Tratamento desigual para ex-ministro tucano e ex-deputado petista é mais escandaloso do que se imagina
Onze anos depois de receber R$ 300 000 de Marcos Valério, o tucano
Pimenta da Veiga, candidato ao governo de Minas Gerais, foi chamado pela
Polícia Federal para explicar-se.
Ex-ministro das Comunicações no governo de Fernando Henrique Cardoso,
Pimenta recebeu uma quanta seis vezes maior do que os R$ 50 000 que a
mulher do deputado João Paulo Cunha foi buscar no Banco Rural.
A quantia recebida por João Paulo foi considerada uma prova de que ele
havia sido corrompido pelo esquema, elemento essencial para
demonstrar sua culpa num caso em que foi condenado, inicialmente, a 9
anos e quatro meses de prisão.
Mas o ex-deputado recorreu de uma das condenações, aquela tese absurda
de que a própria mulher fora usada para lavar dinheiro – a denuncia da
AP 470 foi bastante criativa, nós sabemos – e conseguiu diminuir sua
pena.
Hoje, em regime semiaberto, João Paulo trabalha num escritório de advocacia de Brasília.
A condenação de João Paulo só foi possível porque o STF desconsiderou as provas que apresentou em sua defesa.
Ele disse que havia recebido os R$ 50 000 como ajuda para a campanha
eleitoral de 2004 na região de Osasco e municípios vizinhos, onde,
antigo operário metalúrgico, construiu a liderança política. João
Paulo apresentou notas fiscais que confirmavam gastos realizados com
pesquisas eleitorais. Mostrou planilhas e números. Levou testemunhas que
deram depoimentos para provar o que dissera.
Você pode achar que era tudo a encenação de um conto da carochinha. Mas
daí eu pergunto: como explicar o que aconteceu com Pimenta da Veiga?
Ele não tinha notas fiscais nem depoimentos para justificar os R$ 300
000. Disse na época que havia prestado serviços de advocacia para a DNA e
a SMP&B, agências de Valério. A Polícia Federal registrou que
queria alguma prova de que havia feito algum trabalho de verdade, como
um parecer escrito ou coisa assim. Não havia. Pediu que Pimenta da Veiga
apontasse empresas ou pessoas envolvidas nos casos em que havia atuado
em tribunais. Nada. Alegou-se que eram casos internos.
Em 2002, não custa recordar, as agencias de Valério tomavam parte na
campanha de Aécio em Minas Gerais. Cristiano Paz, um dos maiores
publicitários do Estado, chegava a despertar inveja entre os
concorrentes pela facilidade de transitar entre o PSDB mineiro. Seu
sócio Ramon Hollerbach tinha cadeira cativa no comitê de campanha do
PSDB.
Hoje, condenados a mais de 20 anos, os dois vivem confinados na Papuda, cumprindo os rigores do regime fechado.
Com base no que dizia ter acontecido e no que não poderia ser
demonstrado, Pimenta da Veiga foi liberado inteiramente de qualquer
acusação. Não foi sequer acusado pelo Ministério Público. Não foi
denunciado. Sua investigação permaneceu no laudo 2828, aquele que foi
mantido em segredo dos próprios ministros do Supremo até que eles
julgassem a denuncia contra os 40 réus do PT.
Hoje, Pimenta da Veiga é candidato ao governo de Minas Gerais na
sucessão de Antônio Anastasia. SE sua candidatura for confirmada, estará
no palanque de Aécio Neves.
Enquanto isso, graças a uma remessa equivalente a apenas 16% daquela
que Pimenta da Veiga recebeu, João Paulo Cunha dorme num estabelecimento
penal. Não pode candidatar-se a deputado e foi levado a interromper uma
carreira onde era realista cogitar uma candidatura ao governo de São
Paulo.
O Globo de hoje noticia que em 2013 Pimenta da Veiga foi indiciado no
mensalão mineiro. Oito anos de atraso. Ou dez anos, se você quiser
contar com o momento em que a denúncia chegou ao gabinete de Carlos
Ayres Britto, no STF.
Preste bem atenção: ele recebeu o dinheiro em 2003; a Polícia Federal
descobriu o pagamento em 2005; e apenas oito anos depois, quando João
Paulo Cunha e os demais condenados da AP 470 batalhavam para conseguir
os embargos infringentes e obter um fiapo de recurso, ,Pimenta foi
indiciado.
Nascido em 1947, só precisa esperar três anos para atingir os 70 anos
que garantem a prescrição de suas penas caso venha ser condenado.
Tudo se torna ainda mais escandaloso quando se recorda que a multa
cobrada de João Paulo a título de reparação – R$ 370 000 – é 25%
superior aos honorários recebidos recebido por Pimenta da Veiga junto as
empresas de Valério.
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