No O Broguero
por Leandro Fortes — da Carta Capital
Acuadas pela blogosfera, embora protegidas pelas empresas de comunicação
coirmãs, as Organizações Globo, quem diria, vivem dias de vidraça
Enquanto ainda alimenta a fantasia das “manifestações pacíficas” que
cobriu, covardemente, do alto dos prédios das cidades, com repórteres
postados como atiradores de(a) elite, a Rede Globo se vê, finalmente,
diante de uma circunstância que não consegue dominar, manipular e, ao
que parece, nem mesmo entender. Aliás, que jamais irá entender, porque
se tornou uma instituição não apenas descolada da realidade, mas também
do tempo em que vive. Ela e a maior parte dos profissionais que nela
trabalham, estes que acreditam ter chegado ao topo da profissão de
jornalista quando, na verdade, estão, desde muito tempo, vinculados ao
que há de mais obsoleto, atrasado e cafona dentro do jornalismo
nacional.
O poder da blogosfera progressista e de esquerda, que tanto incomoda,
portanto, a conservadores e direitistas (partindo do pressuposto
otimista de que há eventual separação entre eles), lançou-se numa
organizada empreitada de apuração jornalística que fez a gigante
platinada do Jardim Botânico tremer nas bases e, mais de uma vez,
colocar pelo menos um dos joelhos no chão.
A partir de um superfuro do jornalista Miguel do Rosário, do site O
Cafezinho, estabeleceu-se na blogosfera uma correia de transmissão
informal, mas visceralmente interconectada, sobre o megaesquema de
sonegação fiscal montado pelas Organizações Globo que resultou, em 2006,
numa cobrança superior a 600 milhões de reais — 183 milhões de imposto
devido, 157 milhões de juros e 274 milhões de multa. Foi resultado do
Processo Administrativo Fiscal de número 18471.000858/2006-97, sob
responsabilidade do auditor Alberto Sodré Zile. Como o auditor constatou
crime contra a ordem tributária, abriu a Representação Fiscal para Fins
Penais sob o número 18471.001126/2006-14.
Na sequência, outros três dos mais ativos blogueiros do País, os
jornalistas Luiz Carlos Azenha, Rodrigo Vianna e Fernando Brito,
respectivamente, do Viomundo, O Escrevinhador e do Tijolaço,
estabeleceram uma sequência formidável de fatos que deram um corpo
sólido à história levantada por O Cafezinho:
1) A multa da Receita, de mais de 600 milhões de reais (1 bilhão de
reais, em valores atualizados), de 2006, é referente a sonegação fiscal
praticada na compra, pela TV Globo, dos direitos de transmissão da Copa
de 2002. Envolve, ainda, ligações com dois criminosos internacionalmente
conhecidos: João Havelange, ex-presidente da FIFA, e Ricardo Teixeira,
ex-presidente da CBF.
2) Em 2007, uma funcionária da Receita Federal, Cristina Maris Meinick
Ribeiro, foi denunciada pelo Ministério Público Federal por ter dado
sumiço no processo contra a Globopar, controladora das Organizações
Globo, por sonegação fiscal.
3) Como não poderia deixar de ser nesses casos, o ministro Gilmar
Mendes, do Supremo Tribunal Federal, deu sua contribuição às trevas: foi
ele que relatou o habeas corpus que soltou a funcionária da Receita,
depois da ação de CINCO advogados junto ao STF.
Sempre tão poderosa e segura de seus privilégios, as Organizações Globo
entraram nessa briga mais ou menos como Anderson Silva diante de Chris
Weidman, no octógono de Las Vegas. Acharam que estavam diante de
adversários menores e insignificantes, mas, como se sabe, a soberba é o
sentimento imediatamente anterior à queda.
Em apenas três semanas de contínua e criteriosa apuração da blogosfera, a
Globo se perdeu em versões sem sentido e recuos de informação, admitiu a
culpa da sonegação e justificou-se com um pagamento alegado, mas nunca
provado. Teve, pela primeira vez desde que foi criada no ventre da
ditadura militar, que se pronunciar publicamente sobre uma denúncia
contra si, desgostosa de que isso tenha acontecido fora de seu espectro
de dominação, a velha e reacionária mídia nacional, da qual é líder e
paradigma. A poderosa vênus platinada teve que responder, primeiro, ao O
Cafezinho, de Miguel do Rosário, e depois às redes sociais, ao País,
enfim.
