, o magistrado concedeu habeas-corpus ao banqueiro
Daniel Dantas. No mesmo dia, 42 procuradores da República, 134 juízes
federais e a Associação de Delegados da Polícia Federal (ADPF)
divulgaram documentos manifestando indignação com a soltura do
banqueiro.
Alguns Procuradores Regionais da República estudaram até fazer um
abaixo-assinado solicitando o impeachment de Gilmar. O senador
Demóstenes Torres, então, já exibia suas relações com ele: classificou
esse movimento dos Procuradores Regionais da República como “ridículo”.
Esses são apenas alguns fatos que deveriam ser considerados antes de
pessoas subdotadas intelectualmente ou moralmente comprarem a acusação
de Gilmar a Lula sem o menor questionamento, mas não são o cerne da
questão. Servem apenas para lembrar quem é o sujeito que acusa o
presidente mais querido da história do Brasil.
O cerne da questão é que os oito anos de mandato de Lula provam que ele
jamais interferiu na Justiça com nenhum fim, muito menos para impedir o
progresso do inquérito do mensalão. Venho dizendo isso desde 2010,
quando publiquei um post contendo informação que desmonta completamente a tese de Gilmar sobre o ex-presidente.
Lula nomeou três procuradores-gerais da República enquanto que FHC
manteve o mesmo, Geraldo Brindeiro, de 1995 a 2002, contrariando o
Ministério Público Federal por oito anos seguidos.
Claudio Fonteles, que hoje integra a Comissão da Verdade, foi indicado
por Lula em 2003 e ficou no cargo até 2005, quando o nome indicado pelo
MP foi acatado por Lula novamente. Antonio Fernando de Souza denunciou o
mensalão e foi reconduzido por Lula ao cargo. Ficou até 2009, quando
Roberto Gurgel, o novo escolhido pelo MP, foi nomeado. O mesmo Gurgel
que recentemente difamou o partido do ex-presidente na tevê.
Lula tinha o poder. Se não interferiu nem no Judiciário nem no
Ministério Público naquela época, se não há uma só denúncia de outro
ministro do STF de que tenha sofrido qualquer pressão do ex-presidente,
por que ele escolheria começar a fazê-lo justo com Gilmar Mendes, que
tantas vezes se mostrou um adversário político?
A história não se sustentaria só por isso, mas há mais. Nelson Jobim,
ex-ministro do Supremo e ministro da Defesa de Lula e Dilma, saiu do
governo dela descontente porque foi demitido por declarar publicamente
que votou em seu adversário José Serra em 2010. Esse mesmo Jobim
desmentiu a acusação de Gilmar a Lula.
É desolador o volume de desonestidade ou burrice que vêm sendo
espargidas com ímpeto tão infatigável. Tudo isso produz uma reflexão:
será possível que tanta canalhice venha a vingar? Até quando o Brasil
será esbofeteado dessa forma? Em que tipo de país mentiras tão
grosseiras ganham tal dimensão?
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