Soubemos, assim, que as Organizações Globo, que vivem de concessões
públicas e verbas oficiais, ao serem confrontadas com a informação sobre
o roubo do processo pela funcionária da Receita Federal, divulgaram uma
nota dizendo terem tido uma “grande surpresa” ao saberem da ação
criminosa perpetrada por Cristina Maris Meinick Ribeiro.
Então, está combinado assim:
1) Cristina, funcionária de carreira da Receita, enlouqueceu em uma
manhã de 2006 e, do nada, apenas movida pela índole de anjo e pela
vontade de ajudar a pobre Rede Globo, decidiu por conta própria roubar e
desaparecer com o processo de sonegação fiscal de 600 milhões de reais
da família Marinho. Depois, conseguiu pagar, sozinha, cinco advogados
para arranjar um habeas corpus com o inefável Gilmar Mendes;
2) Em seguida, o Ministério Público Federal, então comandado pelo
procurador-geral da República Antonio Fernando Souza, denunciou Cristina
Ribeiro pelo sumiço da papelada, que resultou na condenação da referida
servidora a 4 anos e 11 meses de cadeia, segundo sentença da Justiça
Federal do Rio de Janeiro. Isso em 2007, tudo na surdina, sem que um
único procurador da República tenha se preocupado a vazar um fato grave
desse para a imprensa ou, no limite, para jornalistas com atuação
independente na blogosfera. Nada comparável à fúria e à disposição do
mesmo Antonio Fernando ao dar publicidade à denúncia do “mensalão”,
notícia, desde então, incorporada à grade de programação da Globo como
um coringa usado tanto em época de eleição como nos espasmos de
epilepsia antipetista, aliás, recorrentes na emissora.
Talvez, de tanto viver na dimensão onírica de suas telenovelas, ou na
falsa percepção que alguns dos seus sorridentes jornalistas têm do mundo
real, a Rede Globo ache, de fato, que é possível fazer o contribuinte
acreditar de que ela nada tem a ver com o roubo do processo da Receita
Federal. Afinal, somos todos uma nação de idiotas plugados no Caldeirão
do Huck, certos de que, ao morrermos, teremos nossas almas levadas ao
céu pela nave espacial da Xuxa.
Ou seja, os de lá não aprenderam nada com o debate Lula x Collor, em
1989, nem com a bolinha de papel de José Serra, em 2010, duas farsas
desmascaradas, cada qual a seu tempo, pela História. Não perceberam que a
internet acabou com a era das fraudes de comunicação no Brasil e no
mundo.
Apostam as últimas fichas na manada que reuniram em cinco décadas de
monopólio de um império movido a entretenimento e alienação. Mas esse
gado que foi alegremente tangido por vinhetas e macacas de auditório
ganhou, com o fenômeno da rede mundial de computadores, novas porteiras
e, com elas, uma perspectiva real de liberdade.
O silêncio envergonhado e vergonhoso dos tristonhos oligopólios de mídia
brasileiros sobre uma notícia tão grave é, antes de tudo, revelador das
nossas necessidades.
Fico imaginando qual seria a capa dos jornalões e das revistas coirmãs
se fosse Lula a dever mil réis de mel coado à Receita Federal. E se
descobrissem, no curso da apuração, que um militante aloprado havia lhe
feito o favor de roubar o processo judicial a respeito. As massas
seriam, no mínimo, conclamadas a linchar o ex-presidente e pedir as
Forças Armadas nas ruas.
Por essa razão, enquanto o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, se
dispõe a ir às páginas amarelas da Veja se colocar – e ao governo do PT
– de joelhos perante quadrilhas ligadas a bicheiros e a esquemas de
sonegação fiscal, a ação periférica da blogosfera rouba o protagonismo
que antes era dessa autointitulada “grande imprensa”.
E, para tal, faz apenas o que tem que ser feito: jornalismo.
Postado há 1 hour ago por Blog Justiceira de Esquerda
Do Blog Justiceira de Esquerda.
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